No momento mais delicado desde a democratização encaramos uma eleição que será decidida pelo ódio
É tentador lembrar que Jair Bolsonaro é o candidato que ensina crianças a atirar, transforma um tripé de câmera em metralhadora, e fala de armas, de tiros, de violência. Mas foi Bolsonaro quem sofreu um atentado, ontem. É ele que foi arrancado da campanha eleitoral e passará as próximas semanas se recuperando, incapaz de andar pelas ruas carregado pelo povo, seu forte político. E, principalmente, ele não detém o monopólio da violência na política brasileira.
Há muitas formas de violência, nem todas tratam de armas. Os últimos debates entre Dilma Rousseff e Aécio Neves, na eleição de 2014, foram duros, agressivos, carregados de ódio. É ódio que se percebe nas ruas e nas redes. Ódio que parte do PT. E ódio que existe contra o PT.
A polarização que entorna em ódio interessa a quem ganha votos por ter um inimigo a bater. Gostamos de dizer que violência não tem parte na cultura política brasileira. Porém, um soldado sacou uma peixeira e partiu contra o primeiro presidente civil, Prudente de Moraes. Matou seu ministro da Guerra. O candidato a vice de Getúlio Vargas em 1930, João Pessoa, foi assassinado a tiros na campanha. Em 1954, o chefe da Segurança do próprio Getúlio disparou contra Carlos Lacerda, matando um major que o escoltava.
A violência está entre nós. Neste ano mesmo tiros foram disparados contra uma caravana de Lula. A vereadora carioca Marielle Franco foi assassinada e não há notícia de solução. Crimes sem solução passam uma mensagem clara: a violência está permitida. O discurso de quem transforma antagonista em inimigo incentiva esta mesma violência.
E cá estamos neste ponto ao qual chegamos. No momento mais delicado desde a democratização encaramos uma eleição que será decidida pelo ódio. Um ódio que se sustentou em cada um dos quatro anos desde então. Nada sugere que será diferente a partir de agora. Nada fora a esperança de que o eleitor vote num candidato que não vê as ideias dos outros como algo a calar para todo sempre. Você, eleitor. Não odeie o adversário. O Brasil talvez não aguente se continuar assim.