Ricardo Noblat: Bolsonaro e os apagadores de incêndios

Repetiu-se ontem o que já se tornou corriqueiro nos últimos dois meses: o presidente Bolsonaro ateia mais um fogo e autoridades do governo e líderes de partidos aliados se apressam imediatamente em tentar apagá-lo. Muitas vezes funciona. Das vezes que não, ficam restos em brasa do estrago provocado. É um perigo.
Foto: Alan Santos/PR
Foto: Alan Santos/PR

Chamem o Mourão!

Repetiu-se ontem o que já se tornou corriqueiro nos últimos dois meses: o presidente Bolsonaro ateia mais um fogo e autoridades do governo e líderes de partidos aliados se apressam imediatamente em tentar apagá-lo. Muitas vezes funciona. Das vezes que não, ficam restos em brasa do estrago provocado. É um perigo.

Em seu primeiro café da manhã no Palácio do Planalto com jornalistas selecionados por ele mesmo, Bolsonaro precipitou-se em identificar vários pontos da proposta de reforma da Previdência que poderiam ser modificados – entre eles, o teto de 62 anos para aposentadoria das mulheres. Admitiu baixá-lo para 60 anos.

Foi um alvoroço dentro da equipe econômica comandada por Paulo “Posto Ipiranga” Guedes, e entre os militares que cercam de perto Bolsonaro. Se logo de saída, sem que tenha começado a negociação com o Congresso para aprovação da reforma, o presidente começa a fazer concessões, como será mais tarde? O que sobrará dela?

O chefe da brigada dos apagadores de incêndio correu a apagar o fogo que ameaçava se alastrar. Acostumado à tarefa, o vice-presidente Hamilton Mourão disse que Bolsonaro foi mal interpretado. E ofereceu a interpretação que julga correta:

– O presidente mostrou que tem coisas que o Congresso poderá negociar ou mudar. Só isso. Não que ele concorde.

O que disse Mourão havia sido antecipado pelo líder do governo na Câmara, major Vitor Hugo (PSL-GO), outro brigadista. Segundo o major, Bolsonaro limitou-se a demonstrar a disposição do governo de negociar” a reforma. Calado estava, e calado permaneceu o ministro de tudo o que tem a ver com a economia, inclusive os penduricalhos.

No mesmo café da manhã com jornalistas, sentindo-se em ambiente seguro e amigável, Bolsonaro afirmou que não descarta a hipótese de conversar com o ditador Nicolás Maduro sobre a crise na Venezuela, assim como o presidente Donald Trump tem conversado com Kim Jong-um, o ditador da Coreia do Norte. É diferente, mas que fazer?

Mourão foi novamente chamado ao palco. Informou que o Brasil não procurou representantes do regime de Maduro para estabelecer qualquer tipo de diálogo com o governo da Venezuela. E que o comentário feito por Bolsonaro decorreu de uma “pergunta hipotética”. O comentário pode ter sido hipotético, a pergunta não foi.

E assim o país viverá os próximos quatro anos – ou exatos três anos, 9 meses e 28 dias. Um governo biruta, que oscila ao sabor dos ventos, sujeito a incidentes de percurso e a intervenções nem sempre felizes de um chefe de família com seus garotos, precisa de bombeiros eficientes e dispostos a socorrê-lo. Ainda bem que eles existem.

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