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Congresso se articula para dobrar valor do fundo eleitoral para, no mínimo, R$ 4 bi

Alternativa é derrubar decisão de Bolsonaro, que vetou teto de R$ 5,7 bi, ou negociar a ampliação do valor na Lei Orçamentária

Bruno Góes e Jussara Soares / O Globo

Após o presidente Jair Bolsonaro vetar trecho da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que destinava cerca de R$ 5,7 bilhões ao Fundo Eleitoral, o Congresso Nacional se mobiliza para garantir ao menos R$ 4 bilhões para as campanhas de 2022. A interlocutores, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sinalizou que os parlamentares não trabalham com valor menor.

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O montante é mais que o dobro do custo das eleições gerais de 2018, quando as legendas tiveram R$ 1,7 bilhão à sua disposição. Até que o veto de Bolsonaro seja analisado pelo Congresso, porém, ainda há incertezas sobre qual alternativa legal seria usada pelos parlamentares para fazer valer a vontade do Legislativo.

A disposição de Lira é negociar com o Palácio do Planalto uma despesa para o processo eleitoral na ordem de R$ 4 bilhões ou R$ 4,5 bilhões. Bolsonaro, por sua vez, vem sendo fortemente pressionado pela militância, e teria sinalizado à área técnica do governo que fixaria, por meio da Lei Orçamentária Anual (LOA), o valor de R$ 2 bilhões da eleição de 2020, corrigidos pela inflação, o que resultaria em aproximadamente R$ 2,2 bilhões.

“É lógico que (Bolsonaro) vai enviar um valor menor. Nós não esperávamos um valor que achamos que é suficiente, valor de R$ 4 bilhões a R$ 4,5 bilhões”
PAULINHO DA FORÇA / Solidariedade (SP)

Lideranças partidárias, porém, consideram o valor insuficiente para a realização das campanhas de 2022. O argumento é o de que as eleições para prefeito e vereador teriam custos menores que os registrados nas eleições gerais, quando são escolhidos deputados federais, estaduais, distritais, senadores, governadores e o presidente da República.

— A eleição é para deputado estadual, federal, senador, governador e presidente da República. Portanto, não são suficientes os R$ 2 bilhões corrigidos pela inflação. Vamos discutir com os partidos e verificar um valor suficiente para as eleições e vamos aprovar no Congresso. Temos que aumentar esse fundo que ele mandar — disse o presidente do Solidariedade, o deputado federal Paulinho da Força (SP).

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O deputado afirmou ainda que a expectativa é, mesmo, que Bolsonaro envie uma proposta com valor bem inferior aos R$ 5,7 bilhões por meio da LOA.

— É lógico que ele (presidente Bolsonaro) vai enviar um valor menor. Nós não esperávamos que ele enviasse um valor que achamos que é suficiente, valor de R$ 4 bilhões a R$ 4,5 bilhões — afirmou o parlamentar.

Busca da solução jurídica

Bolsonaro tem até o dia 31 de agosto para enviar ao Congresso a LOA de 2022. A votação, porém, deve acontecer apenas em dezembro deste ano. Enquanto a LDO fixa as balizas para o Orçamento, a LOA determina os valores exatos para cada ação governamental.

Na LDO, a projeção de R$ 5,7 bilhões foi feita a partir do parâmetro que havia sido redigido pelo Congresso. Nele, havia a determinação de que parte da verba do fundo seria equivalente a 25% do orçamento de dois exercícios (2021 e 2022) da Justiça Eleitoral.

Esse valor do fundo também obedecia a outro critério: a origem do recurso seria o remanejamento de emendas de bancada impositivas.

“O valor da eleição municipal com correção não é o ideal. Vamos começar as discussões sobre esta semana”
ISNALDO BULHÕES(MDB-AL)

Ao indicar o veto, a área técnica do governo avaliou que não há necessidade de correção da LDO. Isso porque a Lei das Eleições, que criou o Fundo Eleitoral, trata das fontes de recursos que devem ser usadas para bancar as campanhas. Assim, bastaria ao governo indicar um valor menor na Lei Orçamentária.

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No Congresso, parlamentares do Centrão ouvidos reservadamente avaliam que a decisão de Bolsonaro pode forçar a construção de um acordo para a derrubada do veto. Há dúvidas sobre a legalidade do repasse ao chamado Fundão sem uma baliza fixada pela LDO. Neste caso, se o veto for derrubado, a negociação prevê que valor intermediário passaria por um corte do orçamento da Justiça Eleitoral ou o envio de um novo projeto para estipular um novo critério.



Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
 Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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— Só tem duas alternativas: modificar a lei, buscando um outro texto para essa previsão, ou derrubar o veto e a previsão ficar mantida, e, depois, discutirmos o valor na Lei Orçamentária — disse o líder do MDB na Câmara, o deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL).

O parlamentar também concorda que o valor de R$ 2 bilhões é insuficiente e que o Congresso buscará aumentar o montante.

— Vai ter que discutir esse valor. Acredito que o valor da eleição municipal com correção não é o ideal. Vamos começar as discussões sobre esta semana — disse Bulhões.

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Outros congressistas avaliam que é preciso sentar à mesa para tratar do assunto com clareza. Presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), a senadora Rose de Freitas (MDB-ES) diz que não é necessário derrotar o governo em plenário.

— Esse não é o caminho (derrubar o veto). Há uma controvérsia muito grande. Vamos ter que sentar à mesa e dialogar dentro da realidade que existe. Há uma pressão da sociedade sobre esse assunto. Mobilizar o Congresso para alocar R$ 5 bilhões numa eleição... é muito dinheiro para um país que está com tantas dificuldades, como desemprego e fome — diz a senadora.

Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/congresso-se-articula-para-dobrar-valor-do-fundo-eleitoral-para-no-minimo-4-bi-apos-veto-de-bolsonaro-25166375


Hélio Schwartsman: Lugar óbvio para cortar

Campanha eleitoral é o lugar em que podemos cortar custos sem dor de consciência.

Em termos de princípios, não há muito o que discutir. Uma vez que o STF proibiu as doações empresariais para campanhas políticas, e nós, brasileiros, ainda não desenvolvemos uma cultura de dar como pessoas físicas dinheiro a candidatos, não parece haver muita alternativa que não assegurar algum tipo de financiamento público para o processo eleitoral, que, de resto, sempre ocorreu. A democracia tem custos, e a eleição é só um deles.

Nenhum princípio, porém, exige que os nacos do Orçamento que serão destinados às campanhas sejam grandes. Muito pelo contrário, essa é uma rubrica que, numa análise racional, pede para ser cortada até o mínimo que não comprometa a realização do pleito.

Nem todos os cortes são iguais. Se você tira dinheiro da saúde, pessoas cujas vidas dependem de uma medicação ou de uma cirurgia podem morrer. Se tira das bolsas de pós-graduação, cria descontinuidades em projetos científicos que poderiam ser importantes para o país. Se deixa de dar aumento para alguma categoria de servidores, afeta negativamente sua qualidade de vida, ainda que não os mate.

Cortes no financiamento eleitoral são diferentes porque, até onde a vista alcança, não geram nenhum tipo de impacto negativo. Com efeito, quer destinemos às campanhas do próximo ano R$ 4 bilhões, quer R$ 500 milhões, o mesmíssimo número de prefeitos e vereadores será eleito. Não há relação conhecida entre o volume de recursos investido e a qualidade dos políticos eleitos.

O que talvez exista é uma correlação entre o volume de propaganda e as taxas de renovação nas câmaras e prefeituras, mas nada capaz de alterar mais do que milimetricamente a enorme vantagem de que gozam aqueles que já estão no poder.

Trocando em miúdos, precisamos pôr dinheiro público nas campanhas para garantir a realização de pleitos competitivos, mas esse também é o lugar em que podemos cortar sem dor de consciência.