Míriam Leitão: Renda cidadã e o senador sem noção

Desde que apresentou o programa Renda Cidadã, o senador Márcio Bittar (MDB-AC) tem defendido a proposta como um cidadão sem noção.
Foto: Agência Senado
Foto: Agência Senado

Por Alvaro Gribel (interino)

Míriam Leitão está de férias

Desde que apresentou o programa Renda Cidadã, o senador Márcio Bittar (MDB-AC) tem defendido a proposta como um cidadão sem noção. Em inúmeras conversas e entrevistas nos dois últimos dias, Bittar tem deixado de cabelo em pé seus interlocutores, sejam eles jornalistas, economistas ou investidores do mercado financeiro. Sem nenhum constrangimento, é capaz de afirmar na mesma frase que “atraso no pagamento de dívida não é calote”, para depois acusar de “hipócritas” aqueles que entendem o contrário. Quanto mais Bittar fala, menor parece a chance de aprovação do novo programa de renda mínima.

“O governo brasileiro está renegociando sua dívida”, justifica. Em qualquer lugar do mundo, o nome disso é calote, especialmente quando é feito de forma unilateral, sem negociação. No caso dos precatórios, o governo atrasará o pagamento mesmo após decisão judicial. Mas Bittar não se deixa abalar e complementa: “Você vai pagar praticamente um terço do que deve e dizer ao credor: O mundo entrou em uma crise e nós não saímos dela ainda, vamos ter que equacionar.” A fala contraria não apenas os bons costumes econômicos, como demonstra que a recuperação não é tão rápida quanto diz o governo, já que o Renda Cidadã só entraria em vigor no ano que vem.

Bittar disparou indiretas ao aliado Paulo Guedes. Disse que “o mercado não é Deus” e que em uma reunião com o governo fez questão de dizer “a um ministro” que se os investidores fossem tão inteligentes não teriam apoiado governos de esquerda no Brasil. Ainda assim, dividiu o ônus do projeto com a equipe econômica. “Não apresentaria uma proposta que não estivesse chancelada pela equipe econômica do governo do presidente Jair Bolsonaro, através do ministro Paulo Guedes.”

Bittar já havia chamado atenção no ano passado quando apresentou um Projeto de Lei ao lado do senador Flavio Bolsonaro para acabar com a Reserva Legal. Se fosse aprovado, as propriedades rurais ficariam liberadas para o desmatamento de vegetação nativa. O PL não foi adiante, mas não antes de os senadores afirmarem que “o aquecimento global era discurso apocalíptico para barrar o progresso” e que os EUA eram mais ricos que o Brasil porque derrubaram suas florestas a favor da agricultura.

Ontem, irritado com uma pergunta da jornalista na Globonews, Bittar a chamou de “querida”, para depois confundir Nelson Rodrigues com Nelson Gonçalves e afirmar que “a vida é como ela é”. Queria dizer que o governo enfrentaria resistências caso tentasse cortar gastos para financiar o programa, e que por isso buscou outro caminho. Como todo sem noção, não percebeu que confessava naquele momento o truque da contabilidade criativa.

Brasil fica para trás

Enquanto a bolsa brasileira está em último lugar na comparação com outras seis economias emergentes (veja ao lado), com perdas de 42% em dólar este ano, o principal índice da Coreia do Sul tem valorização de 4,85%. Curiosamente, o país asiático foi dos que melhor controlou a pandemia, com testes em massa, rastreamentos e isolamento social. No Brasil o governo deixou o vírus correr solto, ao mesmo tempo em que abriu a torneira dos gastos. O resultado foi desvalorização da moeda e queda da bolsa, que em reais também não voltou ao nível pré-pandemia.

Locador X locatário

O Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP) já fez as contas para o reajuste dos aluguéis tendo como referência o IGP-M. O índice calculado pela FGV disparou 17,94% nos 12 meses até agosto e pode dar dor de cabeça aos inquilinos. Mas para o professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, não faz sentido usar esse indicador, que tem forte influência do dólar e está fora da realidade: “O mercado está do lado do inquilino. Fora locais específicos, não é hora de ficar com imóvel vazio”, afirmou.

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