Eduardo Rocha: Os Nove de 22 diz respeito a seres humanos especiais

Estamos diante de uma obra que narra a vida de um Partido que marcou a vida política nacional brasileira
Foto: João da costa Pimenta/Acervo/Estadão
Foto: João da costa Pimenta/Acervo/Estadão

Eduardo Rocha / Democracia e Novo Reformismo

Se for possível resumir numa frase o livro Os Nove de 22: o PCB na vida brasileira (1), do jornalista e historiador Ivan Alves Filho, esta frase é: multiplicidade integrada! Ao longo de suas páginas, o autor apresenta-nos (com didatismo, simplicidade, clareza, seriedade, racionalidade e paixão) um complexo de múltiplas dimensões que, de modo integrado, abrange o nascimento, o desenvolvimento e as transformações operadas na formação política vinda à luz no Brasil em 25 de março de 1922 até seus processos radicais de rupturas e vitais continuidades materializadas em seus IX (1991) e X Congressos (1992).

Ivan Alves Filho, com leveza e rigor, brinda-nos com os bastidores e a arena externa das batalhas sócio-políticas de múltiplos militantes que, ancorados na coluna vertebral do legado histórico de 1922, contribuíram para o avanço democrático-civilizatório e com o desenvolvimento do Brasil. Possibilita-nos conhecer detalhes biográfico-políticos dos que compuseram, em todos os tempos, as fileiras do PCB e que atuavam em praticamente todas as esferas da vida social brasileira: no campo, nas fábricas, no exército, na arte, na cultura, na música, na dramaturgia, no sindicalismo, no jornalismo, na ciência, na escola, na universidade, nos diversos movimentos sociais, nos parlamentos, enfim, em cada um dos diversificados setores, segmentos e classes que compõem a totalidade social brasileira.

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Como se fosse um telescópio Hubble a pesquisar e revelar uma pequena e significativa parte da imensidão do universo observado, o autor reafirma o que já era sobejamente conhecido como descobre e revela o que estava oculto nalguns pontos da história partidária – e o faz com a seriedade e integridade intelectual. Seu livro será sempre uma referência às gerações futuras, que, esperamos, saberão, em suas novas pesquisas, avaliar crítica e generosamente os comunistas que enfrentaram sábia e corajosamente os terríveis tempos de boa parte do século XX.

O título (Os Nove de 22) diz respeito a seres humanos especiais, a pessoas excepcionalmente diferenciadas, únicas, sublimes, revolucionárias e portadoras de um objetivo: a felicidade dos povos de todo planeta! Seu título refere-se aos nove delegados representativos eleitos democraticamente por 73 comunistas em todo o Brasil para fundar, no maior país da América Latina, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) – cujo nome inicial era Partido Comunista: Seção Brasileira da Internacional Comunista. O partido disposto a dar sustentação à revolução mundial do proletariado inaugurada na Rússia vitoriosamente bolchevique e a liderar no Brasil as transformações em benefício da maioria do povo brasileiro.

O autor ajuda ao leitor – seja ele familiarizado ou não com a história desta singularidade que é o PCB – a subir a escada do conhecimento e a visualizar através da trajetória de um Partido a história do Brasil, as lutas de seu povo, de suas heroínas e de seus heróis bem como compreender a relação deste Partido com os principais acontecimentos do mundo. Para quem lê-lo e apreciá-lo terá a absoluta certeza de que tem diante de si todas as notas musicais possíveis a serem aplicadas num samba brasileiro – não se trata, portanto, de um samba de uma nota só. Todas as notas musicais possíveis estão ali!

É notório o rigor informacional de Ivan Alves Filho ao pontuar os principais acontecimentos históricos bem como é emocionante como apresenta-nos uma galáxia biográfico-política de mulheres e homens que, nas mais diversas esferas da vida social brasileira, foram forjados pelo PCB e, ao destacarem-se em várias áreas de atuação, o inseriram nas páginas da história.

O autor não se limita a dar apenas um panorama da jornada histórica do PCB, mas também apresenta e levanta saudável e provocativamente polêmicas questões teóricas de dimensões filosóficas, políticas e econômicas complexas.  Cada uma delas mereceria um ensaio crítico à parte, tamanha a amplitude pluritemática dos problemas que levanta.

Deste modo, o livro é também seu testemunho pessoal sobre a trajetória nacional-internacional do Partido Comunista Brasileiro (o autor, vale assinalar, é também um dos dignos militantes que contribuiu para a construção do edifício histórico que temos diante de nós através de sua obra: o Partidão!). É também um relato de sua vida político-pessoal, descrita de forma muito modesta. Ivan nesse livro é como um marinheiro que narra a jornada de um navio, seus tripulantes e passageiros pelos oceanos revoltos e onde ele mesmo é um dos seus navegantes.

Por fim, estamos diante de uma obra que narra a vida de um Partido que marcou a vida política nacional brasileira em toda a sua amplitude. Um Partido que sempre foi corajoso e disciplinado em aplicar suas decisões (certas ou erradas). Um Partido corajoso também para fazer suas autocríticas sinceras – algo raro e até mesmo inexistente nos vários partidos brasileiros ao longo de suas histórias. Pode-se dizer que o PCB pode até ter errado no varejo, mas acertou no atacado! É assim um partido que acertou muito, mas também errou muito, mas errou lutando. E quando lutou acertando, fez avançar para frente a roda da história! E tudo começou há quase 100 anos, com os Nove de 22.

(1) Alves Filho, Ivan. Os Nove de 22: o PCB na vida brasileira / Ivan Alves Filho – Brasília: Fundação Astrojildo Pereira, 2021. 284 p.)

Guarulhos, 07 de dezembro de 2021.

*Eduardo Rocha, economista pela Universidade Mackenzie. Pós-graduado em Economia do Trabalho e Sindicalismo pela Unicamp.

Fonte: Democracia e Novo Reformismo
https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/12/eduardo-rocha-os-nove-de-22.html

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