Mauricio Huertas: Chegou a hora de soltar o Lula. Ou o Brasil prende todo político corrupto ou não prende ninguém, tá ok?

Sei que é uma tese polêmica e aparentemente até simplória, que vai gerar discordância, revolta, xingamento e mal-entendido. Ainda mais num ambiente tóxico e polarizado, cheio de ódio, preconceito e intolerância como esse que adentramos politicamente e não vemos saída fácil. Soltar o Lula?
Foto: Twitter/Bolsonaro
Foto: Twitter/Bolsonaro

Sei que é uma tese polêmica e aparentemente até simplória, que vai gerar discordância, revolta, xingamento e mal-entendido. Ainda mais num ambiente tóxico e polarizado, cheio de ódio, preconceito e intolerância como esse que adentramos politicamente e não vemos saída fácil. Soltar o Lula? Tá louco? Não, não estou, mas confesso que a boçalidade do meme que virou presidente, seus rebentos sem caráter e seus seguidores fanáticos virulentos me fazem voltar a ter alguma empatia pelo petista. A boa política faliu. É a minha opinião.

No Brasil de hoje, da ditadura das bolhas nas redes sociais, todos temos que estar automaticamente de um lado ou de outro. Vivemos a era do “idiota da aldeia”, ou da “legião de imbecis”, definidos com propriedade por Umberto Eco. Não existe meio termo, bom senso, diálogo, racionalidade. Para sobreviver sem ser massacrado, sem ter minha reputação execrada ou ser jogado num gueto virtual, preciso escolher minha bolha: sou de esquerda ou de direita? Sou lulista ou bolsonarista? Sou honesto ou corrupto? Sou cidadão de bem ou cúmplice de político mafioso? Mas será que é tão simples reduzir o mundo real a esse pensamento binário?

Que p**** é essa? Assuma logo que você aderiu ao #LulaLivre e quer encontrar argumentos para se justificar. Vira-casaca! Vendido! Ah, cala a boca, defensor de bandido! Vai pra Cuba, seu lixo esquerdista! Petralha! Comunista enrustido! Mas… Espera lá! Não, eu não acho que o Lula é inocente. Estão aí os episódios do tríplex do Guarujá e do sítio de Atibaia com fartos indícios de lavagem de dinheiro e de corrupção. São crimes passíveis de prisão. Fora o caixa 2, o aparelhamento do Estado, o loteamento do governo entre quadrilhas partidárias e a usurpação do poder. Portanto, Lula não é um injustiçado. Cadeia nele!

Uai, então por que tanto mimimi? Qual é a tua? Quanta contradição, hein, meu caro? Decida: Lula é inocente ou culpado? Um preso comum ou herói do povo brasileiro, como quer fazer colar a narrativa petista? Ou você quer dar uma de “isentão” e estar bem com todo mundo? Pensa que alguém é trouxa? Não percebe que sua opinião não agrada nem convence ninguém, de nenhum dos lados? Você consegue irritar ao mesmo tempo petistas e bolsonaristas, otário! (Isso! É mais ou menos por aí! Esse é um dos objetivos e dane-se a censura alheia!)

Tenho convicção de que Lula se beneficiou da passagem pela presidência para, no mínimo, cometer tráfico de influência. Isso é crime e pronto! Afinal, alguém duvida que ele se aproveitou da posição privilegiada e de suas conexões com pessoas influentes ou com algum grau de autoridade para obter vantagens ou benefícios para si próprio e para terceiros, geralmente em troca de favores ou pagamento? Isso é meio evidente, não é? Ou o que falta para nos convencer? Recibo assinado da propina? Transferência da posse dos imóveis em cartório? Não sejamos ingênuos.

Mas quantos outros políticos, dos mais diversos partidos, estão presos por esses mesmos crimes e contravenções? Diga aí os nomes. Difícil, né? O petista será o primeiro de muitos ou ele nos basta como bode expiatório? O maior pecado de Lula foi trair a confiança e a esperança da maioria do povo brasileiro ao copiar os velhos métodos dos políticos que prometeu combater. Ao contrário, acabou se associando e se igualando aos outros, com o PT, para se perpetuar no poder.

Lula, em seus 40 anos de vida pública, subiu e despencou no conceito popular com a mesma intensidade. Venceu todos os preconceitos que carregava como líder sindical, superou a resistência das elites, virou presidente da República, conseguiu se reeleger e fazer sua sucessora. Mas ao cair na vala comum dos maus políticos – logo ele, a quem não era dada essa regalia – viu a cisma, a hostilidade e o antipetismo voltarem com força redobrada. Lula tropeçou nas próprias pernas.

Então, de alguma forma estão certos tanto os que consideram a prisão justa quanto os que apontam perseguição política. Não que Lula seja inocente, mas é exceção entre os homens públicos presos, num país em que liminares de juízes do Supremo libertam quem lhes convém, que o crime organizado controla mecanismos institucionais da sociedade e que os assassinos de uma vereadora preta e lésbica seguem impunes porque o sistema prefere assim (Quem matou Marielle? Quem mata tanto preto, tanto gay e tanto pobre?).

Que republiqueta é essa que garante saidinha do dia das mães para Suzane Richthofen, liberdade provisória para feminicidas, que deixa soltos os devastadores de Mariana e Brumadinho, os piromaníacos do Ninho do Urubu, os laranjas de partidecos fictícios, os fabricantes de fake news que interferem no resultado das eleições, outros ladrões do erário e até “cidadãos de bem” que corrompem por uma multa, um atestado ou uma licença – e que não medem as consequências das suas infrações enquanto apontam o dedo sujo para a transgressão do vizinho?

O Brasil não deu certo. Ou passamos tudo a limpo, recomeçamos do zero, refazemos tudo com ética, correção, equidade e justiça, ou vamos nos afundar cada vez mais nesse lamaçal de arbitrariedade, desigualdade, ilegalidade, impunidade, polarização e desrespeito. Lula é um mau político? Errou? Claro, por isso está preso há quase um ano. Que seja punido! Mas cadê os outros? Ou prendemos todos os corruptos ou não prendemos ninguém!

A minha divergência com Lula se dá no campo partidário, político, ideológico, ético, até moral. Mas com esses Bolsonaros e seus clones, além das discordâncias políticas e ideológicas, tenho aversão no aspecto humano, existencial. Pelo amor de Deus, não é possível que essas figuras execráveis, asquerosas, repugnantes, representem a cara e a alma do novo Brasil que desejamos construir. Precisamos mostrar que somos melhores que isso aí, tá ok? Senão, f****!

* Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS/SP, líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do Blog do PPS e apresentador do #ProgramaDiferente

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