Bernardo Mello Franco: Truques e mentiras por trás do decreto

Bolsonaro disse que o resultado do plebiscito foi desrespeitado. Se isso fosse verdade, a venda de armas estaria banida há 14 anos. O que a lei exigia até ontem era a autorização da PF.
Foto: Alan Santos/PR
Foto: Alan Santos/PR

Bolsonaro disse que o resultado do plebiscito foi desrespeitado. Se isso fosse verdade, a venda de armas estaria banida há 14 anos. O que a lei exigia até ontem era a autorização da PF

O ministro Onyx Lorenzoni disse que a posse de armas em casa representa tanto risco para crianças quanto a presença de um liquidificador na cozinha. O disparate coroou uma série de mentiras e truques usados para justificar o decreto de ontem.

O presidente Jair Bolsonaro acusou os últimos governos de desrespeitarem o resultado do plebiscito de 2005. Se isso fosse verdade, a venda de armas estaria banida há 14 anos. O comércio continuou na legalidade, como decidiram os eleitores. O que se fez foi impor regras para o registro, sob a supervisão da Polícia Federal.

O Planalto alega não ter chancelado um liberou-geral. No entanto, é exatamente disso que se trata. O decreto libera a posse de armas para quem mora em áreas rurais ou em áreas urbanas “localizadas em unidades federativas com índices anuais de mais de dez homicídios por cem mil habitantes”. Este requisito inclui todos os 26 estados e o Distrito Federal. Seria mais honesto não estabelecer critério algum.

O texto contém outras exigências inócuas. Quem morar com criança, adolescente ou pessoa com deficiência mental terá que providenciar um cofre ou “local seguro com tranca”. Ocorre que não haverá fiscalização. Bastará assinar um papel dizendo que a arma não ficará na gaveta ou embaixo do travesseiro.

Ao esvaziar o Estatuto do Desarmamento por decreto, Bolsonaro aplicou um drible no Congresso, a quem competia mudar a lei. Ele ainda se apressou para assinar a medida antes do dia 1º. A razão é simples: quando os novos deputados e senadores tomarem posse, o ato já será um fato consumado.

Na solenidade de ontem, o presidente fez questão de homenagear os amigos da “bancada da legítima defesa”. Referia-se aos deputados da bancada da bala, sempre às ordens da indústria armamentista.

Um dos campeões do lobby é o ministro Onyx, o do liquidificador. Em 2014, ele recebeu doações eleitorais da Companhia Brasileira de Cartuchos e da Forjas Taurus. O investimento das empresas não foi em vão. O ministro apresentou ao menos três projetos de lei para facilitar a venda de armas no país.

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