Rubens Bueno: Publicidade e prioridades

Nossa Constituição Federal determina que a “publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.”
Foto: Beto Barata\PR
Foto: Beto BarataPR

Nossa Constituição Federal determina que a “publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.”

No entanto, o caráter educativo, informativo e de educação social prescrito em nossa Carta Magna há muito cedeu lugar à promoção pessoal, à propaganda abusiva e à manipulação da opinião pública, com o objetivo de ludibriar a boa-fé dos cidadãos brasileiros e capturar a simpatia e adesão dos eleitores, difundindo virtudes e qualidades inexistentes, pregando falsas expectativas e alardeando promessas utópicas.

Os desmandos, no entanto, são ainda maiores. Mais graves do que essas distorções, têm sido as relações promíscuas que se estabeleceram entre o público e o privado, entre o interesse coletivo e o proveito pessoal, entre agentes e empresas de publicidade e governos, partidos e candidatos, beneficiando-se todos, mutuamente, do que uns tem a oferecer e outros se dispõem a desfrutar. A equação é simples: as empresas e agências servem a candidatos, candidaturas e partidos e, em contrapartida, os vencedores passam a contratá-las, propiciando proveitos às empresas que os serviram. Os interesses entrelaçados estão contaminando o sistema político brasileiro e apodrecendo os serviços públicos do Brasil.

Todos se lembram que, foi dessa relação promíscua, capitaneada por Marcos Valérios da vida, que nasceu o mensalão. E a população enxerga, horrorizada, a ausência de limites éticos entre relações que deveriam ser institucionais.

O Brasil apresenta distorções gravíssimas no gasto do dinheiro público. O mais inusitado é que faltam recursos para fazer face às demandas da sociedade, principalmente das camadas mais pobres, que estão a exigir, como se viu nas manifestações que começaram em junho de 2013, mais e melhor atendimento na área da saúde. Também falta dinheiro para a educação, para o transporte, a segurança, para terminar as inúmeras obras abandonadas, mas nunca falta dinheiro para a propaganda.

Em 2013, preocupado com esse tema, efetuei um Requerimento de Informação dirigido à então Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Helena Chagas, solicitando os dados do governo federal com propaganda nos últimos 10 anos.

Em sua resposta, a ministra informou inexistir base de dados consolidados sobre os pagamentos feitos por empresas públicas e sociedades de economia mista integrantes do Programa de Dispêndios Globais, pois tais dados somente poderiam ser obtidos mediante solicitação a cada uma delas. Ou seja, dificultou o acesso a informação.

A ausência de dados consolidados e a suspeita da existência de abusos nos compeliram a apresentar o Projeto de Lei nº 7.502/2014 que estabelece parâmetros conceituais para a publicidade oficial, nos estritos termos estabelecidos pela Constituição Federal, prevê sanções para quem descumprir a lei e impõe limites às diversas esferas do governo – federal, estadual, distrital e municipal para os gastos com propaganda oficial. Além disso, determina a divulgação dos valores analíticos e consolidados referentes a quaisquer ações de comunicação.

Para se ter uma ideia do caminhão de dinheiro público gasto com publicidade, levantamento efetuado pelo jornal O Estado de S. Paulo em agosto de 2013 revelou que entre 2003 e 2013 o governo gastou nada menos que R$ 16 bilhões em propaganda, em valores corrigidos pela inflação.

O jornal Folha de S. Paulo já havia publicado, em 19 de abril de 2011, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gastara com publicidade em 2010, o último ano de seu mandato, R$ 1,629 bilhão, 70,3% a mais do que seu antecessor Fernando Henrique Cardoso (PSDB) havia gasto em 2002, quando encerraram os oito anos de seu governo.

Em números deflacionados, de 2009 a 2014 (governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, do PT) o gasto esteve no patamar mais alto da série histórica iniciada em 2000, chegando ao pico de R$ 2,9 bilhões em 2013.

A partir de 2015, o valor começou a cair, para R$ 2,1 bilhão. O país vivia a recessão e os efeitos da Operação Lava Jato na Petrobras, estatal que sempre investiu muito em publicidade.

Em 2016, Dilma sofreu o impeachment. O vice-presidente Temer assumiu, e o valor caiu para R$ 1,5 bilhão.

No ano seguinte (2017), o primeiro exercício inteiro sob Temer, registrou um aumento para R$ 1,9 bilhão. Agora, o valor voltou a cair. Recentemente foi noticiado que neste ano – 2018, a verba destinada à propaganda oficial deve ficar em R$ 1,5 bi, patamar inferior ao da era PT.

Ao mesmo tempo, cresceu a publicidade da União em veículos na internet. Até aqui, o segmento só perde para a TV aberta no ranking, levando R$ 241 milhões neste 2018 —ou 20,3% do total. Os dois gigantes mundiais, Facebook e Google, lideram a aplicação de recursos.

Em 2018, até outubro, o valor gasto foi 34% menor do que no ano passado inteiro: R$ 1,24 bilhão. A expectativa da Secom é chegar à casa do R$ 1,5 bilhão até o fim do ano, ante R$ 1,9 bilhão em 2017.

Apesar da queda constante, os gastos com propaganda/publicidade oficial ainda são muito altos frente às prioridades da sociedade. E, principalmente em momentos de crise, a urgência de um governo deve ser o atendimento emergencial da população.

*Rubens Bueno é deputado federal pelo PPS do Paraná

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