Henrique Brandão: Grupo Especial de 2020 se destaca pela qualidade dos desfiles no Sambódromo

Independente de qual escola vencer o desfile do Grupo Especial de 2020 - cada um com sua preferida, que nem sempre é a que o júri escolhe -, salta aos olhos a qualidade dos enredos apresentados e, consequentemente, dos sambas cantados na avenida.
Foto: Fernando Grilli/riotur
Foto: Fernando Grilli/riotur

Independente de qual escola vencer o desfile do Grupo Especial de 2020 – cada um com sua preferida, que nem sempre é a que o júri escolhe -, salta aos olhos a qualidade dos enredos apresentados e, consequentemente, dos sambas cantados na avenida.

Uma mudança significativa em relação ate poucos anos atrás , quando muitas sambas, por conta dos temas que deveriam descrever, eram meros sambas de “exaltação”, na pior acepção que o termo pode ter, com quase descrições burocráticas das sinopses negociadas com eventuais patrocinadores.

O que se viu e ouviu no Sambódromo neste carnaval foram enredos criativos e, uma boa parte, autorreferentes. Mangueira, Tuiuti, Ilha e Tijuca usaram as comunidades de origem para contar suas histórias. Outras, falaram de personalidades com forte identificação com as localidades de onde surgiram as escolas, como Joãozinho da Gomeia ( Grande Rio) e Elza Soares (Mocidade). O Salgueiro exaltou o primeiro palhaço negro do Brasil. Os indígenas que habitavam o Rio antes da chegada dos portugueses foram cantados pela Portela. As Ganhadeiras de Itapuã, negras de ganho que compravam suas alforrias em Salvador, foi tema da Viradouro.

A criatividade destes enredos se refletiu nos sambas, com uma safra de alto nível.

Enfim, mesmo lutando contra a má vontade do poder público – principalmente do prefeito-bispo que demoniza o carnaval – as escolas saíram de suas zonas de conforto e foram buscar em suas raízes a chave para renovarem seus desfiles. Há muito não via um carnaval tão bom na Sapucaí.

A renovação que está acontecendo nas escolas, com o surgimento de uma nova geração de competentes carnavalescos antenados aos anseios da sociedade, infelizmente não é acompanhado pela forma como acontece hoje o acesso ao Sambódromo. Se as escolas se voltaram para suas histórias, valorizando sua gente , o público que frequenta hoje a Passarela do Samba está longe dessa identificação. Ao contrário, ano a ano os espaços se elitizam, os preços se tornam mais caros, e, pasmem, os cada vez mais comuns mega-camarotes têm entre suas atrações shows de vários gêneros musicais e DJs internacionais, com espaço menor para o samba em seu território de excelência.

É por isso que muitos sambas excelentes, como o da Mangueira este ano, o mais cantado dentre todos nos ensaios do pré-carnaval, têm uma recepção “fria”, abaixo do que merecia o lindo hino mangueirense. Se verificarmos a origem social da plateia, não é surpreendente que muitos não tenham cantado com a devida intensidade que o samba merece.

Se as escolas estão sabendo mudar -porque disto depende a sua própria sobrevivência- é importante que percebam também que o aceso ao Sambódromo precisa mudar. Como é um espaço público, cabe não somente às escolas, mas também à sociedade, pressionar o pode público no sentido de democratizar o ingresso para os desfiles. O espetáculo, e a sociedade, só têm a ganhar.

Henrique Brandão, fundador do bloco Simpatia é quase amor.

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