Merval Pereira: Despertar para a realidade

O ano que começou será conhecido como o do réveillon que não aconteceu com festas oficiais nem multidões nas ruas, especialmente no Rio de Janeiro, que já se tornou o ponto turístico internacional desse tipo de acontecimento. Mas o senso de urgência no combate à COVID-19 que marcou a posse dos prefeitos não evitou que festas clandestinas e demonstrações explícitas de irresponsabilidade acontecessem.
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O ano que começou será conhecido como o do réveillon que não aconteceu com festas oficiais nem multidões nas ruas, especialmente no Rio de Janeiro, que já se tornou o ponto turístico internacional desse tipo de acontecimento. Mas o senso de urgência no combate à COVID-19 que marcou a posse dos prefeitos não evitou que festas clandestinas e demonstrações explícitas de irresponsabilidade acontecessem.

No Rio e no litoral paulista, praias lotadas e bares repletos evidenciaram que muita gente ainda não despertou para a gravidade da situação em que nos encontramos, especialmente diante da perspectiva sombria de não sabermos quando teremos vacinação. Mais uma vez o próprio presidente Bolsonaro estimulou comportamentos contrários às normas de segurança sanitária.

Em férias na Praia Grande, litoral paulista, mais uma vez provocou uma aglomeração de entusiastas que, ao gritos de “mito”, cercaram-no quando se aproximou da praia nadando, vindo de um barco em que passeava.

Os prefeitos das principais cidades do país e, mesmo aqueles, como Eduardo Paes, do Rio, que não estão em oposição ao governo federal por absoluta impossibilidade financeira, marcaram posição oposta à do presidente Jair Bolsonaro no tratamento da pandemia.

Ao contrário do governo federal, que nunca colocou o combate à pandemia entre suas prioridades, os novos prefeitos, e outros, reeleitos, como o de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, que tomou posse virtualmente, colocaram suas cidades em alerta contra o novo coronavírus.

O prefeito reeleito no primeiro turno com mais de 60% dos votos ganhou dimensão nacional ao ser citado pelo presidente do PSD, Gilberto Kassab, como um nome a ser discutido para candidato à presidência da República no ano que vem. O mais provável, porém, é que Kalil venha a disputar o governo do seu estado, já que está em franca oposição ao governador do Novo Eduardo Zema, aliado a Bolsonaro na maneira de enfrentar a pandemia.

No primeiro minuto do primeiro dia do ano e de mandato, o novo governo do Rio anunciou, através de seu secretário da Fazenda, deputado Pedro Paulo, uma série de medidas administrativas para cortar custos e investigar ações do governo anterior de Marcelo Crivella. Sabendo que, além de medidas concretas, é preciso também “deixar de lado o baixo astral”, como citou no discurso de posse na letra do samba “Conselho”, de Adilson Bispo e Zé Roberto, o prefeito Eduardo Paes também divulgou um vídeo logo pela manhã no alto do Cristo Redentor, juntando símbolos do Rio como sinal de um novo tempo que se prenuncia, apesar da “herança perversa”, como se referiu aos restos a pagar e às dívidas que recebeu de Crivella.

A abertura de 343 novos leitos para pacientes do coronavírus, e a criação de um Centro de Operações de Emergências, com um comitê independente de especialistas que assessorará a Prefeitura são algumas das medidas já anunciadas. O combate à COVID-19 foi também destaque na posse do prefeito de São Paulo Bruno Covas, que anunciou que a cidade “está pronta para vacinar em massa”, numa referência à vacina do Instituto Butantan, com base na tecnologia chinesa da Sinovac, que tem sido motivo de disputa entre o presidente Bolsonaro e o governador paulista João Doria, de quem é aliado.

Covas atacou o negacionismo de Bolsonaro, sem cita-lo, afirmando que é uma atitude que está “com os dias contados”. Se referindo à necessidade de banir o “vírus do ódio”, Covas advertiu que a atividade política “não é para intolerantes nem lacradores”, em mais uma referência indireta a Bolsonaro e seus seguidores nas redes sociais. “As urnas deram o recado de moderação muito claro”, alertou.

Bolsonaro tem tido renovadas demonstrações de que seu jeito leviano de levar a presidência tem seus apoiadores, e não são apenas os radicais da extrema-direita. Caberá à oposição, que é a maioria, a tarefa de encontrar candidatos que possam levar a eleição presidencial ao segundo turno com chance de vencer.

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