Míriam Leitão: O petróleo como alvo

A indústria de petróleo e gás está sendo um dos primeiros alvos do governo Biden. O novo presidente americano anunciou ontem um pacote de medidas para combater as emissões de gases de efeito estufa.
Foto: DOD / Carlos M. Vazquez II
Foto: DOD / Carlos M. Vazquez II

A indústria de petróleo e gás está sendo um dos primeiros alvos do governo Biden. O novo presidente americano anunciou ontem um pacote de medidas para combater as emissões de gases de efeito estufa. Uma delas foi a suspensão de qualquer nova concessão em áreas federais. Ele já havia interrompido o oleoduto Keystone XL, que traria óleo cru do Canadá para as refinarias na costa americana do Golfo. Por uma série de ordens executivas Biden está desmontando a política de Donald Trump favorável ao petróleo. Em 2020, foram US$ 40 bilhões em subsídio. Isso terá profundos reflexos no mercado.

No Brasil a discussão é outra. O presidente Bolsonaro deu aval para a redução do imposto sobre óleo diesel para acalmar caminhoneiros que ameaçam greve. Isso depois de a Petrobras segurar os reajustes do produto, o que incentiva o uso de combustível fóssil. Para os caminhoneiros, a situação permanece sem alteração desde a última greve. As medidas de Biden colocam pressão sobre os preços do petróleo, porque a tendência será de redução da oferta.

Os movimentos de Biden afetam um setor sensível para a economia, mas são coerentes com a visão que ele tem defendido de que há quatro guerras a enfrentar: a pandemia, a crise econômica, a mudança climática e o racismo. No primeiro momento no Salão Oval, no dia mesmo da posse, voltou ao Acordo de Paris, o que significa perseguir metas de redução de emissões.

Uma de suas decisões é suspender as licenças leiloadas por Trump, dias antes do fim do governo, para exploração de petróleo na Reserva Nacional da Vida Selvagem do Alasca. A expectativa é que ele irá adiante ampliando as terras e águas protegidas. Por tudo o que fez nesses primeiros dias, pela escolha de John Kerry como enviado para as negociações sobre o tema, com a volta de Gina McCarthy, ex-chefe da Agência de Proteção Ambiental do governo Obama, está claro que a questão climática foi para o topo da agenda americana.

Líderes da indústria de petróleo já protestam. Dizem que a estratégia é arriscada. Segundo empresários do setor ouvidos pelo “Wall Street Journal”, a suspensão do oleoduto vai provocar o desemprego imediato de mil trabalhadores e dezenas de milhares podem ser demitidos. E dizem que suspender perfurações pode elevar as emissões porque se usaria carvão em vez de gás.

A nova secretária do Tesouro, Janet Yellen, disse no Senado que o pacote de quase US$ 2 trilhões de estímulo à economia vai, em parte, financiar a transição energética americana para maior uso de energia eólica, solar fotovoltaica, carros elétricos e desenvolvimento de baterias. Biden disse ontem que tudo isso criará milhões de empregos.

Nos EUA, a maior fonte de emissão é o uso de combustíveis fósseis, no Brasil, é o desmatamento. Mas aqui há também incentivos para o uso de fósseis. O carvão tem subsídio entre R$ 700 milhões e R$ 1 bi todo ano. Apuração de Alvaro Gribel, publicada no blog, mostra que a defasagem nos preços dos combustíveis está acima de 10%.

Há o problema imediato da pressão dos caminhoneiros aos quais o presidente Bolsonaro sempre cede. Mas há uma questão de médio prazo. O mundo fará esforços para a redução das emissões, e o Brasil, no atual governo, está totalmente alheio a essa agenda. Está fora do mundo.

Dilma distorceu o que eu escrevi

A ex-presidente Dilma Rousseff divulgou uma nota criticando minha coluna de domingo neste espaço. Ela pode discordar, claro, não pode é distorcer o que eu escrevi. E distorceu. O alvo da coluna era o presidente Bolsonaro e o ponto central é que ele deve responder a um processo de impeachment pelos crimes que já cometeu. Um dos meus argumentos é que, se ele não pagar por tudo o que fez, os outros processos de afastamento vão parecer injustos, tanto o dela quanto o do Collor.

Dilma interpretou como se eu estivesse querendo apagar o que escrevi quando ela enfrentou o processo no Congresso. Reafirmo tudo o que escrevi sobre ela e sobre aqueles fatos. Na própria coluna de domingo eu repeti que Dilma cometeu crime de responsabilidade fiscal e provocou o desmoronamento da economia. Por suas decisões o país enfrentou recessão, inflação, desemprego, elevação do déficit e da dívida. Não foi golpe o que aconteceu em 2016. Nunca achei que fosse, nem na época, nem agora.

Tanto na minha coluna quanto na nota da ex-presidente está escrito que os crimes de Jair Bolsonaro no governo têm provocado a morte de brasileiros. A ex-presidente e eu discordamos radicalmente sobre o passado, mas concordamos sobre o presente.

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