Fernando Exman: A dura vida da equipe econômica na Câmara

Seja qual for o futuro presidente, cenário será desafiador.
Foto: Marcos Corrêa/PR
Foto: Marcos Corrêa/PR

Seja qual for o futuro presidente, cenário será desafiador

Segue indefinida a disputa pela presidência da Câmara, corrida encabeçada pelo blocão do líder do PP, Arthur Lira (AL), nome preferido do Palácio do Planalto, e o grupo do presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ). Os próprios envolvidos no duelo alertam: quem se arriscar a cravar um prognóstico do resultado da eleição está mal informado ou deliberadamente mal-intencionado, querendo passar uma visão distorcida da realidade para influenciar o jogo. Já se pode projetar sem medo de errar, contudo, que o cenário será desafiador para a equipe econômica, seja qual for o vencedor.

Nas últimas semanas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem aproveitado eventos públicos para reiterar seu plano de voo. Enquanto tenta abrir espaço na agenda legislativa para a tramitação das reformas, trabalha para dar um impulso definitivo à votação de propostas que visam melhorar o ambiente de negócios, como o projeto que garante autonomia ao Banco Central, marcos regulatórios setoriais capazes de atrair investimentos e a nova Lei de Falências. Dia sim outro também, insiste em destravar as privatizações de Eletrobras, Correios, Porto de Santos e PPSA, a estatal que representa a União nos contratos de partilha do setor de petróleo – uma pauta louvável consagrada nas urnas em 2018, mas que até agora não emocionou os congressistas.

Para conseguir abrir espaço abaixo do teto de gastos, integrantes da equipe econômica reforçam a necessidade de se implementar a tal agenda “3D”, composta por iniciativas que desobrigam, desvinculam e desindexam o Orçamento. São ações que já estão sob a análise do senador Márcio Bittar (MDB-AC) e podem até prosperar no Senado, mas enfrentam resistências de autoridades do próprio Executivo, na oposição e entre parlamentares da base aliada na Câmara. Bolsonaro em pessoa já as descredenciou num passado não tão remoto. O presidente ameaçou dar um cartão vermelho para quem defendesse não assegurar a reposição da inflação para a Previdência e o salário mínimo, mas acabou guardando-o no bolso depois que o assunto deixou as manchetes dos jornais.

A ideia, no entanto, nunca foi abandonada totalmente. Na percepção de integrantes do Centrão, Bittar está disposto a enfrentar os debates mais impopulares e até mesmo incluir em seu relatório medidas que podem causar preocupações no mercado, como fez quando defendeu usar recursos dos precatórios para ajudar o governo a erguer um programa social que substitua o Bolsa Família.

O relator do Orçamento e da chamada PEC do Teto de Gastos também estaria disposto, de acordo com interlocutores, a defender a tributação de lucros e dividendos ou prever o fim de isenções tributárias. Em outras palavras, aceita resolver os problemas do governo tanto do lado das receitas quanto no das despesas, desde que tenha respaldo dos partidos aliados, do Ministério da Economia e, principalmente, do Planalto. Com razão, temeria ser abandonado no plenário. A articulação entre os líderes governistas tem um histórico de desencontros.

Isso vem ganhando corpo no Senado, porém na Câmara Guedes ainda não tem total apoio do Centrão para adotar medidas impopulares. Ele mesmo sabe disso, embora espere e torça para que o bloco abrace sua pauta, até como suposta estratégia para limpar a imagem de fisiologismo. Um influente parlamentar do grupo, no entanto, mostra que esse sonho não será fácil e já alerta que muitas das articulações mais fiscalistas conduzidas pelo ministro com Maia não reverberam entre os deputados governistas.

Inspirada pela frase de Bolsonaro segundo a qual sua administração não vai tirar nada do pobre para dar ao paupérrimo, a própria base aliada não quer aprovar qualquer iniciativa que acarrete perdas aos que estiverem da classe média para baixo na pirâmide sócio-econômica. “Em tempo algum”, sublinha um influente líder.

Não se trata, portanto, apenas de um problema de “timing” da política, como o ministro da Economia costuma falar, ou uma preocupação pontual dos parlamentares com as eleições municipais.

O problema de Guedes é que até mesmo o presidente Jair Bolsonaro resiste a algumas das suas ideias. Assim, um presidente da Câmara eleito com um empurrão do Planalto não iria assumir uma postura contrária à defendida pelo chefe do Poder Executivo, em favor do ministro. Ele certamente estaria disposto, inclusive, a tentar provar ao mercado que pode garantir estabilidade e previsibilidade aos agentes econômicos, mesmo sem atender todas as demandas da equipe econômica.

Do outro lado, o presidente Rodrigo Maia tem sido cada vez mais pressionado a decidir quem será seu candidato na disputa. Dependendo do nome escolhido, Guedes terá mais ou menos espaço para conversar, por exemplo, a respeito da criação de um novo imposto sobre transações financeiras ou de medidas que contrariam interesses setoriais e são consideradas fundamentais pela ala liberal do governo. Baleia Rossi (MDB-SP) já se mostrou aberto a tratar de uma nova CPMF, diferentemente de Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Ex-ministro do Desenvolvimento, Marcos Pereira (Republicanos-SP) é interlocutor frequente do setor produtivo e sensível às queixas do empresariado.

O grupo político de Maia também tem negociado com a oposição, que possui cerca de 130 votos na Câmara e pode influenciar a eleição – sobretudo se votar unida. Isso quer dizer que um candidato deste campo pode ter que acolher algumas das bandeiras da esquerda, o que tem gerado na equipe econômica o receio de que as privatizações podem continuar empacadas.

A campanha ganha corpo e tudo o que Bolsonaro não quer é ver Maia fazendo seu sucessor. A sinalização do presidente de que pode se filiar a algum partido em março, caso não consiga mesmo viabilizar a criação do Aliança pelo Brasil, deve entrar nessa equação e acabar desequilibrando o jogo. Isso pode favorecer um candidato governista, mas está claro que não é garantia de que Guedes terá uma vida mais fácil a partir de fevereiro.

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