Recaída de milhões de latino-americanos na pobreza é evitável com políticas públicas de nova geração

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Para prevenir retrocessos, novo RDH Regional recomenda proteção social, sistemas de cuidado, qualificação profissional e redução de desigualdades de gênero, raça e etnia.

A principal ameaça ao progresso na região é a recaída de milhões de famílias na pobreza, ainda que a desaceleração econômica não seja a única responsável por tal retrocesso, segundo o Relatório de Desenvolvimento humano (RDH) para América Latina e Caribe do PNUD, lançado hoje junto a mais de 75 legisladores da região na sede do Parlamento Latino-americano e Caribenho (Parlatino) na Cidade do Panamá. O relatório sustenta recomendações para que a região impeça retrocessos e continue avançando nos aspectos social, econômico e ambiental, com políticas públicas de nova geração, alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

No relatório intitulado Progresso Multidimensional: bem-estar além da renda, o PNUD manifesta especial preocupação pelas 25 a 30 milhões de pessoas – mais de um terço da população que saiu da pobreza na região desde 2003 – que estão vulneráveis para recair na pobreza. Muitas são jovens e mulheres com precária inserção no mercado de trabalho no setor de serviços da região. Fazem parte de um grupo maior, de 220 milhões de pessoas (38%, quase dois em cada cinco latino-americanos), que oficialmente nem são pobres, e nem conseguiram entrar para a classe média, correndo risco de recair na pobreza.

O relatório destaca que o os fatores que determinam a saída da pobreza são diferentes dos que previnem que as e os latino-americanos voltem a recair. Na década passada, o mercado de trabalho e a educação foram dois grandes motores para deixar a pobreza. No entanto, é fundamental que as políticas públicas de nova geração fortaleçam os quatro fatores que impedem retrocessos: proteção social, sistemas de cuidado, ativos físicos e financeiros (como carro, casa própria, conta de poupança ou dinheiro em banco que atuam como “para-choques” ou amortecedores durante as crises), e qualificação profissional. Esses elementos-chave compõem o que o RDH denomina cestas de ‘resiliência’, que é a capacidade de absorver choques e prevenir retrocessos, fundamental para a região neste momento de desaceleração econômica.

O RDH faz um chamado para repensar o modelo latino-americano de progresso para um conceito multidimensional, em concordância com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e que possa transcender o uso de renda per capita, o ritmo do crescimento econômico e o Produto Interno Bruto (PIB) como critérios privilegiados para medir o nível de desenvolvimento. Só o crescimento econômico não é suficiente. Nada que diminua os direitos das pessoas e das comunidades ou que ameace a sustentabilidade ambiental pode ser considerado progresso, destaca o relatório.

“Os desafios de um desenvolvimento sustentável, holístico e universal não expiram ao alcançar um determinado limiar de renda: não superaremos os desafios de desenvolvimento a menos que demos respostas apropriadas à múltiplas dimensões que permitem às pessoas terem vidas que considerem valiosas”, disse a Subsecretária-Geral das Nações Unidas e Diretora Regional do PNUD para a América Latina e o Caribe, Jéssica Faieta no lançamento junto ao Presidente Juan Carlos Varela do Panamá. “Neste momento, por um lado temos que proteger os avanços e prevenir que milhões de pessoas voltem a cair na pobreza e por outro lado temos que estimular políticas e estratégias inclusivas e integrais adaptadas a populações que sofrem de discriminações e exclusões históricas”.

Mais do mesmo não rende o mesmo – Ainda que, na região, tenham saído da pobreza cerca de 72 milhões de pessoas e tenham entrado na classe média 94 milhões de pessoas entre 2003 e 2013, os últimos três anos viram uma desaceleração e depois uma reversão dessa tendência. Segundo o RDH, a média anual de latino-americanos que saíram da pobreza foi de quase 8 milhões entre 2003-2008 e de 5 milhões entre 2009-2014. Entre 2015 e 2016, aumentou o número absoluto de pessoas pobres, pela primeira vez na década.

Isso acontece pelos limites da expansão laboral e fiscal na região. O mercado de trabalho na América Latina, na maior parte é informal, segundo o RDH. Mais da metade dos 300 milhões de trabalhadores na região são: assalariados em microempresas com menos de cinco vagas de trabalho, autônomos sem qualificação ou aqueles que não recebem renda (programas de aprendizagem, por exemplo). De igual forma, das mais de 50 milhões de empresas pequenas e médias, 70% são informais, e dois a cada três novos empregos criados na região foram no setor de serviços, que tem baixa produtividade e altas taxas de informalidade. Sem aumentos futuros da produtividade dos setores de baixa qualificação profissional, a sustentabilidade do crescimento e, em consequência, das conquistas sociais, acabam sendo comprometidos, aponta o RDH.

Além disso, a expansão de transferências sociais e pensões não contributivas, que explicam cerca de 30% da redução da desigualdade de renda desde 2002, também encontra um teto fiscal. Igualmente, o relatório destaca que o peso da carga tributária nos pobres é tão alto na região que costuma anular o benefício recebido por programas de transferência de renda. Dessa forma, o RDH ressalta que melhorar a efetividade e progressividade do sistema fiscal no seu conjunto é um desafio urgente para a região.

Investir nas mulheres e em políticas de cuidado é fundamental para que a região possa avançar, diz o relatório. Ainda que a proporção de mulheres com nível universitário na região tenha sido mais alta (17,3%) que a correspondente proporção de homens (14,8%), em 2013, a média salarial por hora das mulheres era 16,4% menor que a dos homens. Além disso, as mulheres dedicam três vezes mais tempo em trabalhos de cuidado e deveres domésticos que os homens. As tendências demográficas e a ausência de mecanismos de cuidado (especialmente para crianças e adultos mais velhos), combinadas com o aumento da participação laboral feminina, restringem uma melhor inserção da mulher no mercado de trabalho e a geração de renda nos lares, destacou o relatório.

“Ser mulher, afrodescendente, indígena, LGBTI, jovem, pessoa com deficiência, tudo isso afeta as oportunidades, a possibilidade de ascensão social e econômica e o acesso a serviços públicos na região”, disse o principal autor do relatório e economista chefe do PNUD para a América Latina e o Caribe, George Gray Molina. “Cada geração latino-americana decide o tipo de mudança estrutural que vai seguir: restam ainda hoje transações de cidadania e de resiliência que não vão ser resolvidas com mais crescimento econômico”.

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Sobre o RDH Regional

Este terceiro Relatório de Desenvolvimento Humano para a América Latina e o Caribe é uma publicação com independência editorial do PNUD. Foi elaborado com o apoio financeiro da Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (AECID). Participam do Conselho Assessor do relatório mais de 20 autoridades entre ministros, senadores e acadêmicos. A segunda parte do relatório, o Relatório sobre Desenvolvimento Humano para o Caribe, com especificações e recomendações para o Caribe de língua não-hispânica, será lançado em julho de 2016.


Fonte: pnud.org.br

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