Alon Feuerwerker

Alon Feuerwerker: Disputa de pautas

Está em curso uma disputa pela pauta. A da pandemia desgasta Jair Bolsonaro, e portanto interessa à oposição. E para essa finalidade a oposição tem a Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19 no Senado, onde o governo está em minoria. Já o presidente concentra a disputa política na anabolização das desconfianças sobre a correção e a fidedignidade do voto puramente eletrônico. E as pesquisas indicam que, por enquanto, a posição presidencial sobre o assunto ganha algum terreno.

E o bate-boca segue, ainda que o desfecho em ambos os casos seja algo previsível. O relatório final da CPI deverá ser extremamente desfavorável ao governo e ao presidente. Mas como o oferecimento de denúncia é privativo do Ministério Público Federal, passa a ser provável (ou pelo menos possível) que o relatório só sirva mesmo é para a disputa eleitoral. Sempre há, claro, o risco de se abrir um processo na Câmara dos Deputados por crime de responsabilidade, mas hoje é remoto.

Quanto às eleições, elas acontecerão na urna eletrônica. Não há número no Legislativo ou no Judiciário para mudar essa realidade. A alternativa é não ter eleição, mas quem conseguiria impor isso? E o Brasil tem uma autoridade judiciária com autonomia para organizar a realizar o processo eleitoral. Ou seja, para não ter eleição seria necessária uma ruptura institucional. Hoje não está no horizonte. O problema? Palavras ditas não voltam. Mas na política o dito hoje não precisa necessariamente valer amanhã.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação


Fonte: Análise Política
http://www.alon.jor.br/2021/08/disputa-de-pautas.html


Novos acordos políticos não resolvem o problema da reeleição

Alon Feuerwerker / Revista Veja

Suponhamos, por exercício intelectual, um Brasil sem a Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19 no Senado. O cenário para o governo estaria razoável. Os números da vacinação avançam e são expressivos, e as curvas de casos e mortes vêm caindo faz algum tempo. E todas as projeções são de recuperação robusta do produto interno bruto este ano, compensando com alguma margem a retração do ano passado.

Mas há a outra face da realidade. Iluminar o lado escuro da lua mostrará que os casos e mortes pelo novo coronavírus ainda vão em patamares altos. E o sofrimento social nascido do desemprego e da pobreza não dá sinal de arrefecer. Apesar disso, todas as pesquisas demonstram que vetores positivos começam a superar os negativos na resultante de percepção popular.

Falando nela, a política, a avaliação do presidente da República anda algo estacionada. Verdade que o ótimo+bom das pesquisas deslizou para em torno de um quarto do eleitorado, mas o número retorna ao resiliente um terço se juntarmos o “regular positivo”. Um terço que, aliás, tem sido o patamar da aprovação de Jair Bolsonaro e também a intenção de voto nele no segundo turno. Ou seja, o presidente parece ter chegado a um certo piso.

“Sinal de acerto de Bolsonaro é a escolha de Ciro Nogueira ter sido bombardeada pelos adversários”

O “parece” aqui é recurso de prudência, porque a política gosta de trazer elementos que desestabilizam cenários. Entretanto, como já repetido tantas vezes, o imprevisível é muito difícil de prever. O fim do filme só saberemos em outubro de 2022, mas o retrato agora projeta disputa acirradíssima na urna eletrônica daqui a pouco mais de catorze meses. Entre um candidato à esquerda (hoje seria Lula) e um à direita (hoje seria Bolsonaro).

E as alternativas? Outro dado trazido pelas últimas pesquisas: se houvesse um único nome da terceira via, ou “centro”, ele (ou ela) partiria de algo em torno de 15% a 20%. Um número bastante razoável. E aí o desafio seria lipoaspirar o candidato à reeleição em uns pontinhos, passar ao segundo turno e tentar ganhar a disputa surfando na rejeição a Luiz Inácio Lula da Silva e ao PT. À luz de hoje é difícil, mas não impossível.

Os aspectos objetivos da realidade (contenção da pandemia e aceleração da economia) tendem a favorecer Bolsonaro na resistência contra a ofensiva do centrismo para tirar o incumbente do segundo turno. Mas há os aspectos subjetivos. Até que ponto as confusões e polêmicas que tanto ajudam o presidente a manter agrupado o núcleo duro da base dele vão gerar efeitos centrífugos prejudiciais, e assim facilitar o trabalho de quem disputa com ele o eleitorado à direita?

Bolsonaro fez o movimento by the book ao trazer o senador Ciro Nogueira (PP-PI) para a Casa Civil. Um sinal do acerto é a escolha ter sido bombardeada pelos adversários hoje mais renhidos do presidente. Mas é preciso saber se, como diz o clichê, Bolsonaro vai ajudar Nogueira a ajudá-lo. Pois a operação político-­parlamentar avança bem na solução do desafio imediato de não ser derrubado, mas é insuficiente para resolver outro: a reeleição.

Publicado em VEJA de 4 de agosto de 2021, edição nº 2749


Fonte:
Revista Veja
"Me ajude a te ajudar"
https://veja.abril.com.br/blog/alon-feuerwerker/me-ajuda-a-te-ajudar/


Os dentes e os espaços: As forças armadas e a política partidária

Alon Feuerwerker

Quando você age sobre a realidade, necessariamente a transforma. Mas aí ela também acaba transformando você. Ação e reação. Parece inevitável que a participação cada vez maior, e institucional, das Forças Armadas na política partidária termine abrindo espaço para a explicitação de debates político-partidários no interior mesmo da corporação.

Aliás o vice-presidente Hamilton Mourão já advertiu sobre isso.

Digo “explicitação”, e não “introdução”, pois seria ingenuidade, a qualquer momento, interpretar como apoliticismo a falta de manifestações explícitas de partidarismos no estamento militar.

Dois dos presidentes do período 1964-85 cuidaram com esmero de prevenir esse jogo recíproco, em que as Forças politizam e ao mesmo tempo são politizadas, ou partidarizadas: Humberto de Alencar Castelo Branco e Ernesto Beckmann Geisel. O primeiro operou uma reforma militar também com esse objetivo, e o segundo decapitou a resistência à distensão.

Ações que contribuíram de maneira importante para fechar o ciclo da anarquia militar no Brasil do século 20, cujo marco inaugural havia sido a eclosão do tenentismo. Ter deixado isso para trás era apontado até outro dia como conquista da Nova República. Não parece estar sobrando muito das conquistas da Nova República.

Em parte, os militares têm sido puxados para a política nos anos recentes pelo vácuo nascido da desmoralização e do desgaste das demais instituições nacionais. Isso ganhou nova dimensão quando Jair Bolsonaro, sem um partido para chamar de seu, acabou recorrendo aos fardados, da ativa e da reserva, como estoque de quadros e de doutrinas para tocar o governo.

A realidade é implacável, e o poder não se resume às delícias dele, carrega também os riscos decorrentes das delícias. E aí o noticiário começa a trazer confusões ligando duas coisas: militares e verbas orçamentárias. E agora com números de alto impacto vindos dos recursos destinados pelo governo e pelo Congresso ao combate da Covid-19.

Na falta de eventos de ruptura, a vida segue, e nela sempre chega a hora de ter de dar alguma explicação. Na escalada da politização, as recentes manifestações do Ministério da Defesa e dos comandantes militares vêm reiterando: as Forças estão aí para defender a liberdade e a democracia. Ecoam palavras do próprio presidente da República. Falta, até o momento, dizer se ambas estão sob ameaça.

E falta também, nesse caso, a explicação mais importante: quem ameaça.

Enquanto tal detalhe não fica claro, ao menos segue o baile. No terreno por eles pouco conhecido da política, até agora os militares estão levando uma certa canseira dos políticos. Os lprimeiros andam ocupados em mostrar os dentes, estes últimos preferem concentrar-se em tomar espaços de poder daqueles.

E nem Jair Bolsonaro pode ajudar muito, já que depende dos políticos para se manter na cadeira, inclusive depois de 2022, se se reeleger. O que pelo jeito vai ser decidido mesmo na urna eletrônica, apesar das dúvidas e arranca-rabos. Se bem que neste ponto é sempre adequado contar com novas emoções. 

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação


Alon Feuerwerker: Sinal amarelo

À sombra das disputas políticas que desfilam no palco da Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado da Covid-19, os números da epidemia no Brasil começam a trazer dados algo precocupantes.

A curva da média movel de mortes ainda é declinante, mas isso convive com uma certa escalada na média móvel de casos, e agora também com alguns sinais, aqui e ali, de que voltou a subir a taxa de ocupação das UTIs (leia).

Será preciso acompanhar a situação nos próximos dias com grande atenção. Será necessário saber se estamos no início de uma terceira onda, qual a variante propulsora, e se é mais transmissível, se é mais letal.

Será mais que nunca obrigatório vigilância para que as autoridades não baixem a guarda, não desativem serviços hospitalares, especialmente na área de cuidados intensivos.

Não podemos repetir os equívocos acontecidos entre a primeira e a segunda ondas.

A CPI está corretamente debruçada sobre os erros passados. Não repeti-los é uma boa maneira de inclusive homenagear a memória das vítimas.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação

Fonte:

Análise Política

http://www.alon.jor.br/2021/05/sinal-amarelo.html


Alon Feuerwerker: Sobre autocríticas e líderes

Tem sido habitual exigir do interlocutor político que faça autocrítica. Por falar nisso, o tema é sempre uma oportunidade de voltar ao livro Depoimento, autobiografia de Carlos Lacerda. Ele explica por que tentara fazer a Frente Ampla com João Goulart e Juscelino Kubitschek, adversários figadais dele poucos anos antes. Simples, diz, lá atrás o perigo tinha sido um. Agora era outro.

O ex-governador da Guanabara talvez tenha sido propositalmente vago. Ou tentou ser delicado no uso das palavras. Lá atrás o inimigo dele era um, Jango, e agora passara a ser outro, o regime militar. Alianças políticas são feitas por critérios de conveniência, e visando a derrotar o inimigo principal.

Mas sempre com um olho no peixe e outro no gato.

Daí a velha máxima: nunca esteja tão ligado a alguém que não possa romper com ele, nem tão conflitado com alguém que não possa se aliar a ele.

A exigência de que o outro faça autocrítica costuma carregar a marca do amadorismo e da ingenuidade. Ou da esperteza. Vamos imaginar que Luiz Inácio Lula da Silva e o PT aceitassem fazer autocrítica. Algo como “erramos sim no governo, somos realmente culpados de muito do que nos acusam, mas prometemos não errar mais”. A única consequência prática seria passarem a campanha eleitoral não fazendo outra coisa além de tentar se explicar.

“O líder que erra e, para ser coerente, se recusa a corrigir a rota está a caminho de levar os liderados à catástrofe”

O mesmo se dá quando exigem de quem apoiou o impeachment de Dilma Rousseff admitir a tese de ter sido um golpe. Até imagino o político “de centro” reconhecendo: “Foi mal, o impeachment não tinha base jurídica, erramos, fomos gulosos, e se entrarmos agora de vice numa chapa prometemos não fazer isso de novo”.

Na vida política, autocríticas são raras, a não ser quando o objetivo é fazer a “autocrítica” dos erros dos outros. No mais, é melhor tocar a vida e concentrar-se no objetivo. Agora, por exemplo, o candidato anti-establishment de 2018, Jair Bolsonaro, tenta enlaçar a — ou ser enlaçado pela — velha política, que oferece o escudo de proteção no momento mais perigoso do mandato dele.

E pode proporcionar a barca para a dura travessia reeleitoral do presidente.

A política é jogo de interesses, definido pela correlação de forças. Lula e Bolsonaro disputam nos estados o apoio de políticos que até outro dia falavam o diabo do PT e de quem o atual presidente e seu círculo próximo falavam o diabo. E tem mais: os que entre esses políticos toparem outro caminho, aderir ao centrismo, à chamada terceira via, terão garantido um refresco junto à opinião pública, ganharão de bônus uma bela repaginada na imagem.

Mas a opinião é livre e nada impede que vozes se levantem a exigir coerência, supostamente um valor absoluto.

Será? A coerência é muito perigosa na política. Pode conduzir a desastres. O líder que erra e, para ser coerente, se recusa a corrigir a rota está a caminho de levar os liderados à catástrofe. Não faltam exemplos, velhos e novos.

Bons líderes são os capazes de mudar a rota sem dizer que estão mudando, e sem ter de explicar por que o hoje é diferente do ontem. Não é para qualquer um.

Publicado em VEJA de 26 de maio de 2021, edição nº 2739

Fonte:

Veja

https://veja.abril.com.br/blog/alon-feuerwerker/sobre-autocriticas-e-lideres/


Alon Feuerwerker: O chanceler

O depoimento do ex-chanceler Ernesto Araújo à Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado da Covid-19 foi, como se esperava, um exercício permanente dos senadores oposicionistas para aproximar-se do alvo definido desde o início: o presidente da República. Até o momento, nenhum dos assessores do chefe do governo cedeu.

A administração governamental do tema vacinas aqui no Brasil está se mostrando uma peneira. Alguém terá de responder por isso ao final. Essa é a disputa.

É óbvio que as ações do governo brasileiro na pandemia obedeceram a um comando central, mas para CPIs não basta dizer “eu acho”. Tem de achar a digital. Claro que a aritmética pode tudo. Se houver seis dos onze senadores dispostos a chancelar uma tese ela estará no relatório final. Mas sem a “bala de prata” ficará mais fácil ao governo atrair pelo menos dois dos seis na hora h.

Para inverter a hoje maioria.

Aliás, é preciso tomar um certo cuidado com diagnósticos a partir da combatividade demonstrada pelos senadores. É possível que em alguns casos essa combatividade com os peixes pequenos venha a servir de atenuante para a hora em que se tiver de tomar posição sobre os grandes.

Amanhã é esperado o depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello. Ele deverá ser inquirido sobre os dois pontos nodais da CPI até agora: vacinas e cloroquina. Como tem a prerrogativa de não responder questões cuja resposta possa incriminá-lo, será pressionado mas terá como neutralizar.

A expectativa maior é sobre o que Pazuello dirá a respeito de Jair Bolsonaro. Se essa couraça não for furada no depoimento do general, restará à CPI o caminho sempre mais trabalhoso de vasculhar documentos.

E nesse meio tempo o governismo prosseguirá lutando para arrastar os governadores ao cadafalso.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação

Fonte:

Análise Política

http://www.alon.jor.br/2021/05/o-chanceler.html


Alon Feuerwerker: A aritmética, a política, e a filosofia do remador

As pesquisas recentes recolocam a oportunidade de debater um aspecto da eleição de 2022: qual é mesmo o potencial do chamado centro? Na aritmética fria, poderia ser calculado pela soma dos votos aos demais candidatos, fora Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro. Hoje, cerca de um quarto do eleitorado. Se fosse isso mesmo, não deixaria de ser animador.

Há maneiras mais heterodoxas de fazer a conta, sem respeitar tanto a política, mesmo caprichando na aritmética. Servem para acalentar o sonho. A fatia de mercado eleitoral poderia ser, por exemplo, tudo que sobra quando saem da cena os eleitores potenciais de Lula e Bolsonaro. Aí aqueles cerca de 25% engordariam bem. O problema é estar incluído nesse balaio quem vai votar em branco, nulo ou não vai votar.

Retornemos então ao primeiro método. Se de fato algum concorrente conseguisse pegar já no primeiro turno pelo menos 90% dos votos hoje declarados a candidatos nem Bolsonaro nem Lula, bateria em uns 20% do eleitorado, o que encostaria em 30% do voto válido, mantidos os percentuais históricos de brancos, nulos e abstenções. Isso foi suficiente para Fernando Haddad ir ao segundo turno em 2018.

Essa possibilidade tem obstáculos políticos, mas antes enfrenta os aritméticos. Fazer 20% do eleitorado numa eleição presidencial é bonito, porém não resolve se outros dois candidatos forem além. Nada indica, no momento, que Lula esteja vulneravel a uma lipoaspiração eleitoral. Bolsonaro talvez um pouco mais. Entretanto, será prudente esperar para ver se os problemas dele chegam a amolecer o núcleo duro do eleitorado bolsonarista.

Debatida a aritmética, vamos aos desafios políticos do projeto de convergir o centrismo.

Alguns: 1) Como juntar eleitores tão distintos e

2) como evitar que, inviabilizados certos pré-candidatos, uma boa parte da torcida deles desloque-se para Lula ou Bolsonaro.

Nas simulações de segundo turno é isso que acontece. E se o eleitor está disposto a votar em alguém no segundo turno, não é impossível que decida fazer isso logo no primeiro.

A intersecção entre as rejeições absolutas a Bolsonaro e Lula nas pesquisas chega a algo entre 10% e 15%. O resto migra para um dos dois na falta de opção. É um número parecido com o verificado quando se faz a simulação incluindo apenas três nomes: os dois líderes e mais um. Foram realizados levantamentos desse jeito, e o terceiro nome sempre girou em torno de 10%, ou um tantinho a mais.

Começar a corrida presidencial com 10% não chega a ser problema. O desafio é construir uma campanha que consiga deslocar um dos dois que puxam a fila. No momento, a meta do centrismo é tirar Bolsonaro do segundo turno. Lá atrás, foi tirar a esquerda. Mas vieram a elegibilidade de Lula e o desempenho dele nas pesquisas. E a coisa mudou de figura.

Bolsonaro trabalha como no remo: faz força, mas de costas para o objetivo. Se a vaga hoje em disputa para o segundo turno é a de anti-Lula, o atual presidente abre as baterias contra o ex, para não deixar ninguém ocupar o espaço. No momento, Lula só é o inimigo principal de Bolsonaro nos discursos. O oponente da hora é quem quer tomar dele o lugar de adversário número um do petismo.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação

Fonte:

Análise Política

http://www.alon.jor.br/2021/05/a-aritmetica-politica-e-filosofia-do.html


Alon Feuerwerker: Brasil, Indonésia

O Instituto Butantan completou a entrega das 46 milhões de doses da CoronaVac ao Ministério da Saúde (leia), correspondentes ao primeiro contrato.

O desafio agora é produzir e distribuir as 56 milhões de doses relativas ao segundo contrato, para completar as 100 milhões de doses previstas para essa vacina.

Aparentemente há atraso no embarque de insumos da China para o Brasil, e o governo de São Paulo diz que o problema é político.

Já na Indonésia, um levantamento feito com profissionais de saúde imunizados com as duas doses de CoronaVac indicou que a vacina, igual à do Butantan, apresenta-se 98% eficaz para evitar mortes pela Covid-19. E 96% na prevenção de hospitalização.

Esses números têm variado bastante de estudo para estudo no caso da CoronaVac, como tb em outras vacinas. De todo modo, o índice indonésio agora divulgado é uma ótima notícia.

E está em linha com estudo publicado há um mês na Lancet (leia).

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação

Fonte:

Análise Política

http://www.alon.jor.br/2021/05/brasil-indonesia.html


Alon Feuerwerker: Jacarezinho, empregos e lei

Toda eleição tem seus temas propulsores, que criam ambiente favorável ao perfil certo. Quando este tem a sorte de, e a competência para, encaixar na demanda. Em 1994 e 1998, Fernando Henrique Cardoso navegou nos mares do cansaço com a inflação, depois veio Luiz Inácio Lula da Silva para saciar a sede da rejeição à pobreza e à corrupção. O período petista sustentou-se por mais de uma década, mesmo sob acusações relativas à segunda, e muito porque entregava no combate à primeira.

Quando a economia ruiu, a tolerância virou fumaça, veio o impeachment de Dilma Rousseff e depois Jair Bolsonaro surfou as duas ondas do momento: os combates à corrupção e ao crime. Sobre este último, um aspecto evitado sempre que possível no debate é o aparente paradoxo: se os governos do PT reduziram as desigualdades, combateram a pobreza e ampliaram as oportunidades para os antes marginalizados, por que então o crime se agravou no período?

A ponto de a repulsa a ele ajudar decisivamente não só na eleição de Bolsonaro, mas de todo um contingente de políticos ligados à segurança pública Brasil afora.

Aliás, o crime encorpou mais onde a prosperidade avançou de maneira mais pujante, em especial em certas regiões metropolitanas e na fronteira agrícola. Não é opinião, mas fato: o combate à pobreza é fundamental, mas nem de longe é suficiente para solucionar os problemas da segurança pública. É só olhar os números, e tem gente boa que os organiza de maneira cuidadosa. E, simplesmente, o mapa da pobreza não bate com o do crime.

Na falta de consensos, a subida dos índices de criminalidade vai sendo enfrentada na base do “na minha opinião”. Uns acham que é uma disputa de espaços assistenciais entre o crime e o Estado. Outros estão certos de que falta mesmo é punição garantida e proporcional ao delito. Mas tem quem imagina resolver na bala. Jacarezinho. Vão lá, matam um certo tanto e voltam para casa. Quando nova leva ocupa o lugar dos que morreram, vai-se lá e mete-se bala de novo.

Com os habituais “danos colaterais”.

A exemplo da maioria dos outros assuntos importantes, é impossível no Brasil de hoje organizar alguma discussão produtiva sobre como atacar a endemia do crime. Se o debate sobre a pandemia da Covid-19 foi capturado por “certezas científicas”, que aliás independem de comprovação científica e se baseiam somente no “princípio da autoridade”, mais ainda algo que se tornou endêmico, parte da paisagem. Ao fim e ao cabo, convive-se com o crime. De vez em quando acontece alguma coisa que produz, como agora, algum calor. Nunca luz.

Entrementes, os candidatos à presidência vão afiando a faca. De um lado, reforça-se o discurso de que a polícia tem mesmo é de eliminar bandidos, e que não se faz omelete sem quebrar os ovos. Do outro, desarquiva-se a panaceia da “presença do Estado”. Será que não está na hora de compreender que sem crescimento acelerado da economia, e portanto das oportunidades, o crime continuará garantindo seu market share na atração de potenciais entrantes no mercado de trabalho?

Empregos e lei. Quem conseguir juntar essas duas ideias, até agora separadas por um muro, vai ter público em 2022.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação

Fonte:

Análise Política

http://www.alon.jor.br/2021/05/jacarezinho-empregos-e-lei.html


Alon Feuerwerker: O atraente bidenismo

A política econômica do governo Joe Biden vem atraindo certo entusiasmo nas correntes políticas da oposição, pela esquerda, ao governo Jair Bolsonaro. É compreensível. Após muitos anos de difusão do chamado Consenso de Washington, eis que na capital do mesmo nome surge uma administração a propor, entre outras coisas, emitir moeda, reforçar o papel do investimento estatal e taxar quem tem mais, para distribuir a quem tem menos.

A mudança ali, com as ondas de influência irradiadas mundo afora, soma-se vetorialmente por aqui a uma certa frustração com a colheita das políticas aplicadas desde pelo menos a Ponte para o Futuro de Michel Temer. Na sequência veio a dupla Bolsonaro-Paulo Guedes. É razoável admitir que existe alguma continuidade nas orientações definidas para a economia pelos governos que mandam no Planalto desde a ruptura de 2016.

Claro que a análise objetiva exige levar em conta as circunstâncias. Cada um de nós é ele mesmo e suas circunstâncias. Uma foi o governo Temer ter entrado em modo de sobrevivência por razões da área policial, e depois a pandemia da Covid-19 pegou pela proa a administração Bolsonaro. Mas aí enveredamos pelo terreno das explicações e justificativas. E na política, a exemplo de outras esferas da vida, quem começa a se explicar e justificar já está perdendo.

Os ventos bidenistas e a crônica pasmaceira econômica acenderam no Brasil o desejo de uma guinada. Mas qual a viabilidade dela? Que candidato com chances vai pegar a estrada em 2022 dizendo que irá fazer dívida pública pesada para ampliar o investimento estatal e prometendo tomar o dinheiro dos “ricos” (que no Brasil, na prática, incluem uma gorda fatia da classe média) para redistribuir renda pela mão do Estado?

Políticas econômicas precisam ter, antes de tudo, viabilidade política. Há sim teóricos respeitáveis que garantem: fazer dívida em moeda nacional não produz inflação. Mas qual presidente vai arriscar, no sempre instável cenário institucional brasileiro, colocar todas as fichas numa teoria contraintuitiva? Se der errado, seus autores no máximo farão autocrítica. Já o político provavelmente terá ido para o cadafalso, talvez metafórico.

Há uma diferença importante entre o Brasil e os Estados Unidos. Eles podem legalmente imprimir dólares sem lastro e nós podemos imprimir reais sem lastro, mas não parece que as consequências venham a ser as mesmas. Isso e outros fatores devem impelir os candidatos competitivos a buscar soluções mais convencionais. Uma em especial: a atração maciça de capitais externos para fazer subir a taxa de investimento privado.

Eis por que no próximo governo, pois entramos na etapa conclusiva deste, talvez um ministério de importância renovada será o das Relações Exteriores. E quem sabe não deveríamos voltar nossos olhos também para o Oriente, em vez de apenas para o Norte? É pouco razoável imaginar que a economia brasileira vai se erguer puxando os próprios cabelos para cima. Ou colocando todas as fichas de política exterior numa única casa.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação

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Publicado na revista Veja de 28 de abril de 2021, edição nº 2.737

 

 

Fonte:

 

Análise Política
http://www.alon.jor.br/2021/05/o-atraente-bidenismo.html

 

Veja
https://veja.abril.com.br/blog/alon-feuerwerker/o-atraente-bidenismo/


Alon Feuerwerker: Será a economia?

Os leilões de concessão na infraestrutura, federal e em estados, caminham bem, a alta do dólar deu uma aliviada nos últimos tempos e a Bolsa navega pelo dobro do ponto a que mergulhara um ano atrás. Os números de criação de empregos formais, os do Caged, são positivos e o resultado das grandes empresas no primeiro trimestre veio bastante bom.

Do outro lado, há dois dígitos de milhões de desempregados, uma segunda onda inclemente da Covid-19 e uma vacinação que caminha, mas ainda bem abaixo da cobertura necessária para, por exemplo, evitar uma possível terceira onda. E o termômetro político mostra altas temperaturas, elevadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado sobre a pandemia.

Na economia, resta pouca dúvida de que o setor exportador já se beneficia do forte ritmo de recuperação dos Estados Unidos (graças à vacinação) e da China (graças ao rápido controle da difusão do SARS-CoV-2). E o dólar num nível relativamente bom ajuda na substituição de importações, apesar de atrapalhar na importação de bens de capital.

Mas, e a resultante? As previsões mais frequentes para o curtíssimo prazo na economia brasileira são de certa retração combinada com alguma inflação. Esta segunda variável leva o Banco Central a aumentar a taxa básica de juros de maneira até algo agressiva. Tem margem para isso, porque o juro real andava, e ainda anda, bem negativo.

Se o BC vai acertar a mão, fazer a inflação convergir para a meta sem estender o período de recuo econômico, o futuro dirá. Outra coisa que o futuro vai dizer é se uma eventual recuperação econômica daqui até o final do ano vai conseguir mexer para baixo nos crônicos e altos números do desemprego. Que, sabemos, será um ponto apetitoso no debate de 2022.

Ainda sobre a economia, outra dúvida é o que a oposição de esquerda vai dizer no próximo ano. Se vai tentar replicar o Plano (do Joe) Biden e sugerir o enfrentamento crise por meio principalmente do endividamento e investimento públicos, ou vai novamente guinar ao dito centro e assumir os compromissos de continuidade habituais em anos eleitorais.

É razoável supor que muita coisa vai depender dos números. Se em meados de 2022 a economia estiver em recuperação, mesmo que lenta, o desemprego em queda, mesmo que suave, e o governo dizendo que enfrentou “a pior crise”, com a pandemia, é possível que a oposição tenha de mudar de assunto. Talvez não venha a ser “a economia, estúpido”.

Grande chance de ser “a pandemia, estúpido”. Mas como estará ela daqui a um ano e meio? Será que ainda vai sensibilizar?

Foi em algum grau o que aconteceu na eleição americana. Pouco se debateram os temas econômicos. A frente ampla antitrumpista formou-se com base na rejeição pessoal ao próprio Donald Trump, nas agudas tensões raciais desencadeadas pela morte de George Floyd e no enfrentamento da Covid. E deu certo para Biden. Ele está na Casa Branca e Trump voltou para a Flórida.

Pipocam teorias sobre a necessidade e a conveniência de um “Biden brasileiro”. Muita gente, até gente bem apetrechada para a eleição, quer ser. Nos aspectos não propriamente econômicos vai ser fácil de mimetizar, pois a agenda liberal americana está na ofensiva ideológica entre nós, e em todo o mundo. Mas, e na economia? Alguém vai arriscar?

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação

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Análise Política

http://www.alon.jor.br/2021/05/sera-economia.html


Alon Feuerwerker: O “argumento Anvisa”

Comissões parlamentares de inquérito atraem muita atenção na largada, pela novidade, mas precisam ser abastecidas por fatos novos para manter a audiência conforme o tempo passa e o público vai tendendo a se desinteressar. E é natural que cada lado busque achados para alimentar sua própria narrativa. A CPI da Covid não chega a ser original nesse aspecto.

O que a oposição quer? A digital de Jair Bolsonaro em alguma medida oficial que tenha, sem justificativa plausível, atrasado o início da vacinação no país. Num degrau abaixo, imagina também poder responsabilizá-lo pelo estímulo ao uso de medicamentos cuja eficácia para o tratamento da Covid-19 ainda não foi cientificamente comprovada, ou já foi descartada.

Este último ponto não será tão difícil assim de operar. O problema é que aqui o presidente está em companhia. Largas porções da comunidade médica navegam com ele no mesmo barco. E há uma divisão nas entidades de medicina. Algumas relevantes mantêm a orientação de que o médico pode receitar o que quiser, desde que de acordo com um paciente devidamente esclarecido sobre a situação.

Nas vacinas a coisa talvez complique um pouco mais para os acusadores. Inclusive porque a Anvisa têm oferecido argumentos para a defesa de Bolsonaro. Por exemplo ao bloquear a indiana Covaxin e a russa Sputnik V. O governo tem, neste caso, base para dizer “viu como eu fui prudente ao dizer que só compraria vacinas que fossem aprovadas pela Anvisa?”.

Aliás é um argumento já em circulação no governismo da CPI.

Vai ser curioso ver na CPI senadores dizendo que a Anvisa acertou ao embarreirar certas vacinas mas que Bolsonaro errou ao decidir só comprar os imunizantes depois de terem sido aprovados pela agência. Será preciso alguma ginástica. Mas nada que não possa ser resolvido pelos experientes parlamentares da comissão de inquérito.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação

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Análise Política

http://www.alon.jor.br/2021/04/o-argumento-anvisa.html