PD #49 – Monica de Bolle: A falência das nações

O lastro de qualquer reforma é a credibilidade do governo que a propõe: a da Previdência está aí como exemplo.
Foto: Agência USP
Foto: Agência USP

O lastro de qualquer reforma é a credibilidade do governo que a propõe: a da Previdência está aí como exemplo.

Por que alguns países são ricos e outros pobres? Por que alguns países são inicialmente mais ricos do que outros,  mas, com o passar dos anos, tornam-se mais pobres? O que explica o crescimento econômico sustentável e a melhoria na qualidade de vida das sociedades?

Em 2012, os economistas Daron Acemoglu e James Robinson publicaram um livro extraordinário intitulado Why Nations Fail: The Origins of Power, Prosperity and Poverty. Embora o tenha lido quando de seu lançamento, na época não soube apreciar adequadamente a relevância da obra para o Brasil.  Ao  relê-lo,  vi retratadas em suas páginas todas as mazelas que nos afligem –  da  falência institucional à crise econômica, às inúmeras dificuldades  de  fazer reformas sem profunda mudança política.

O livro expõe com clareza – ilustrando em detalhe a experiência de diversos países – que é a natureza das instituições políticas que determina a distribuição de  recursos,  o  cresci- mento, e o relativo “sucesso” econômico das nações. De forma simplificada, países onde as instituições  políticas  são  moldadas por grupos interessados em  extrair  recursos  do  Estado  em  vez  de garantir o bem-estar da sociedade,  instalam-se  o  caos, as crises, a pobreza, a corrupção.

Curiosamente, os autores dedicam parte de um  capítulo  ao Brasil – não como exemplo de  nação  “falida”,  mas  como  exemplo de superação: citam a mobilização social e a ascensão do PT  ao poder em 2003, como exemplo de reconstrução das instituições brasileiras, tornando-as mais “inclusivas”.

Passados os anos do lulopetismo, que jamais teria se consolidado sem a ajuda do que havia de mais status quo na política brasileira, sabemos que não houve revolução alguma. Os que ocuparam – e ainda ocupam – os mais altos escalões do poder, usaram e continuam a usar as instituições em  benefício  próprio. Sem que haja a desejada transformação política capaz de remodelar as instituições em favor da sociedade, corremos o risco de assistir repetecos infindáveis dessa história.

Sem que haja a desejada renovação política, tampouco é possí-   vel esperar que  as  reformas  econômicas  de  que  necessitamos sairão do papel sem serem desvirtuadas e distorcidas. O lastro de qualquer reforma é a credibilidade do governo que a propõe – a reforma da Previdência está aí como exemplo. Inicialmente formu- lada pelos princípios corretos, hoje está profundamente diluída e descaracterizada em nome da sobrevivência política daqueles que ainda andam com desenvoltura por Brasília, apesar de seus desmandos e tropeços, áudios e visitas. Não falo apenas do presi- dente da República e de seu círculo íntimo de assessores defenes- trados, mas do senador e ex-candidato à Presidência em 2014.

Que respaldo terá uma reforma aprovada por esse senhor e por outros de seus colegas no Congresso Nacional também envolvidos em atos escusos? O que é melhor, fazer uma reforma da Previdência de qualquer jeito, deixando de fora boa parte das causas principais de nossos problemas fiscais de médio prazo por conveniência política, ou aguardar os resultados de outubro de 2018?

Sem querer exagerar a relevância da experiência de nossos vizinhos, a Argentina parece estar conseguindo fazer a renovação política, o que aumenta as chances de que boas reformas, respaldadas pela credibilidade conferida pelas urnas, sejam levadas a cabo.

Há no Brasil muita movimentação e pressão para que venha a renovação. Movimentos como o Agora! e outros estão empenhados em promover mudanças políticas que garantam a modernização institucional, sem a qual as necessárias reformas sofrerão o mesmo destino de tantas outras feitas por nós e por outros países, o roteiro delineado por Acemoglu e Robinson mundo afora.

Ao mesmo tempo, há um sentimento inexplicável de nostalgia por um passado inexistente, uma onda que tenta pregar o liberalismo na economia e o retrocesso nas questões sociais, levantando a bandeira de um conservadorismo velho, gasto, que parecia em vias de extinção. Este conservadorismo corre o risco de abraçar o que aí está com caras supostamente novas, mas que não necessariamente defendem a renovação institucional.

O conservadorismo mais puro é aquele que prega que “tudo mude para que nada mude”, como escreveu Giuseppe di Lampe- dusa. É isso o que precisamos evitar em 2018.

 

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