Benito Salomão

Urna eletrônica e pessoas | Foto: reprodução/Agência Brasil

Benito Salomão afirma que eleições 2020 podem iniciar fase melhor da vida política

Em artigo que publicou na revista Política Democrática Online de novembro, economista cita reforma política realizada pelo Projeto de Lei Complementar 75/2015

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

O economista Benito Salomão tem expectativa de que as eleições de 2020 podem iniciar nova fase da vida político-eleitoral brasileira. “Na minha opinião, fase melhor, com campanhas mais baratas, maior fidelidade partidária, número menor de partidos, com maior eleitorado”, escreveu, em artigo que produziu para a revista Política Democrática Online de novembro, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília.

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Todos os conteúdos da publicação podem ser acessados, gratuitamente, no site da FAP, que é vinculada ao Cidadania. De acordo com Salomão, a eleição deste ano é “atípica”, por ser a primeira após a reforma política realizada pelo Projeto de Lei Complementar 75/2015, que mudou inúmeras regras para as eleições no Brasil. “A primeira mudança consiste na forma de financiamento das campanhas políticas com a suspensão dos aportes de origem empresarial e a criação do fundo eleitoral público”, destacou ele, no artigo.

Na avaliação do economista, duas consequências devem ocorrer a partir desta nova regra. A primeira delas é o barateamento dos custos das campanhas eleitorais em todo o Brasil. “Quem caminha pelos grandes centros brasileiros e percebe a ausência de campanhas pelas ruas tende a imaginar que se trata de mais um efeito da pandemia, mas, na verdade, o que boa parte dos candidatos recebeu apenas conseguiu financiar os programas de televisão”, observou.

No artigo publicado na revista Política Democrática Online de novembro, o economista aponta que a segunda consequência possível é a tendência à consolidação dos partidos tradicionais. Ele citou levantamento do Ibope, realizado em 30 de outubro, abrangendo 23 capitais, e que mostrou “clara tendência de concentração de alguns poucos partidos”.

“Democratas e PSDB são os que estão sendo mais bem avaliados pelas pesquisas, cada um liderando em 5 capitais. PMDB e Podemos estão à frente em outras 3, cada. O PSD desponta como vencedor em 2 capitais. PP, PC do B, PSB e PDT lideram em 1 capital cada um”, afirmou. “Ou seja, dos atuais 27 partidos com representação na Câmara dos Deputados, apenas 9 devem eleger prefeitos. Dos atuais grandes partidos brasileiros, apenas PT e PSL não lideram as pesquisas em capital alguma”, acrescentou.

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RPD || Benito Salomão: Eleições 2020 e seus reflexos para 2022

Primeira eleição após a reforma política realizada pelo PLC 75/2015, pleito deve ser marcado pelo barateamento dos custos das campanhas eleitorais em todo o País e pela concentração partidária, avalia Benito Salomão

Em 15 de novembro, data próxima à da publicação desta Revista, serão escolhidos, em primeiro turno, prefeitos em 5.475 municípios brasileiros com número de eleitores inferior a 200 mil. Nos outros 95 municípios em que a massa eleitoral supera esse contingente, poderá haver uma disputa em segundo turno. A injeção de cerca de R$ 230 bilhões na economia, no rastro do auxílio emergencial, deve favorecer a reeleição ou continuidade de governos que estariam fadados à derrota no atual contexto de pandemia, agravada pela recessão. Por continuidade quero dizer a não exclusão de políticos tradicionais diante do fracasso da “nova política”, plasmado pela eleição em 2018 de figuras pouco expressivas e sem currículo como Bolsonaro, Witzel, Zema e tantos outros.

Esta é, ainda, uma eleição atípica, por ser a primeira após a reforma política realizada pelo Projeto de Lei Complementar (PLC) 75/2015, que mudou inúmeras regras para as eleições no Brasil. A primeira mudança consiste na forma de financiamento das campanhas políticas, com a suspensão dos aportes de origem empresarial e a criação do fundo eleitoral público. Duas consequências devem ocorrer a partir desta nova regra: A primeira é o barateamento dos custos das campanhas eleitorais em todo o Brasil. Quem caminha pelos grandes centros brasileiros e percebe a ausência de campanhas pelas ruas tende a imaginar que se trata de mais um efeito da pandemia, mas, na verdade, boa parte dos candidatos recebeu apenas recursos para financiar os programas de televisão. Em segundo lugar, a tendência à consolidação dos partidos tradicionais. Levantamento do IBOPE em 30/10, abrangendo 23 capitais, mostra clara tendência de concentração em alguns poucos partidos.

Democratas e PSDB são os que estão sendo mais bem avaliados pelas pesquisas, cada um liderando em 5 capitais. PMDB e Podemos estão à frente em outras 3, cada. O PSD desponta como vencedor em 2 capitais. PP, PC do B, PSB e PDT lideram em 1 capital cada um.

Ou seja, dos atuais 27 partidos com representação na Câmara dos Deputados, apenas nove devem eleger prefeitos. Dos atuais grandes partidos brasileiros, apenas PT e PSL não lideram as pesquisas em capital alguma. O PT corre em 2° ou 3° lugar em algumas capitais; o PSL, nem isso. A se confirmarem esses resultados, pode surgir novo centro de resistência à polarização bolsonarismo x petismo, fenômeno que poderá ser aproveitado por alguma liderança de projeção nacional.

Esta tendência de concentração partidária deverá se refletir também, porém de forma mais imperfeita, na composição da próxima Câmara. Isso porque, a partir de 2022, a cláusula de desempenho para acesso partidário ao fundo de financiamento e ao horário na televisão se tornará mais apertada do que foi em 2018. Na eleição de 2022, de acordo com a PEC 33/2017, o partido precisará ter 2% dos votos válidos em 9 unidades da Federação e ser obrigado a eleger um número mínimo de 11 deputados federais. Somado com o fim das coligações proporcionais, isso tende a reverter o processo de proliferação partidária verificado nos anos 2000 e 2010.

Ainda é cedo para projetar, com base no que suponho possa ser o desempenho eleitoral dos principais partidos nos municípios, a configuração do próximo Congresso. As eleições para deputado federal têm outra dinâmica. Dependem muito do resultado das eleições no interior, tanto mais porque a possível concentração partidária, a ser registrada nesta eleição municipal, pode não se refletir na eleição para o Parlamento, por duas razões:

i) as disputas por prefeituras de cidades menores, espalhadas pelo interior, tendem a favorecer a pulverização partidária; e

ii) o objetivo de alguns candidatos a prefeitos não é tanto superar pesquisas eleitorais adversas e vencer as eleições, mas, antes, cacifar suas campanhas para deputado em 2022. Em outras palavras: partidos como o PSL e o PT, mesmo que não consigam eleger prefeitos em cidades importantes, poderão preparar-se para formar bancadas poderosas nas próximas eleições.

As eleições de 2020 talvez inaugurem nova fase da vida político-eleitoral brasileira. Na minha opinião, fase melhor, com campanhas mais baratas, maior fidelidade partidária, número menor de partidos, com maior eleitorado.

*Benito Salomão é economista.


‘Renda Cidadã é ponto de tangência entre bolsonarismo e petismo’, afirma Benito Salomão

Economista critica governo brasileiro, que, segundo ele, segue de ‘braços cruzados’

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Uma provável segunda onda da pandemia do coronavírus na Europa pode voltar a derrubar os mercados financeiros e causar ainda mais volatilidade na taxa de câmbio e prejuízos ao comércio internacional, de acordo com o economista Benito Salomão. “Se enganam os crentes em uma recuperação robusta em 2021, o cenário econômico deve prosseguir conturbado”, afirma ele, em entrevista na revista Política Democrática Online de outubro.

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A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e que disponibiliza todos os conteúdos, gratuitamente, em seu site. O economista observa que, em meio a um cenário fiscal tão desolador, o governo brasileiro segue de braços cruzados, a reforma tributária parece ter saído de discussão, a reforma administrativa apresentada não tem condições de ser aprovada, e o governo aposta em trapaças contábeis para criar seu “Renda Cidadã”.

De acordo com o autor do artigo, a proposta do programa de distribuição de renda é “fruto da obsessão pessoal do Presidente da República, não como uma política de mitigação da pobreza, da miséria, ou da fome, mas sim como um mero instrumento de perpetuação no poder”. “Renda Cidadã é o ponto de tangência entre o bolsonarismo e o petismo. Ambos são capazes de lançar mão da sustentabilidade fiscal e da estabilidade macroeconômica do país, em troca da formação de feudos eleitorais constituídos por programas de transferências de renda, que, se não fossem deturpados, poderiam ser importantes instrumentos de redução das desigualdades no Brasil”, analisa.

Ao paralisar reformas estruturais e insistir em teses econômicas inviáveis, como o Renda Cidadã e a substituição da CPMF pela desoneração da folha de pagamentos, o Brasil está construindo rápido atalho entre a crise atual e a próxima crise, segundo o economista. “Em janeiro de 2021, o decreto legislativo de calamidade pública irá expirar”, diz.

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RPD || Benito Salomão: Cenários possíveis para 2021

Problemas econômicos do país seguem reais, apesar de terem saído do debate público como se tivessem deixado de existir, avalia Benito Salomão. Desemprego avança para 13,8% e a dívida pública chega a 88,72% do PIB

Benito Salomão*

No momento em que se caminha para o final do histórico ano de 2020, surge uma falsa e perigosa sensação de normalidade: a curva de infectados pelo novo coronavírus no Brasil finalmente cedeu, a economia apresenta alguns sinais de recuperação e a possibilidade de uma segunda onda parece ser uma realidade distante. Os problemas estruturais do Brasil parecem ter desaparecido do debate público como se tivessem deixado de existir. Aos poucos, lojas, bares, restaurantes e shoppings voltam a funcionar; as pessoas retornam às suas atividades, e a pandemia, que já deixou quase 150 mil mortos e continua seu cortejo macabro, passa a ocupar apenas a lembrança das pessoas.  

Os problemas econômicos, no entanto, seguem reais. Segundo o IBGE, o desemprego no semestre findado em julho avançou para 13,8% e já supera o pior momento da crise de 2014/17, com pico de 13,7% em março de 2017. Segundo os dados da Pnad Contínua, cerca de 13,1 milhões de brasileiros procuraram trabalho e não encontraram no trimestre findado em julho; outros 5,8 milhões estão no desalento. No que se refere ao PIB, parece haver alguma recuperação em curso. Entretanto, uma análise de indicadores antecedentes como o IBC-Br mostra que, até o presente momento, a recuperação não cobriu sequer a metade da perda verificada no primeiro semestre do ano.  

O único indicador no Brasil que cresce acima das projeções é o da dívida pública. Entre janeiro e agosto de 2020, a dívida bruta do governo brasileiro saltou de 76,18% para 88,72% do PIB, um avanço de 12,54% em apenas oito meses. Na crise anterior, já considerada por muitos como a maior da história até então, a dívida pública brasileira havia crescido de 51,79% para 71,01% do PIB, evolução de 19,22% entre março de 2014 e novembro de 2016, porém em um prazo muito mais dilatado, de 32 meses.  

Em meio a um cenário fiscal tão desolador, o governo brasileiro segue de braços cruzados; a reforma tributária parece ter saído de discussão; a reforma administrativa apresentada não tem condições de ser aprovada; e o governo aposta em trapaças contábeis para criar seu “Renda Cidadã”, fruto da obsessão pessoal do presidente da República, não uma política de mitigação da pobreza, da miséria ou da fome, mas sim como um mero instrumento de perpetuação no poder. O Renda Cidadã é o ponto de tangência entre o bolsonarismo e o petismo; ambos são capazes de lançar mão da sustentabilidade fiscal e da estabilidade macroeconômica do país em troca da formação de feudos eleitorais constituídos por programas de transferências de renda, que, se não fossem deturpados, poderiam ser importantes instrumentos de redução das desigualdades no Brasil.  

Ao paralisar reformas estruturais e insistir em teses econômicas inviáveis como o Renda Cidadã e a substituição da CPMF pela desoneração da folha de pagamentos, o Brasil está construindo um rápido atalho entre a crise atual e a próxima crise. Em janeiro de 2021, o decreto legislativo de calamidade pública irá expirar. Com ele, a PEC 10/20 do Orçamento de Guerra será sustado, e a política fiscal no Brasil voltará a se enquadrar no formato institucional padrão composto por Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), Teto de Gastos Públicos e Regra de Ouro. Quando isso acontecer, as despesas primárias do governo federal não poderão crescer acima de 2,13% que é a inflação findada em junho. O governo também não poderá seguir contraindo dívida para pagar despesas correntes. Um grande número de Estados e municípios que infringiram o teto legal de despesas com pessoal da LRF será obrigado a reconduzir o orçamento para os limites da Lei e vai, fatalmente, demandar socorro da União e dos Estados. Enfim, os problemas de sempre voltarão à baila.  

No front monetário, o governo brasileiro terá dificuldades de continuar financiando, via títulos, a expansão das despesas públicas. Com a sustação do orçamento de guerra, os papéis emitidos pelo Tesouro não mais poderão ser adquiridos pelo Banco Central e terão que ser absorvidos exclusivamente pelo mercado. É possível esperar a elevação das taxas de juros futuras. Além disso, uma provável segunda onda da pandemia na Europa pode voltar a derrubar os mercados financeiros e causar ainda mais volatilidade na taxa de câmbio e prejuízos ao comércio internacional. Se enganam os crentes em uma recuperação robusta em 2021; o cenário econômico deve prosseguir conturbado.  

* Mestre e Doutorando em Economia PPGE - UFU  


‘No Brasil, há claros estímulos ao desmatamento’, afirma Benito Salomão

Em artigo publicado na revista Política Democrática Online, economista cita que país prioriza defesa do orçamento durante pandemia

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

O economista Benito Salomão diz que, “no Brasil, há claros estímulos ao desmatamento com vistas a beneficiar setores de baixa produtividade e irrelevantes do ponto de vista dos retornos de escala”. A análise dele está publicada em artigo que produziu para a 23ª edição da revista Política Democrática Online, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), e que tem todos os conteúdos disponíveis, gratuitamente, no site da entidade.

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Em seu artigo, Salomão lembra que, mesmo na Ásia, emergentes como a China e o Vietnã estimulam reformas para reeditar o modelo sul-coreano, educando a população e investindo em ciência de auto impacto. “No Brasil, crianças ainda estão sem aulas, e se dá prioridade à defesa no orçamento em detrimento da educação”, lamenta.

Os países desenvolvidos e alguns emergentes, como China e Vietnã, estabeleceram seu próprio padrão de recuperação da crise econômica decorrente do coronavírus. “Na Europa e outros países desenvolvidos de alinhamento ocidental, como Canadá e Austrália, decidiu-se que o novo padrão de desenvolvimento se dará com base na sustentabilidade, na recuperação de biomas e ecossistemas com vistas a frear o aquecimento global”, observa o economista.

Salomão estima que o mundo deverá crescer a uma determinada taxa média superior à do Brasil, o que, segundo ele, equivale dizer que o país estará mais pobre não só do ponto de vista absoluto, mas também em termos relativos. “A população brasileira, salvo um percentual cativo da elite, não terá acesso, no médio prazo, ao padrão de renda e consumo dos países desenvolvidos. É preciso reverter esta trajetória de estagnação”, alerta.

O governo brasileiro, segundo o artigo publicado na revista Política Democrática Online, optou pela adesão à narrativa cretina de que as recomendações de isolamento social derrubariam a atividade e os empregos. “Ignoraram o fato de que o colapso do comércio internacional derrubaria as economias mundo a fora, e que nossa atividade econômica seria prejudicada, mesmo que não ocorresse isolamento social. Optou-se por um modelo capenga, em que nem o isolamento social se deu em plenitude, nem as atividades produtivas funcionaram a todo vapor”, critica.

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RPD || Benito Salomão: Recessão, e os efeitos de longo prazo

Estratégia adotada pelo governo de Jair Bolsonaro contra a pandemia do novo coronavírus levou o pais a ter dois trimestres consecutivos de queda no PIB, desemprego de 12,8 milhões de trabalhadores e uma redução de 5,6% na massa de rendimentos das famílias, além de mais de 120 mil mortos

A sentença acima, com aspecto de profecia, foi escrita em junho deste ano, em meu artigo intitulado “Onde estará o Brasil no Novo Normal?”, publicado na edição 20 da Revista Política Democrática Online. Dois meses depois, o IBGE tornou conhecido o número do PIB referente ao 2° trimestre do ano. Como esperado, a atividade desabou 9,7% em relação ao 1° trimestre deste ano, e 11,4%, se comparada a igual período de 2019. Isto, no entanto, não é nem de longe o maior dos problemas do Brasil, já que a recessão de 2020 já estava dada no contexto da pandemia do coronavírus. Grave, no entanto, é o fato de que, simultaneamente à queda de 11,4%, se registrou um total de 4 milhões de casos da doença e mais de 120 mil óbitos, até o presente momento.

O governo brasileiro, na esteira do terraplanismo sanitário que assolou alguns poucos países no mundo, optou pela adesão à narrativa cretina de que as recomendações de isolamento social derrubariam a atividade e os empregos. Ignoraram o fato de que o colapso do comércio internacional derrubaria as economias mundo afora, e que nossa atividade econômica seria prejudicada, mesmo que não ocorresse isolamento social. Optou-se por um modelo capenga, em que nem o isolamento social se deu em plenitude, nem as atividades produtivas funcionaram a todo vapor.

Resultado? Dois trimestres consecutivos de queda no PIB, um desemprego de 12,8 milhões de trabalhadores – além de outros 13,5 milhões de desalentados ou subocupados – e uma redução de 5,6% na massa de rendimentos das famílias. Tudo isto somado, claro, aos já citados 120 mil óbitos, em muitos casos evitáveis.

Voltando ao PIB, os problemas econômicos quantificados recentemente somaram-se aos problemas acumulados ao longo de uma década. Entre 2011 e 2020, o Brasil deve apresentar taxa média de crescimento de 0% ou um pouco menos. O dado do segundo trimestre não assusta apenas pela magnitude de uma queda histórica de 11,4%, que contempla em um único trimestre um efeito maior do que toda recessão de 2014/2016, que durou 11 trimestres. O maior problema do resultado conhecido do PIB é o contexto de ausência total de um plano de reestruturação econômica, no qual ele está submerso, o que indica que o Brasil continuará em uma trajetória medíocre de crescimento ao longo da próxima década.

O orçamento enviado para apreciação do Congresso no final do mês de agosto, prevê crescimento de 3,2% do PIB em 2021 (pasmem, ainda assim o déficit primário estimado é de R$ 230 bilhões). Este crescimento não irá acontecer, mesmo com o carregamento estatístico natural de períodos recessivos cuja base anterior é demasiadamente baixa. O mais provável é que o PIB 2021 continue a trajetória tal como vinha se comportando antes de 2020, entre 1% ou 1,5%. Uma mini recuperação cíclica não substitui uma estratégia para reverter o atual cenário de estagnação decenal da economia brasileira.

Os países desenvolvidos e alguns emergentes, como China e Vietnã, estabeleceram seu próprio padrão de recuperação da crise econômica decorrente do coronavírus. Na Europa e em outros países desenvolvidos de alinhamento ocidental, como Canadá e Austrália, decidiu-se que o novo padrão de desenvolvimento se dará com base na sustentabilidade, na recuperação de biomas e ecossistemas com vistas a frear o aquecimento global. Enquanto isto, no Brasil, há claros estímulos ao desmatamento com vistas a beneficiar setores de baixa produtividade e irrelevantes do ponto de vista dos retornos de escala. Mesmo na Ásia, emergentes como a China e o Vietnã estimulam reformas para reeditar o modelo sul-coreano, educando a população e investindo em ciência de alto impacto, ao passo que, no Brasil, crianças ainda estão sem aulas e se dá prioridade à defesa no orçamento em detrimento da educação.

Acrescente-se a grande defasagem tecnológica entre o que se observa no mundo em geral e no Brasil, em particular. O mundo deverá crescer a uma determinada taxa média superior à do Brasil, o que equivale dizer que o país estará mais pobre não só do ponto de vista absoluto, mas também em termos relativos, e que a população brasileira, salvo um percentual cativo da elite, não terá acesso, no médio prazo, ao padrão de renda e consumo dos países desenvolvidos. É preciso reverter esta trajetória de estagnação.

*Doutorando em Economia pela UFU


‘Brasil precisa voltar a crescer, criar empregos e gerar renda’, diz Benito Salomão

Em artigo publicado na revista Política Democrática Online de agosto, economista cita cenário em que a recuperação da economia só pode ocorrer pelo gasto privado

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Soluções para estimular a economia, como redução da taxa de juros e corte dos impostos e expansão das despesas públicas, aliadas a uma política de estímulo fiscal, estão fora de cogitação no Brasil. “O gasto privado, possibilidade ainda mais complexa, sofre com a falta de confiança na economia do país”, diz o economista Benito Salomão, em artigo publicado na revista Política Democrática Online. “Brasil precisa voltar a crescer, criar empregos e gerar renda”, alerta.

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A revista é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. Todas as edições podem ser acessadas, gratuitamente, no site da instituição. De acordo com o economista, as soluções para estimular a economia, ao menos no curto prazo, em cenários como este, de baixa inflação, esboçam-se tradicionalmente no modelo keynesiano.

Vale dizer, redução da taxa de juros e corte dos impostos ou expansão das despesas públicas, para conduzir a economia a seu equilíbrio de médio prazo”, afirma, para continuar. “Isto, no entanto, não será tão simples porque muitos destes instrumentos estão esterilizados”.

A taxa nominal de juros, conforme Salomão observa, encontra-se em seu nível mais baixo. “A Selic over para o mês de julho foi de 2,15% ao ano. Se a taxa de câmbio permanecer estável em torno dos R$ 5,20, pode ocorrer que a taxa de juros caia ainda mais. Entretanto, nova queda de 0,5 ponto percentual, trazendo a Selic nominal para 1,75%, terá pouco efeito sobre o produto”, explica.

A outra política de estímulo seria a fiscal, de acordo com o economista, mas, conforme acrescenta, ela está obstruída por uma dívida pública de 85,5% do PIB, que deve fechar 2020 em 96%. “Em um contexto destes, cuja retomada não se poderá se dar pela expansão da despesa pública, a recuperação da economia só pode ocorrer pelo gasto privado, possibilidade ainda mais complexa, pois o gasto privado depende de um elemento subjetivo e fora do controle da política macro: a confiança”, afirma.

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RPD | Benito Salomão: Repensando a Política Monetária

Soluções para estimular a economia, como redução da taxa de juros e corte dos impostos e/ou expansão das despesas públicas, aliadas a uma política de estímulo fiscal estão fora de cogitação. O gasto privado, possibilidade ainda mais complexa, sofre com a falta de confiança na economia do país

O Covid agravou problema há anos presente na economia brasileira: o baixo crescimento. A dinâmica do produto preocupa desde o início da década. Segundo minha estimativa, a taxa média de crescimento desta década será de -0,27%, a depender do resultado deste ano. Isto se torna ainda mais grave quando se considera que o PIB brasileiro foi negativo em 2014, 2015, 2016 e 2020, ano para o qual se espera cifra entre -6% e -9,5%. Mais grave, porém, é que essa década, considerada como a pior da história, gerida por uma equipe econômica amadora e objeto de um debate público empobrecido, poderá, inclusive, comprometer o desempenho da próxima década.

O Brasil precisa voltar a crescer, criar empregos e gerar renda, mas como fazer isto? As soluções para estimular a economia, ao menos no curto prazo, em cenários como este, de baixa inflação, esboçam-se tradicionalmente no modelo keynesiano. Vale dizer, redução da taxa de juros e corte dos impostos e/ou expansão das despesas públicas, para conduzir a economia a seu equilíbrio de médio prazo. Isto, no entanto, não será tão simples porque muitos destes instrumentos estão esterilizados. A taxa nominal de juros, por exemplo, se encontra em seu nível mais baixo. A Selic over para o mês de julho foi de 2,15% ao ano. Se a taxa de câmbio permanecer estável em torno dos R$ 5,20, pode ocorrer que a taxa de juros caia ainda mais. Entretanto, nova queda de 0,5 ponto percentual, trazendo a Selic nominal para 1,75%, terá pouco efeito sobre o produto.

A outra política de estímulo seria a fiscal, mas ela está obstruída por uma dívida pública de 85,5% do PIB, que deve fechar 2020 em 96%. Em um contexto destes, cuja retomada não se poderá se dar pela expansão da despesa pública, a recuperação da economia só pode ocorrer pelo gasto privado, possibilidade ainda mais complexa, pois o gasto privado depende de um elemento subjetivo e fora do controle da política macro: a confiança.

"A redução do custo do crédito não estimulou o crédito, cujas concessões acumuladas se retraíram de R$ 405 bilhões, em dezembro de 2019, para R$ 321 bilhões, em junho de 2020"


Em Animal Spirits, livro recente dos Prêmios Nobel de Economia George Akerlof e Robert Shiller (foto acima), abordam-se os fatores que poderiam conduzir a economia, de um equilíbrio de baixa confiança para um de alta confiança. Para os autores, a confiança se espalha na economia através de um efeito multiplicador, isto é, quanto mais pessoas confiarem na recuperação econômica e nas instituições, mais agentes tenderão a realizar gastos e investimentos. Fatores como injustiça, corrupção e ilusão monetária estão entre os elementos que desestimulam a confiança.

No capitulo 7 do livro, os autores discutem proposta que pode ser aplicável ao caso brasileiro. Em momentos de abalo coletivo da confiança, ainda que as taxas de juros caiam, como vem ocorrendo no Brasil desde 2016, somado a medidas adicionais como liberação de depósitos compulsórios por parte do Banco Central, os efeitos sobre a confiança e, consequentemente, sobre o produto e o emprego são modestos. Diante da falta de confiança, os autores propõem que o Banco Central persiga meta de concessão de crédito, para estimular a atividade e o emprego. Em países, como o Brasil, que conta com três bancos públicos com capilaridade nacional, isto é perfeitamente factível.

"Mais grave, porém, é que essa década, considerada como a pior da história, gerida por uma equipe econômica amadora e objeto de um debate público empobrecido, poderá, inclusive, comprometer o desempenho da próxima década"

As quedas recentes da taxa Selic promoveram retração considerável do spread bancário – de 18,36%, em janeiro deste ano, para 5,62%, em junho. A redução do custo do crédito não estimulou o crédito, cujas concessões acumuladas se retraíram de R$ 405 bilhões, em dezembro de 2019, para R$ 321 bilhões, em junho de 2020. Muitos desafios se impõem para estimular a economia via crédito. O primeiro é a população desbancarizada, que, em 2019, se situava em torno de 50 milhões de pessoas, fora a população de inadimplentes, de cerca de 63 milhões. Mesmo considerando-se certa interseção entre as pessoas desbancarizadas e as com pendências cadastrais, já se pode dimensionar a magnitude do desafio.

Nesse contexto, instituir meramente uma meta de crédito pode não funcionar por falta de demanda por empréstimos. Além disso, entre as pessoas físicas bancarizadas há um comprometimento médio de 26% da renda com pagamentos de dívidas não imobiliárias. Ou seja, em média, do total da renda familiar disponível, 26% estão comprometidos com o pagamento de alguma modalidade de empréstimo bancário não imobiliário.

Daí a proposta de que o Banco Central atue comprando estas dívidas não imobiliárias de pessoas físicas e jurídicas, para limpar tais passivos do setor bancário privado. Trata-se de uma medida excepcional e sem custos fiscais, que poderá contribuir para recolocar estas pessoas e famílias no circuito econômico.

*Benito Salomão é mestre em Economia e doutorando em Economia pela UFU.


PEC do Teto não sufoca crescimento da economia, diz Benito Salomão

Em artigo publicado na revista Política Democrática Online de julho, economista chama de falaciosas o que chama de acusações contra a proposta

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Em meio à proliferação dos casos confirmados de coronavírus ao longo do território nacional, o país tem de lidar com uma segunda pandemia, a de ideias erradas, analisa o economista Benito Salomão.” Dentre as muitas propostas estapafúrdias que vêm à baila, surge a ideia oportunista e ideológica de revogar o Novo Regime Fiscal (NRF)”, observa ele, em artigo que publicou na revista Política Democrática Online de julho.

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A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e que disponibiliza todas as edições, gratuitamente, em seu site. “Como toda falácia, ideias erradas portam maquiagem e alguns argumentos acerca dos efeitos da Emenda Constitucional 95, que, embora pareçam verdadeiros, não resistem a uma simples consulta aos dados”, analisa o economista.

A primeira acusação falaciosa acerca da PEC do Teto, segundo Salomão, é de sufocar os investimentos públicos e, portanto, a capacidade de crescimento da economia. “Ambos os argumentos são falsos”, assevera. “Os limites para crescimento do gasto público do NRF entraram em vigor apenas em 2017; os investimentos públicos do governo federal vinham em queda desde meados de 2013”, continua.

Além disso, segundo o artigo do economista publicado na revista Política Democrática Online, grande parte dos investimentos públicos anteriores até então eram financiados via pedaladas fiscais, ou seja, o Tesouro utilizava temporariamente os bancos públicos para pagar obras do PAC e do Minha Casa Minha Vida. “É falso que o limite imposto ao crescimento do gasto público tenha prejudicado as despesas com investimentos”, afirma o economista.

De acordo com Salomão, o grande inibidor do investimento no Brasil é o crescimento inercial do componente permanente do gasto público (previdência e salários). “Sobre isto, a PEC tem exercido papel interessante. Primeiro, porque, após a incorporação do NRF, se contava com a aprovação de uma reforma da Previdência que atenuasse a tendência de crescimento do gasto previdenciário”, disse.

O economista pondera que o segundo ponto é que a PEC impõe uma dinâmica ao gasto com pessoal da União, distinta do verificado ao longo das últimas décadas. “Sob os limites do NRF, a elite da burocracia passa a competir com as demais rubricas do orçamento, de forma que reajustes salariais devem necessariamente ser compensados por quedas em outras áreas, o que aumenta o custo político dos reajustes concedidos”, analisa.

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RPD || Benito Salomão: PEC do Teto e Investimento Público

Sufocar os investimentos públicos e, portanto, a capacidade de crescimento da economia, é uma das falácias que ameaça a Emenda Constitucional 95, avalia o economista Benito Salomão em seu artigo

Em meio à proliferação dos casos confirmados de coronavírus ao longo do território nacional, o país tem de lidar com uma segunda pandemia, a de ideias erradas. Dentre as muitas propostas estapafúrdias que vêm a baila, surge a ideia oportunista e ideológica de revogar o Novo Regime Fiscal (NRF). Como toda falácia, ideias erradas portam maquiagem e alguns argumentos acerca dos efeitos da Emenda Constitucional 95 que, embora pareçam verdadeiros, não resistem a uma simples consulta aos dados.

A primeira acusação falaciosa acerca da PEC do Teto é de sufocar os investimentos públicos e, portanto, a capacidade de crescimento da economia. Ambos os argumentos são falsos. Os limites para crescimento do gasto público do NRF entraram em vigor apenas em 2017; os investimentos públicos do Governo Federal vinham em queda desde meados de 2013. Além disso, grande parte dos investimentos públicos anteriores até então eram financiados via pedaladas fiscais, ou seja, o Tesouro utilizava temporariamente os bancos públicos para pagar obras do PAC e do Minha Casa Minha Vida. É falso que o limite imposto ao crescimento do gasto público tenha prejudicado as despesas com investimentos.

Na verdade, o grande fator inibidor do investimento no Brasil é o crescimento inercial do componente permanente do gasto público (Previdência e salários). Sobre isto, a supracitada PEC tem exercido papel interessante. Primeiro, porque, após a incorporação do NRF, se contava com a aprovação de uma reforma da Previdência que atenuasse a tendência de crescimento do gasto previdenciário. Tal reforma estava prevista para ocorrer em 2017. Em razão, porém, do conjunto de choques políticos que se sucederam, ela foi aprovada apenas em finais de 2019. Segundo, porque a PEC impõe uma dinâmica ao gasto com pessoal da União, distinta do verificado ao longo das últimas décadas. Sob os limites do NRF, a elite da burocracia passa a competir com as demais rubricas do orçamento, de forma que reajustes salariais devem necessariamente ser compensados por quedas em outras áreas, o que aumenta o custo político dos reajustes concedidos.

Para além do crescimento inercial de despesas permanentes, outros fatores limitam a capacidade de investimento do setor público no Brasil. O primeiro é a dificuldade em classificar investimento. A Lei 4.320/64 estabelece investimento apenas como dispêndios ligados ao capital físico, tais como obras, equipamentos e materiais permanentes. A legislação atual não contempla capital humano como um tipo de investimento. Como efeito sobre o crescimento econômico, uma obra que demore 4 anos para ser concluída, por exemplo, afeta o PIB ao longo desse período, pela contratação de trabalhadores e de insumos para executá-la. Um investimento em educação, por sua vez, que mitigue o analfabetismo e aumente as habilidades básicas e específicas da população, tem potencial de elevar o crescimento do PIB de forma perene, ainda que na contabilidade pública não seja apresentado como um investimento.

Por outro lado, em se tratando exclusivamente dos investimentos em capital físico, a Lei 8.666/93, que regulamenta a forma como são feitas as licitações e, portanto, contratados os serviços e obras públicas no Brasil, precisa de reformas. O processo de licitação tem de ser mais ágil, transparente e mais aberto à ampla concorrência, aí incluídas empresas estrangeiras. A forma como essas obras são fiscalizadas e pagas também deve ser ajustada. Novos processos carecem de reflexão por parte das instituições de controle, no tocante ao encurtamento dos prazos para certidões, medições e demais exigências, de forma a que os cronogramas das obras não sejam atrasados (e, por conseguinte, tenham os preços ajustados). Urge, ainda, ainda pensar-se um sistema de garantias de obras públicas, evitando-se, assim, que uma obra construída reclame tão cedo reparos, com oneração ao Tesouro.

São várias as razões porque o investimento público se tem comportado no curso desta década da maneira como conhecemos. Isto pouco tem a ver com o Novo Regime Fiscal, vigente há poucos anos. Solucionar isto envolve um conjunto de micro reformas a ser considerado após a pandemia. O que não se pode é, a pretexto de fomentar o crescimento e o desenvolvimento social via gasto público, revogar uma regra fiscal conquistada graças ao grande esforço legislativo que legou ao Brasil taxas de juros e inflação historicamente baixas, segundo os padrões nacionais. A PEC do Teto dos Gastos precisa ser preservada.

  • Doutorando em Economia UFU, Visiting Researcher at UBC.

Benito Salomão: Renovar o auxílio emergencial?

O Brasil caminha para adentrar no quinto mês de Coronavírus e é o atual epicentro mundial da pandemia. O conjunto de erros cometidos pelo governo federal na gestão da pandemia, deu ao Brasil este nefasto status, o Brasil é hoje o exemplo mundial do que não se fazer em termos de medida de combate a uma crise sanitária. Diante da evidente deterioração do panorama econômico, em simultâneo ao descontrole do quadro epidemiológico, a proposta de prorrogar por mais 3 ou 4 meses o auxílio emergencial pago a trabalhadores informais ganha força na Câmara dos deputados.

No começo da crise escrevi o artigo Macroeconomia em Tempos de Coronavírus em que defendi um auxílio emergencial de 1 salário mínimo para as camadas vulneráveis, a ser pago pelo tempo que durasse a quarentena. No meu entendimento, para que o programa cumprisse sua finalidade, deveria o pagamento deveria ser condicionado a uma rigorosa quarentena entre 2 a 3 meses. Os 53 milhões de brasileiros atendidos por um coronavaucher de R$1.000,00/mês, custaria aos cofres públicos cerca de R$212 bilhões em quatro meses. Isto ao lado de outras medidas também adotadas como a antecipação do 13°, a liberação de saques do FGTS, além do pagamento serviriam para arrefecer a ansiedade das populações, sobretudo as mais pobres, para cumprirem seu isolamento social com segurança. Investir R$212 bi na segurança da população não seria um custo, se a quarentena tivesse sido respeitada e talvez hoje tivéssemos 20 ou 25 mil mortos a menos.

Ao contrário da nossa sugestão inicial, Executivo e Legislativo negociaram em conjunto um auxílio emergencial de R$600,00/mês por três meses e o custo total da política foi de aproximadamente R$95,4 bilhões. Entretanto, o isolamento social foi definitivamente abandonado como estratégia sanitária de enfrentamento da proliferação da doença e o Brasil se aproxima de 60.000 óbitos pela síndrome. Ultima vez que um episódio exógeno ceifou a vida de 50 mil brasileiros foi há 150 anos atrás, na guerra do Paraguai que durou 6 anos. Agora que o desastre humanitário já é um fato e a economia vai apresentar uma queda de dois dígitos em 2020, novamente executivo e Legislativo dialogam no sentido de prorrogar o Coronavaucher. Isto deverá causar um gasto primário extra de R$95,4 bi, ou seja, ao final de setembro o Tesouro terá gasto cerca de R$201 bilhões no pagamento do auxílio para os informais.

Não é sobre gastar ou poupar recursos públicos, é sobre qualidade do gasto público. Ao final o Brasil gastará em 6 meses um montante muito próximo do que gastaria em 4 meses pagando minha proposta inicial de 1 salário mínimo. No entanto, o pagamento do auxílio na ausência da obrigação de uma quarentena efetiva gerou a despesa, mas não evitou os 60 mil óbitos. Como sempre gasto público no Brasil é empenhado em função das suas intenções e não em função dos seus resultados e a prorrogação do coronavaucher por mais três meses novamente vai se orientar por esta lógica. A pergunta é, qual o motivo de se ampliar o tempo do benefício sem a exigência de uma contrapartida da população? Defendo até que dadas as condições socioeconômicas vigentes o auxílio seja estendido, no entanto, isto precisa estar atrelado a outras políticas e a resultados, não pode ser apenas um benefício.

Mas não foi apenas no pagamento do Coronavaucher que a política pública fracassou, praticamente todas as medidas de enfrentamento ou foram tímidas, ou foram concebidas com atraso, ou simplesmente não existiram. O SUS foi realmente fortalecido? O número de leitos ampliados de forma não apenas a socorrer neste momento de pandemia, mas de suprir deficiências históricas que o sistema apresentava? Tais como filas em cirurgias eletivas, falta de leitos, insuficiência de insumos e equipamentos descoordenação?

E a educação? Em todos os seus níveis parada sob pretexto de que uma porção relevante dos seus alunos não dispõem de instrumentos básicos como computadores e acesso à internet para acompanhar o ensino remoto, ou ainda que parte expressiva dos professores não domina o uso de tecnologias que já apontam para o futuro da docência no século XXI. Tal constatação é perfeitamente pertinente, mas as crianças do resto do mundo estão tendo aula remotamente mesmo diante da pandemia. Por que o MEC não aproveitou o pretexto da pandemia para lançar um amplo programa de inclusão digital das famílias e regiões mais pobres do Brasil? Utilizando bancos públicos para subsidiar parte dos equipamentos adquiridos por estes alunos e vinculando inclusive (e apenas neste caso já que se trata de um subsídio) a compras de computadores e tablets produzidos pela indústria doméstica?

Muito se argumentou que “iriam morrer mais pessoas de fome do que pelo Coronavírus”, de repete se descobriu que na maior potência produtora de alimentos do mundo, existem pessoas que passam fome. Por que não se criar consórcios públicos de compra de alimentos da agricultura familiar e utilizar o exército ou até mesmo a expertise dos Correios (uma das poucas empresas de logística no mundo com estas características) para distribuir alimentos nos subúrbios das grandes cidades? Ou mesmo nos rincões do país? E o envio através do exército de caminhões pipas para que os 39 milhões de brasileiros desabastecidos de água tratada pudessem se higienizar nas periferias das grandes capitais?

O Brasil vai ter um déficit primário de 12% do PIB este ano, deve se desfazer ainda de uns 4% do PIB em reservas internacionais com impacto fiscal e a sensação que se tem é a de onde está sendo empregado este dinheiro? Não se vê o emprego destes recursos acontecendo na prática. Se o déficit era inevitável que ao menos fosse utilizado salvando a população e construindo um novo Brasil.

Benito Salomão é doutorando em Economia UFU e visiting researcher na UBC.


‘Não há solução econômica sem solução sanitária’, diz economista Benito Salomão

Em artigo publicado na revista Política Democrática Online, pesquisador aponta ‘recuperação econômica errante’

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Não há solução econômica sem prévia solução sanitária, de acordo com o economista Benito Salomão, doutorando em Economia pela UFU (Universidade Federal de Uberlândia) e pesquisador visitante da University of British Columbia. Em artigo de sua autoria que publicou na 20ª edição da revista Política Democrática Online, ele critica o governo. “O Brasil fracassou ao lidar com a pandemia quando o presidente [Jair Bolsonaro] se aliou ao vírus e sabotou as medidas de isolamento social”, afirmou.

Acesse aqui a 20ª edição da revista Política Democrática Online

De acordo com Salomão, a postura do governo brasileiro, fatalmente, levará ao fracasso da recuperação econômica. “Não existe retomada sem a construção de um estado de confiança prévio, capaz de induzir agentes econômicos a consumir e investir”, observa. “Sob este aspecto, a incapacidade do governo em lidar com as medidas de isolamento social criou ambiente de desconfiança, alimentado interna e externamente, que se estende também à sua capacidade de lidar com as pautas necessárias para reaquecer a economia”, afirma.

Duas preocupações preponderam no caso brasileiro, de acordo com o economista. “A primeira diz respeito à visão equivocada do Ministério da Economia acerca da natureza da crise e dos instrumentos necessários para enfrentá-la”, diz ele. Na avaliação do autor, a mescla da visão liberal antiga com um fiscalismo exagerado pode ser perigosa neste momento; será preciso certo nível de pragmatismo para passar por este momento com danos minorados.

“Não é possível delegar a recuperação à simples trajetória do ciclo econômico”, escreve Salomão, para continuar: “A dívida pública vai crescer, estimativas apontam para uma necessidade de financiamento do setor público de R$ 800 bilhões, em 2020. Ora, se este passivo é inevitável, é importante que cada real empenhado neste contexto cumpra seu papel de salvar vidas, empregos e empresas. Infelizmente, não é o que acontece”, analisa.

A segunda preocupação, segundo o economista, é com o que ele chama de “recuperação econômica errante”, que é reflexo da letargia das ações”. “O governo não só se empenha em insistir em uma agenda que não cabe no contexto, mas também demora em implementá-la”, afirma. Segundo ele, o mundo começa a se preparar para o relaxamento das medidas de isolamento social e discutir as medidas de estímulo econômico que envolvem equilíbrio macroeconômico, desenvolvimento social e humano, redução das desigualdades e deslocamento da fronteira tecnológica.

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