Livro de Fausto Mato Grosso resgata a história do PCB em Campo Grande (MS)

Lançamento, em conjunto com Instituto Histórico e Geográfico de MS, terá sessão de autógrafos com o autor, Fausto Mato Grosso. Obra traz artigos, discursos e informações sobre a atuação dele como vereador pelo PCB na década de 1980, logo após a redemocratização do país
Foto: Reprodução Google
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Lançamento, em conjunto com Instituto Histórico e Geográfico de MS, terá sessão de autógrafos com o autor, Fausto Mato Grosso. Obra traz artigos, discursos e informações sobre a atuação dele como vereador pelo PCB na década de 1980, logo após a redemocratização do país

Por Germano Martioniano

Documentos, artigos e histórias que contam a trajetória de Fausto Mato Grosso como vereador de Campo Grande durante o período de 1983-1988, frente às principais questões da época, como a transição da ditadura para a democracia, afirmação ideológica da esquerda, urbanização e outras, integram o livro Política, Esquerda e Democracia, com lançamento previsto para o próximo dia 1º de junho, às 19h, no auditório do IHGMS, na AvenidaCalógeras 3000, em Campo Grande (MS).

O lançamento, em conjunto com Instituto Histórico e Geográfico de MS, terá sessão de autógrafos com o autor, o próprio Fausto Matto Grosso, que é engenheiro civil, professor aposentado da UFMS e ex-militante do PCB. “Minhas principais intervenções na Câmara Municipal de Campo Grande, principalmente meus discursos, durante o mandato entre 1983 e 1988, foram reunidas nesse livro”, informa o ex-vereador, que classifica a obra mais como um documentário. “Pela natureza do meu mandato, esse material acabou se transformando no “diário oficial” do PCB, como tem sido caracterizado por alguns pesquisadores e jornalistas. Por isso tenho chamado esse livro de documentário”, completa Matto Grosso.

Fausto Mato Grosso conversou com a FAP e aprofundou alguns dos temas tratados no livro, fazendo paralelos com algumas questões atuais, como o desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida em São Paulo e o papel da esquerda na atual conjuntura política do país. “O mais próprio seria falar em esquerdas. Existe uma velha esquerda e uma nova esquerda em formação com as suas respectivas nuances”, enfatizou o autor.

Confira, a seguir, alguns trechos da entrevista com Fausto Mato Grosso:

FAP – O que motivou o senhor a escrever e porque define este livro, de sua época como vereador em Campo Grande (MS), como um documentário?
Fausto Mato Grosso – O PCB em Mato Grosso do Sul, apesar de ter sido um partido pequeno, exerceu grande influência na política estadual, fortalecendo a frente democrática contra a ditadura. Fomos o maior partido da esquerda até 1990, ou seja, até 10 anos após a fundação do PT. Pode-se dizer que quem quiser contar a história política estadual nesse período, tem que falar de nós. Atribuo a isso, o grande interesse, de pesquisadores, especialmente das universidades locais, sobre a nossa história. O que tem levado a que vários velhos militantes sejam constantemente procurados como fonte para entrevistas e depoimentos. Por essa razão, comecei a organizar informações sobre a atuação do PCB. Todo o material de vídeo das nossas campanhas foi entregue à guarda do Centro de Documentação da Universidade Federal da Grande Dourados. Meus artigos de jornais, desde 1984, foram organizados em um blog para acesso público. Minhas principais intervenções na Câmara Municipal de Campo Grande, principalmente meus discursos, durante o mandato entre 1983 e 1988, foram reunidas nesse livro. Pela natureza do meu mandato, esse material acabou se transformando no “diário oficial” do PCB, como tem sido caracterizado por alguns pesquisadores e jornalistas. Por isso tenho chamado esse livro de documentário.

Como o senhor avalia a situação atual das metrópoles brasileiras, tomando como ponto de partida o desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, em São Paulo?
O avanço da urbanização no País foi saudado como sinal de progresso. As cidades, afinal, são o lócus da economia mais moderna, de inovação, de cultura e conhecimento, de reunião de talentos e de capital humano. Por outro lado, a urbanização carrega consigo imensos desafios econômicos, sociais e ambientais, dos quais o nossas metrópoles não tem conseguido dar conta. A contradição entre as potencialidades de um grande aglomerado urbano e a amplitude dos problemas, tem se resolvido no sentido da perda da qualidade de vida da população. O inchaço das nossas cidades gerou uma pressão muito forte sobre a infraestrutura, gerando problemas de trânsito e habitação, de energia e abastecimento d´água, de bolsões de pobreza, de criminalidade e deficiências nos sistemas de ensino e saúde. As nossas cidades se transformaram em verdadeiras bombas-relógios. Sendo a urbanização uma tendência irreversível, temos que enfrentá-la com uma profunda reforma urbana, tendo como fundamento a exigência de que a terra urbana cumpra a sua função social, o que poderia ajudar a resolver os problemas habitacionais atuais. Essa reforma tem de ser combinada com política de incentivo à regionalização do desenvolvimento, que poderia gerar novas centralidades urbanas, organizadas em novas bases e já contando com as novas tecnologias urbanas das cidades inteligentes e humanas.

O livro também representa uma reflexão sobre a esquerda e a democracia, uma vez que o senhor era vereador pelo PCB logo após o fim da ditadura militar. Como foi fazer parte do Partido ainda na ilegalidade e depois atuar políticamente após a legalização em 1985?
Fui eleito vereador pela sigla do PMDB, onde atuávamos, e assumi a legenda do PCB imediatamente após a sua legalização em 1985. Fui vereador comunista durante a guerra fria e a ditadura e exerci a parte final do meu mandato ainda antes da vigência da Constituição de 1988, o que gerava um intensivo acompanhamento das forças de segurança e dos órgãos de informações. O exercício do mandato foi à combinação da afirmação ideológica, enquanto comunista, com a pauta democrata, afinal, não estávamos “infiltrados” no PMDB, considerávamos fazer parte dele, fomos seus construtores. O desafio era não nos deixar isolar, isso fazia mais difícil a repressão e a perseguição política. Lembro-me de um veterano dirigente do partido que, o tempo todo, nos lembrava: “temos que ser peixe n´água”, mais do que afirmar nossas diferenças, tínhamos que nos caracterizar como iguais. Isso nos beneficiava com certa proteção da sociedade.

Como o senhor avalia, hoje, a esquerda e a democracia brasileiras?
Temos que tratar o tema da esquerda com uma visão pluralista, o mais próprio seria falar em esquerdas. Existe uma velha esquerda e uma nova esquerda em formação com as suas respectivas nuances. As primeiras tendem a pensar o mundo novo, como criado pelo passado, deterministicamente. Fazem política com o olhar no retrovisor, guiando-se pela experiência de um mundo que já acabou. Por outro lado, têm aquelas que estão de olhos nas forças motrizes da revolução do conhecimento. Que tem em conta as relações sociais novas que estão surgindo da robótica avançada, da biotecnologia e da inteligência artificial. Buscam explorar a possibilidade um caminho novo, ainda desconhecido, e tem se desdobrado no diálogo com o mundo que está nascendo. Faz política olhando para a frente.  Outra questão que divide as esquerdas é a questão democrática. Embora no discurso todas se apresentem como favoráveis à democracia, umas têm a democracia como uma questão tática e outras emprestam um valor universal, estratégico, à democracia. A democracia, na minha visão, é meio e fim na construção do mundo novo que seja uma alternativa à barbárie. É importante que mantenhamos os valores que são caros aos socialistas: a equidade, a solidariedade, a justiça social e a paz, articulados com valores novos que já nos demanda nosso tempo de mudanças.

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