Francisco Góes: É o ‘emprego, emprego, emprego’, diz Covas

Incerteza é sobre a capacidade dos municípios de sustentar suas receitas.
Foto: Patrícia Cruz
Foto: Patrícia Cruz

Incerteza é sobre a capacidade dos municípios de sustentar suas receitas

No discurso da vitória, no domingo à noite, o prefeito reeleito de São Paulo, Bruno Covas, deu ênfase à prioridade que dará, no segundo mandato, ao combate ao desemprego: “Nós temos que fazer da nossa gestão mantra na busca de emprego, emprego, emprego e busca de oportunidades”, afirmou. O foco, avisou, tem que estar sobretudo nos jovens da periferia, que são os que mais sofrem com a crise. Ontem, no dia seguinte à eleição, o tucano reconheceu as limitações que todo prefeito tem no manejo de políticas macroeconômicas, mas prometeu mais ações de inclusão e investimentos na economia criativa para estimular startups, cultura, esporte lazer e turismo.

A taxa de desemprego precisa mesmo ser uma das preocupações dos prefeitos que assumem os cargos a partir de 1º de janeiro, afinal as pessoas moram nas cidades, e costumam atribuir aos gestores municipais parte dos problemas que vivem no dia a dia. No terceiro trimestre, a taxa de desemprego medida pelo IBGE ficou em 14,6%, a mais alta da série histórica desde 2012. Até setembro, o país tinha 14,1 milhões de desempregados. Só no Estado de São Paulo, o mais populoso do Brasil, a taxa de desemprego ficou em 15,1% no terceiro trimestre.

Como disse Covas ontem, os prefeitos não têm ferramentas para mudar taxa de câmbio, controlar a inflação ou emitir moeda. Assim, dependem, em boa medida, da retomada da economia para garantir mais investimentos e geração de emprego e renda. O problema é que na situação atual, com a pandemia dando sinais de piora, o cenário é de incertezas. É voo quase cego considerando o efeito que eventual novo fechamento do comércio, por exemplo, poderia ter sobre as receitas municipais. E também porque as indicações são de que não haverá novo apoio do governo federal a Estados e municípios. No Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, a ajuda a Estados e municípios chegou a R$ 60,1 bilhões, além do diferimento de dívidas com a União de R$ 65 bilhões. Tudo leva a crer que a ajuda não vai se repetir em 2021.

“O clima é de total incerteza, o que vai acontecer ninguém sabe, é loteria”, diz François Bremaeker, gestor do Observatório de Informações Municipais. Se houver lockdown e restrições nas cidades, os municípios terão queda na arrecadação própria, sobretudo no recolhimento de ISS, que, em 2019, representou 48% da receita tributária das capitais. Haverá ainda redução nos recursos recebidos via transferências feitas por Estados, no caso do ICMS, e pela União, via Fundo de Participação dos Municípios (FPM), formado por receitas do IPI e do Imposto de Renda. Do total arrecadado, 22,5% ficam com os municípios. Na distribuição, aplica-se coeficiente que diz quanto cada um recebe.

A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) mostra que de janeiro a novembro houve queda de 7,34% na arrecadação do FPM sobre igual período de 2019. Nota técnica da entidade reconhece que a proximidade do fim do ano deixa os gestores municipais preocupados com o fechamento das contas: “Nesse ano atípico com pandemia da covid-19, essa preocupação é mais pertinente.”

A CNM conduz pesquisa sobre as condições financeiras das prefeituras para pagar o 13º salário, e a tendência da enquete é que o resultado não seja ruim, diz Eduardo Stranz, consultor da CNM. A instituição também vai fazer trabalho para saber quanto os prefeitos vão deixar de caixa em 31 de dezembro. Stranz estima que a queda na arrecadação do FPM, no acumulado do ano, deva ser de 5%. A recuperação deve ser puxada pelas vendas de Natal.

Ele diz que o fim do auxílio federal a Estados e municípios impõe, a partir de janeiro, desafio de emprego e renda aos prefeitos. “O município terá que ser um dos indutores da retomada. Esse será o desafio, junto com um quadro de queda da arrecadação, de pandemia e de fim de auxílio federal”, diz o consultor da CNM.

Stranz afirma que o poder municipal é ator importante na economia uma vez que costuma ser também o maior comprador. Na crise, o gestor municipal pode direcionar compras para a própria comunidade encomendando uniformes escolares, por exemplo, a fornecedores locais. Pode ainda fazer uma boa organização do território, com licitações para uso de locais por micro e pequenos empreendedores. O dono da carrocinha de cachorro-quente se cadastra na prefeitura, ganha alvará e pode se instalar na frente do estádio ou do fórum. O prefeito tem a opção de criar um fundo de aval, mesmo que pequeno, para que esse empreendedor compre os equipamentos para o negócio. São soluções simples que o poder público pode tomar para fomentar negócios no município. O economista Mauro Osório, especialista em temas regionais, acrescenta que uma forma de melhorar a gestão municipal é integrar o trabalho das secretarias. “É integrar as políticas sociais, de saúde e educação, ter um olhar interdisciplinar”, diz.

Parte das soluções para os municípios depende, porém, de medidas macroeconômicas que podem ser implementadas a partir das reformas tributária e administrativa. Jonathas Goulart, economista-chefe da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), entende que é preciso inserir os municípios e o ISS na reforma tributária e também aproveitar a oportunidade para rediscutir a distribuição do FPM “Hoje há má distribuição dos recursos do fundo”, diz. Ele prevê que em 2021 os pequenos municípios, cujos orçamentos dependem mais das transferências da União e de Estados, podem sofrer impacto menor com a crise. Mas os municípios maiores, que dependem mais da arrecadação de ISS, tendem a ficar em situação mais complicada.

Matheus Rosa, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV), diz que a preocupação para 2021 é a dependência dos municípios do ISS. É imposto ligado à prestação de serviços, segmento cuja recuperação é mais lenta do que a indústria e o varejo. Os serviços também são mais suscetíveis a restrições provocadas pela pandemia. “A grande incerteza é saber se municípios vão sustentar a arrecadação em 2021 e se isso será em nova onda de covid. “Um novo apoio federal [a Estados e municípios] não parece provável dada a preocupação do governo com teto de gastos”, diz Rosa. Ele fez estudo que avaliou a arrecadação de 26 capitais na pandemia. As seis com maior PIB (Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Manaus) apresentaram até agosto relativa estabilidade da receita tributária. Nenhuma teve perda de receita acima de 1% e algumas tiveram alta. É o que todos os prefeitos esperam para 2021, como Covas e seu mantra por geração de emprego e renda.

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