Míriam Leitão: A renovação da economia

Cinquenta milhões de hectares de pastagens produzem menos da metade do que poderiam produzir porque o solo perdeu qualidade. Isso é território equivalente a dois terços do Reino Unido.
Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

Cinquenta milhões de hectares de pastagens produzem menos da metade do que poderiam produzir porque o solo perdeu qualidade. Isso é território equivalente a dois terços do Reino Unido. Imagine que o país invista em tecnologias simples, como curva de nível? Isso elevaria em R$ 20 bilhões a capacidade de geração de renda da mesma área. A pecuária tem 28% de ineficiência, se ela fosse combatida, o país poderia produzir 10% a mais no mesmo espaço, isso seriam 20 milhões de cabeças de gado. Além disso, deixariam de ser derrubados 15 milhões de hectares de floresta.

Se a gente fizer contas assim chegará a bilhões ou trilhões de reais acrescidos ao PIB brasileiro. Foi isso que o WRI Brasil fez para calcular o quanto o país tem a ganhar se escolher uma nova forma de produzir na retomada da economia. O mundo inteiro está discutindo isso — é o chamado green new deal — e a conclusão mais inteligente é que adotando medidas para converter a economia para novos padrões de baixa emissão o país cresce mais e melhor. E gera mais empregos. O número final impressiona. O PIB pode crescer 38% a mais até 2030, no melhor cenário, o que significa R$ 2,8 trilhões.

— O Brasil tem 200 milhões de hectares de pastagem, 70% das pastagens brasileiras tem algum nível de degradação. Sem proteção básica do solo, a chuva leva todo o fertilizante e é preciso colocar mais. Em vez de recuperar esse solo já ocupado, o país avança sobre a floresta e desmata. De cada 10 hectares de pasto na Amazônia, sete foram de desmatamento dos últimos 35 anos — diz Rafael Barbieri, economista sênior do WRI.

Ou seja, a cada ano o país perde bilhões com a queda de produtividade das pastagens, além disso destrói floresta, que ao ser derrubada diminui o fluxo de água nos rios, onde hidrelétricas produzirão menos energia. É um círculo vicioso. O país perde de várias maneiras com essas opções. E se em cada área os novos investimentos fossem diferentes? Essa foi a pergunta básica no estudo que reuniu especialistas da organização, professores da UFRJ, como Roberto Schaeffer, da PUC-Rio, ex-ministros como Joaquim Levy, estudiosos do Banco Mundial. Parece impossível que o governo atual faça as escolhas certas. Por isso eu perguntei para Carolina Genin, diretora de Clima do WRI, por que lançar o estudo neste momento:

— O trabalho começou há um ano e meio e replica para o Brasil uma pergunta que tem sido feita no mundo: se a transição para a economia de baixa carbono é benéfica. A conclusão é que sim e há muitas evidências. A agricultura, infraestrutura e indústria estão preparadas. Em alguns casos, é apenas dar escala ao que já fazemos. Nosso público alvo é o setor corporativo e o setor financeiro. E é uma linha de base para conversa com o Congresso. Seria um erro fazer o estudo pensando apenas no governo federal. Queremos fomentar o debate. É uma discussão de país.

No Brasil, o governo está dividido por uma discussão de meados do século passado: se é o Estado ou o setor privado que deve tocar o investimento. Em torno disso digladiam-se os ministros. O que deveria estar em debate é o que se discute no mundo hoje. Por exemplo, o que eles chamam de “infraestrutura de qualidade”. Parece um conceito abstrato. Rafael Barbieri dá um exemplo para o tornar concreto. Belo Monte foi construída tendo como base o regime de chuvas e o curso hídrico do passado. Só que está chovendo menos e o fluxo dos rios será menor com a mudança climática. O país construiu uma usina gigante que ficará ociosa em grande parte do tempo.

— Ela foi obsoleta na sua concepção. Com menos fluxo de água, ela vai gerar menos, ter menos receita e demorar mais a se pagar. Hoje, considerar os efeitos climáticos ao projetar uma obra é gestão estratégica de risco — diz Rafael Barbieri.

No mundo atual, mais do que apenas crescer é preciso saber como crescer. A opção por uma economia de baixo carbono é naturalmente a escolha de tecnologias novas. Ônibus elétrico, em vez dos velhos, a diesel, tem inovação embutido e custos menores em várias áreas. Na saúde, por exemplo. O texto sustenta que a transição energética para tecnologias de baixa emissão não é uma questão de “se”, mas de “quando”. Uma das sugestões é usar o gás como combustível de transição, nos navios de cabotagem, por exemplo.

No longo estudo, há exemplos e números que levam a uma constatação: essa é a nova economia. Se não for por aí, o Brasil ficará no passado.

Privacy Preference Center