O Globo: entenda por que a eleição no Congresso é decisiva para o governo Bolsonaro

Escolha dos novos chefes do Congresso na segunda metade do governo de Jair Bolsonaro será decisiva para as marcas que o presidente deixará ao fim de seu mandato — e, consequentemente, para a possibilidade de se reeleger.
Foto: Marcos Corrêa/PR
Foto: Marcos Corrêa/PR

Escolha dos novos chefes do Congresso na segunda metade do governo de Jair Bolsonaro será decisiva para as marcas que o presidente deixará ao fim de seu mandato — e, consequentemente, para a possibilidade de se reeleger

Paulo Cappelli, Isabella Macedo e Julia Lindner, O Globo

BRASÍLIA — A escolha dos novos chefes do Congresso na segunda metade do governo de Jair Bolsonaro, em 1º de fevereiro, será decisiva para as marcas que o presidente deixará ao fim de seu mandato — e, consequentemente, para a possibilidade de se reeleger. Ampliar as reformas econômicas, cumprir promessas de campanha e implantar uma agenda ideológica dependerão dos futuros presidentes do Legislativo.

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Na Câmara, há pressão de bolsonaristas para que o candidato do Palácio do Planalto dê andamento a pautas conservadoras que ficaram emperradas. Mas, no Senado, nem mesmo os governistas estão dispostos a dar abertura ao discurso na área de costumes enfatizado pelo presidente da República.

Aliados do governo avaliam que, caso o candidato apoiado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), vença a eleição, pautas de costumes ligadas ao bolsonarismo terão ainda mais dificuldade de serem levadas ao plenário. Por isso, eles tentam negociar a tramitação das matérias com o deputado Arthur Lira (PP-AL), apoiado pelo Planalto na disputa.

— O governo quer desburocratizar o acesso às armas e reduzir os impostos na área. Quer também acabar com a ideologia nas escolas, de esquerda ou de direita. Já na questão ambiental, é necessária uma flexibilização para tornar mais rápida a emissão de licenças — afirma o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), que integra a ala bolsonarista do partido e já declarou voto em Lira.

O candidato do Planalto, porém, tem evitado falar publicamente sobre essas pautas e, em conversas com a oposição, garante não haver compromisso de levá-las adiante. Uma declaração de Bolsonaro na semana passada, no entanto, deu a entender que o governo fará pressão. O presidente disse que vai reenviar em fevereiro um projeto sobre regularização fundiária, tema de uma Medida Provisória (MP) que, este ano, flexibilizou as exigências para a titulação de terras. A MP perdeu a validade sem ser votada.

Alinhamento econômico

Com relação às pautas econômicas, disputas políticas travaram o andamento delas em 2020. A expectativa de governistas é que no próximo ano seja possível retomar com mais facilidade a discussão das reformas administrativa e tributária, independentemente dos vitoriosos nas corridas pelas presidências de Câmara e Senado, pois há maioria no parlamento a favor dessas agendas. Outras pautas econômicas no horizonte são a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial — que trata de medidas administrativas que poderão ser usadas pelos entes federados para reduzir despesas —, a criação do Renda Cidadã e a privatização de estatais.

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No Senado, nem os candidatos alinhados ao governo indicam ter disposição de colocar em pauta temas controversos defendidos pelo presidente. Exemplo disso foi a postura do líder do governo na Casa, Fernando Bezerra (MDB-PE), um dos cotados na disputa à presidência, durante sessão na última semana. O senador votou a favor do decreto que susta a portaria editada pelo presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo, retirando nomes como Milton Nascimento e Gilberto Gil da lista de personalidades negras.

— Eu fico em uma posição muito delicada, porque, como líder do governo, teria que fazer a defesa do decreto da Fundação Palmares, mas, como senador de Pernambuco, com uma trajetória de vida pública nessa Casa e na Câmara, quero me aliar a todos os líderes partidários e votar sim — disse Bezerra.

Um dos poucos a contestarem a votação foi o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente.

Outro possível candidato do MDB, que mantém proximidade com o Planalto, é o líder da bancada no Senado, Eduardo Braga (AM). Nas conversas que manteve na semana passada, ele disse que tem compromisso com pautas pela responsabilidade fiscal, como a manutenção do teto de gastos, e que deem boas sinalizações ao mercado para atrair investimentos. E diz que não dará prioridade à chamada pauta de costumes.

Diálogo no senado

Nos últimos dois anos, em contraste aos embates protagonizados com Maia, Bolsonaro manteve uma boa relação com Davi Alcolumbre. Senadores consideram, no entanto, que o atual presidente do Senado conseguiu barrar a agenda conservadora de maneira discreta, sem ter que partir para um confronto direto. Alcolumbre quer lançar na disputa um senador independente do governo, mas que consiga ter diálogo com o Planalto — o favorito é Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

O analista político e diretor licenciado de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz, avalia que a pauta de costumes não encontra apoio suficiente no parlamento e ficaria travada na Casa mesmo diante da vitória de um candidato apoiado por Bolsonaro:

— A agenda de costumes vai travar. Nós temos parlamentares que não vão aceitar essa mentalidade do governo de retroceder em uma série de conquistas civilizatórias, em temas com posições já consolidadas, até internacionalmente.

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