Míriam Leitão: Erros fiscais criam armadilha

Muitos economistas têm minimizado a alta da inflação, mas para economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, esse é um problema que precisará ser monitorado com atenção daqui para frente.
Foto: Agência USP
Foto: Agência USP

Por Alvaro Gribel (interino)

Muitos economistas têm minimizado a alta da inflação, mas para economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, esse é um problema que precisará ser monitorado com atenção daqui para frente. Mesquita estima que o IPCA continuará acelerando nos próximos meses, até 4,5% em maio do ano que vem, para só então começar a cair. O problema é que muita coisa pode dar errado até lá, especialmente na política fiscal. Uma nova disparada do dólar pode deixar o Banco Central pressionado para aumentar os juros em plena recuperação. “O ambiente se tornou mais delicado para a inflação do que era há alguns meses”, explicou.

A inflação vem subindo mesmo na recessão e, por mais que se diga que ela está concentrada nos alimentos, não é boa notícia. O governo sairá desta crise muito endividado, e isso tem provocado aumento na cotação do dólar. Mesmo que o repasse de preços para muitos produtos seja menor, pela ociosidade da economia, isso pode acabar batendo mais fortemente nos índices.

— Podemos ter depreciação sobre depreciação (do real) e aí, mesmo com ociosidade, tudo fica mais intenso. Se o dólar for para R$ 6 no final do ano, o BC pode ter que iniciar o movimento de alta dos juros no início de 2021 para atingir a meta de 3,75% em dezembro. Por ora, as expectativas de inflação continuam “ancoradas”. Mas tudo vai depender do fiscal — explicou.

Esse é mais um ingrediente na discussão do Renda Cidadã. O governo não sabe de onde cortar para viabilizar o programa e qualquer medida que aumente o déficit no ano que vem será mal recebida pelo mercado, com reflexo no câmbio. Acionar o orçamento de guerra para driblar o teto de gastos teria o mesmo efeito negativo, porque vai significar aumento de despesa, de qualquer forma. Mesquita acha que o Banco Central não hesitaria em elevar a Selic, em caso de piora das expectativas.

Sobre o ritmo da recuperação, o Itaú estima que o PIB deste ano cairá 4,5%, para crescer apenas 3,5% no ano que vem. Ele explica que três pontos dessa alta em 2021 já estão assegurados pelo chamado “carregamento estatístico”. Ou seja, o crescimento, de fato, será pequeno.

— Na prática, se a economia não crescer nada no ano que vem ela já garante um crescimento de 3% na média, por efeito estatístico. Então a alta de verdade será pequena, parecida com a que a gente já vinha tendo antes da pandemia — afirmou.

O país ainda está longe de uma recuperação plena na economia. E agora ganhou um complicador a mais, o risco de aumento da inflação e da taxa básica de juros.

Endividamento em alta

A dívida das famílias com o setor financeiro bateu recorde em julho. Segundo dados do Banco Central, ela chegou a 47,45% da renda anual, o maior percentual desde 2005, quando começou a série histórica. Parte da alta no mês foi provocada pelo financiamento imobiliário, que subiu de 27,27% para 27,63%. Durante a pandemia, muitos bancos adiaram o pagamento das prestações, que foram incorporadas ao saldo devedor. Essa tendência de alta do endividamento total, no entanto, já vem desde dezembro de 2017. Assim como o governo federal, as famílias estão com mais dívidas a pagar.

PIB e pandemia

A consultoria Oxford Economics tem cortado as projeções para o PIB mundial do ano que vem. Há uma combinação de fatores: aumento de casos de Covid, fim dos estímulos fiscais e crescimento mais forte no final deste ano, o que aumenta a base de comparação. “Nos últimos meses ficou claro que as medidas de isolamento continuarão necessárias, especialmente em países que não fazem testes e rastreamentos de forma efetiva.” Fica o alerta.

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