PD #49 – Mauricio Huertas: Na política muda-se tudo para não mudar nada!

Quem acompanha o noticiário político diário já deve ter dado um nó em seus neurônios! Quando você vai dormir, as regras que estão valendo são de um jeito; quando você acorda, já estão de outro. Isso vale principalmente para esse desarranjo eleitoral (que alguns chamam de “reforma”) promovido a toque de caixa por deputados e senadores que fazem de tudo para não largar o osso do poder.

Quem acompanha o noticiário político diário já deve ter dado um nó em seus neurônios! Quando você vai dormir, as regras que estão valendo são de um jeito; quando você acorda, já estão de outro. Isso vale principalmente para esse desarranjo eleitoral (que alguns chamam de “reforma”) promovido a toque de caixa por deputados e senadores que fazem de tudo para não largar o osso do poder.

Cria-se um fundo público bilionário, obviamente beneficiando os maiores partidos; recria-se a cláusula de desempenho, desta  vez,  obviamente, prejudicando  os   pequenos  partidos.  O maior problema, entretanto, não é enfrentado. As novas regras não punem os maus políticos, nem aquelas legendas de aluguel que vendem seus preciosos minutos da propaganda na TV para  os candidatos favoritos. Quem se dá mal nisso tudo são as siglas de conteúdo ideológico e que abrigam os políticos verdadeira- mente interessados em fazer uma política diferenciada e voltada para o bem comum.

A quantidade de coisas acontecendo ao mesmo tempo, as idas e vindas das reformas no Congresso, a enxurrada de escândalos, denúncias, delações, depoimentos – tudo muda o tempo todo no mundo, e cada vez mais rápido! Mas, ao contrário do que canta o   Lulu Santos na música “Como uma onda”, aqui parece  que  nada passa e, se é verdade que tudo o que se vê  não  é  igual ao  que  a gente viu há um segundo, no fim das contas parece que tudo acaba mudando só para voltar exatamente ao que era antes, porque os políticos vivem fugindo da realidade e mentindo sem escrúpulos.

Tudo bem, vamos relativizar, afinal a ética e o bom senso ensinam a não generalizar. Mas, cá entre nós, quantos são os políticos que se distinguem pela ética e pelo bom senso? É a minoria  da minoria! Dá para contar nos dedos! Político honesto é bicho em extinção! O que se vê no dia a dia do Congresso, das assembleias estaduais e câmaras municipais é de encher de vergonha quem busca um pouquinho de seriedade, vocação democrática, interesse público e espírito republicano nos representantes do povo.

As eleições de 2018 serão prioritárias para o redirecionamento do futuro do país. Estamos em uma encruzilhada histórica. Para onde desejamos caminhar? Retroceder, virar à esquerda, à direita ou seguir em frente e ao centro? Claro que essa simbologia é apenas uma simplificação de todo um contexto político, econô- mico, social e cultural muito mais complexo. Mas não deixa de ser representativo da realidade. Vamos acertar o passo?

A jovem democracia brasileira está em crise e não é de hoje, mas a ressaca pós-PT ajuda a aumentar a sensação de frustra- ção e de fraude ideológica. A onda de conservadorismo é avassa- ladora. Num indo e vindo infinito ressurgem o ódio, a intolerân- cia, a censura, o preconceito nas ruas e nas redes. Gritam por intervenção militar. Enxovalham as instituições. Depreciam o valor da luta pela redemocratização do país como se fosse um fato de menor importância. Que momento político triste este que vivemos… Precisamos reagir!

Para onde caminha o brasil?
O livre pensar é um direito. Uma conquista. Então, vamos  lá: Para onde caminha  o  Brasil?  Parece  haver  consenso  nos  dois lados da trincheira, entre governistas e  opositores,  que  o  governo do presidente Michel Temer é simplesmente uma transição  do pós-PT para algo que  está  por  vir,  um  futuro ainda desconhecido. A escolha democrática se dará em outubro de 2018.  O  grupo  que está hoje no poder é simplesmente consequência dos caminhos políticos e institucionais trilhados – e não há aqui qualquer julga- mento de mérito, apenas uma constatação óbvia dos fatos.

Esteja você do lado que estiver, tendo gritado “Fora Dilma” ou “Fora Temer” (ou ambos), situado mais à direita ou mais à esquerda no velho mapa partidário e ideológico, a sua cota de responsabilidade será cobrada nas eleições de 2018, quando escolheremos o(a) presidente da República, senadores e deputados federais que guiarão os rumos do país no Executivo e no Congresso Nacional.

Grosso modo, teremos em 2018 um menu bastante variado de opções, possibilitando que os eleitores votem livremente naqueles candidatos que considerem melhores, mais preparados ou mais adequados para o momento que o país vive. Nunca se teve tanta informação e transparência tão reveladora das entranhas do sistema político-eleitoral como se tem agora, o que não se traduzirá necessá- ria e automaticamente na melhoria da qualidade dos eleitos.

É por isso que este convite à reflexão nos parece tão urgente e oportuno. De que adianta seguirmos militando nas redes e nas ruas, manifestando nossas preferências ou, ao contrário, protes- tando contra tudo aquilo e todos aqueles que repudiamos,  às  vezes em disputas fratricidas dentro de um mesmo campo demo- crático e republicano, se não formos capazes de promover ações verdadeiramente transformadoras através do voto?

O cenário das próximas eleições é ainda bastante incerto, mas já começam a se desenhar no horizonte as primeiras candidatu- ras. Num contexto global de exacerbação do radicalismo, com o quadro nacional propenso também a buscar salvadores da pátria aleatórios diante do descrédito da política mais tradicional, tornam-se preocupantes os destinos do país, da economia, dos direitos sociais e individuais, das garantias constitucionais de liberdade, segurança, desenvolvimento, bem-estar, igualdade e justiça como valores supremos.

Mas não venham apontar a Lava Jato e outras operações da Polícia Federal e do Ministério Público, nem suas gravíssimas implicações na Justiça, como “culpadas” da degradação que macula, desonra e constrange a maioria dos partidos e de seus mandatários. É triste que tenhamos chegado tão fundo do poço moral e ético, mas é alvissareiro que ainda possamos reagir demo- craticamente para sanear e desenxovalhar a política sem atalhos fascistas, autoritários e antirrepublicanos.

É salutar que velhos caciques, sobretudo os envolvidos em esquemas de corrupção e Caixa 2, percam o lugar cativo que mantinham há décadas, abrindo espaço para novas lideranças e organizações que possam arejar a nossa democracia representativa, aprimorar a democracia participativa e instituir mecanismos cada vez mais necessários da democracia direta.

Portanto, é difícil afirmar diante das incertezas da política para onde caminha o Brasil, mas seguramente o rumo certo será dado na medida em que o maior número de cidadãos tiver a capa- cidade de se reunir, refletir e agir com isenção, responsabilidade, consciência, ética, equilíbrio, maturidade e espírito coletivo para enfrentar os desafios que se colocam à nossa frente. Que essas dores do crescimento sejam apenas sintomas naturais da construção de uma verdadeira nação.

Refundar a Esquerda Democrática?
Depois de fundada pelo Partidão na década de 20, aprofundada pelo Partido dos Trabalhadores na década de 80, infundada pela clonagem de legendas com o mesmo DNA petista nas décadas de 90 e 2000, e finalmente afundada pelos chamados governos de coalizão (feat corrupção) de Lula e Dilma, parece ter chegado a hora de refundar a esquerda brasileira com os sobreviventes deste período paleolítico e potenciais agregados, como jovens ativistas, sustentabilistas, socialdemocratas e hackers da nova política.

Não que seja tarefa simples, a começar pela definição do que é   ser de esquerda ou de direita hoje. Diante da complexidade do  mundo atual, o binarismo ideológico se torna cada vez mais obso- leto, extemporâneo e inconclusivo.  Isto  se  já  não  bastasse,  além  do fracasso do socialismo no mundo, o PT ter enxovalhado esse conceito teórico sem nunca ter executado minimamente um programa de esquerda – vide os exemplos petistas em administrações municipais, estaduais e no governo federal.

As experiências mais próximas vivenciadas pelo Brasil  com  o que se convencionou chamar de esquerda não passaram de  discursos  oposicionistas  e,  no  governo,  de  flertes  esporádicos:  com o trabalhismo populista de Getúlio Vargas, a brevidade  de  Jango entre o parlamentarismo oportunista e o golpe de 64, e posteriormente com os acenos à socialdemocracia de FHC e Lula, sendo o tucano – que surfava na onda do Real – prejudicado pelo casamento arranjado com o PFL e por episódios como a compra de votos para a reeleição; e o petista, apesar do sucesso de políticas compensatórias e ações  de  combate  à  miséria,  por  ter  se  rendido a tudo aquilo que o PT prometia enfrentar desde a sua criação.

Fato é que chegamos a esta crise sem precedentes – o que leva   a população a  condenar  genericamente,  não  sem  razão,  a  política e os políticos,  mas  sobretudo  a  esquerda,  cujas  ideias  jamais foram implementadas por aqui. Eis o desafio de quem ainda busca vida inteligente na terra arrasada da democracia representativa brasileira, com algum viés esquerdista: a opção pela redução das desigualdades, pela justiça social, pela cidadania plena, pela distribuição de renda, pela  promoção  da  cultura  da  paz,  pelo papel regulador do Estado e até pela manutenção da utopia – características que em geral a direita despreza.

É neste contexto, por exemplo, que o filósofo Ruy Fausto apresenta o livro Caminhos da esquerda – que a grande imprensa tem debatido – e que outros grupos vêm se reunindo  para  tentar  ir além do debate político partidarizado, polarizado,  raivoso  e  estéril, dispostos a encontrar alguma luz no fim do túnel para trans- portar os ideólogos da esquerda democrática  da  atual arena visceral para um campo vicejante.

Se é desalentador um cenário em que as primeiras sondagens para 2018 apontem a força crescente de um Bolsonaro à direita ou a teimosa e renitente popularidade de Lula quase como um novo Macunaíma, o herói sem caráter da esquerda preguiçosa, também é verdade que chegou o momento de agir com firmeza e efetividade para construir uma alternativa melhor.

A luz que o eleitorado busca não pode ser, à esquerda, o fogo- fátuo da decomposição petista, nem o farol da direita bolsonarista que se apresenta como trem-bala mas não passa de maria-fumaça. Para repor a esquerda nos trilhos, também parece pouco adequado depositar esperanças nos maquinistas de trem fantasma Guilherme Boulos e Ciro Gomes, que se lançam com ações e pensamentos descarrilados.

Exercícios de futurologia à parte, o mais provável é que o  próximo eleito seja um nome do atual sistema – até porque a necessária reforma  político-partidária  não  avançou  muito  além dos limites protecionistas e do instinto de sobrevivência dos atuais congressistas. Alguém tarimbado e de perfil mais próximo  do  centro, evitando as saídas mais extremistas, é o que se busca na maioria dos partidos.

A centro-direita busca uma peça confiável na plataforma mais tradicional (Geraldo Alckmin, Rodrigo Maia ou Henrique Meirelles, por exemplo) ou reconfigurada (João Doria). A centro-esquerda não descarta um movimento de código aberto (lança balões de ensaio como Joaquim Barbosa e busca outras figuras  do meio jurídico para a vaga de vice), mas deve mesmo optar por algum relançamento: Marina Silva, Eduardo Jorge, Fernando Gabeira, Cristovam Buarque, Álvaro Dias e até Fernando Haddad são nomes sempre bem cotados.

Outra opção seriam os outsiders da política, salvadores da pátria que surgem como astros com luz própria e acabam quase sempre com o brilho efêmero de um vaga-lume. Historicamente podem se dar bem com um banho de marketing “collorido”, como ocorreu em 1989 com o fictício caçador de marajás que se tornou presidente do Brasil. Mas o fim dos aventureiros costuma ser trágico e a eleição presidencial não pode servir como startup de malucos. Por isso é hora de reinstalar o sistema da esquerda democrática, eliminando os bugs da velha política.

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