O Ministério do Desenvolvimento Regional e a Secretaria de Governo da Presidência; R$ 1,9 bilhão em recursos públicos para obras e equipamentos; a volta do imposto sindical, e até a recriação do antigo Ministério do Esporte
André Shalders, BBC News Brasil
Estas são algumas das promessas e benesses que estão sendo negociadas na disputa política mais importante de 2021: a eleição para as presidências da Câmara e do Senado, marcadas para o começo de fevereiro.
Para o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), é extremamente importante conseguir colocar aliados no comando das duas Casas do Legislativo. São os presidentes da Câmara e do Senado que pautam (ou não) os projetos de lei, as medidas provisórias e as propostas de emenda à Constituição (PECs) de interesse do Palácio do Planalto.
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Além disso, o presidente da Câmara é o responsável por aceitar ou engavetar os pedidos de impeachment contra o presidente da República.
Tanto na Câmara quanto no Senado a votação é individual e secreta. Só os próprios parlamentares sabem em quem eles votaram.
Até agora, a disputa mais concorrida é a da presidência da Câmara. São dois os candidatos principais: Arthur Lira (PP-AL) é o líder do bloco do “Centrão” e concorre com o apoio do Palácio do Planalto; já Baleia Rossi (MDB-SP), líder do MDB, disputa como representante do atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
No Senado, a situação é bem mais complexa: são vários os pré-candidatos, e nem o governo e nem a oposição fecharam apoio a um ou outro nome. Se apresentaram os senadores Eduardo Braga (MDB-AM); Fernando Bezerra (MDB-PE); Eduardo Gomes (MDB-TO); Simone Tebet (MDB-MS) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), entre outros.
Por Lira, Planalto negocia ministérios e verbas
Como candidato do Palácio do Planalto, Arthur Lira conta com uma vantagem significativa sobre Baleia Rossi: o acesso a verbas, cargos comissionados e até ministérios que são manejados pelo Poder Executivo, e que podem ser liberados para deputados em troca de apoio.
No começo de 2021, o Planalto planeja fazer uma pequena reforma ministerial — mudar a composição e os ocupantes de algumas das pastas, de forma a abrir espaço para aliados.
Em meados de dezembro, por exemplo, o presidente do Republicanos (antigo PRB), deputado Marcos Pereira (PRB-SP), anunciou apoio a Arthur Lira — mesmo sendo o atual vice-presidente da Câmara, ao lado de Rodrigo Maia. A mudança de lado de Pereira estaria condicionada a um ministério para o PRB, segundo alguns deputados. O presidente do Republicanos nega.
Também em meados de dezembro, o Planalto chegou a acenar ao PSL, partido pelo qual Bolsonaro se elegeu presidente em 2018, com um ministério — no caso, com a recriação do antigo Ministério do Esporte.
No entanto, a conversa não foi adiante. O presidente do partido, o deputado Luciano Bivar (PE), acabou fechando apoio a Baleia Rossi.
Procurado pela BBC News Brasil, Bivar preferiu não comentar. O partido reforçou, porém, que não aceitará qualquer cargo ou ministério no governo Bolsonaro.
Outra arma no arsenal do governo são as verbas públicas cuja destinação pode ser decidida pelos deputados — é um mecanismo diferente daquele das emendas parlamentares, cuja execução atualmente é obrigatória.
Geralmente, as verbas são usadas para obras de infraestrutura urbana ou para a compra de equipamentos nas localidades onde os políticos têm votos.
Em meados de dezembro, por exemplo, o governo patrocinou a aprovação de um Projeto de Lei do Congresso (o PLN nº 29 de 2020) liberando R$ 1,9 bilhão para ações de quatro ministérios: Agricultura e Pecuária, Desenvolvimento Regional, Educação e Turismo. Segundo deputados de direita e de esquerda ouvidos pela BBC News Brasil, o objetivo da liberação de recursos era conquistar apoios para a candidatura de Arthur Lira.
Já as emendas parlamentares “tradicionais”, inscritas no Orçamento da União, ainda não foram usadas para a barganha política — pelo menos, é o que mostram os dados disponíveis até o dia 29 de dezembro de 2020.
Até aquela data, o governo tinha empenhado, em dezembro, R$ 191,2 milhões para deputados dos partidos que apoiam Arthur Lira (214 deputados). Ou seja, cerca de R$ 893 mil para cada representante.
Enquanto isso, os integrantes das siglas que apoiam Baleia Rossi viram a liberação de R$ 344,3 milhões (para 281 deputados). Ou seja, uma média de R$ 1,2 milhão para as emendas de cada um deles.
Os dados são do sistema Siga Brasil, desenvolvido pelo Senado Federal, e foram sistematizados pela reportagem da BBC News Brasil.
Enquanto isso, o próprio Arthur Lira faz campanha junto aos deputados prometendo distribuir nacos de poder — inclusive na definição da pauta de votações. Se eleito, o alagoano promete fazer reuniões com os líderes partidários para definir o que a Câmara votará na semana seguinte. Estas reuniões já foram comuns na Câmara, no passado, mas foram abandonadas na gestão de Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Baleia Rossi: cargos na mesa e até abertura de CPIs
Sem acesso à máquina do Executivo, o adversário de Arthur Lira, Baleia Rossi (MDB-SP), precisa trabalhar com a expectativa de poder dentro da própria Casa — como a distribuição de cargos na Mesa Diretora e o compromisso de pautar certos temas caros aos partidos que o apoiam.
Na última semana de 2020, Rossi promoveu uma reunião (virtual) com os líderes dos partidos de oposição. Durante o encontro, ele prometeu às siglas de esquerda tomar atitudes para viabilizar o trabalho dos oposicionistas: instalar Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) quando necessário; colocar em votação os projetos de decreto legislativo (PDLs) que são usados para barrar iniciativas do Poder Executivo chefiado por Bolsonaro; e assegurar espaço para estes partidos na Mesa Diretora.
Além disso, Rossi também acenou aos partidos de oposição com a possibilidade de pautar projetos importantes para estes grupos. O PT, por exemplo, quer que a Câmara discuta a forma de financiamento das centrais sindicais — inclusive com a possível volta do imposto sindical. O partido deve decidir se apoiará Baleia Rossi em 4 de janeiro de 2021.
Há um aspecto no qual Lira se sobressai diante de Baleia Rossi: até o momento, o paulista possui mais partidos em seu bloco de apoio que o rival alagoano. Com isso, poderá indicar mais cargos na Mesa Diretora da Câmara — e estes cargos, por sua vez, podem ser usados para assegurar o apoio dos partidos.
No dia 1º de fevereiro, apenas o cargo de presidente da Câmara será eleito pelo voto: os demais cargos da Mesa serão indicados pelos blocos, conforme o tamanho de cada um. Se concretizar o apoio do PT e dos demais partidos de oposição, o bloco de Rossi somará 281 deputados, ante apenas 214 do grupo de Arthur Lira.
Com isso, o emedebista poderá indicar os principais cargos, como os de 1º vice-presidente (que substitui o chefe da Câmara em suas ausências) e o de 1º secretário (uma espécie de “prefeito” da Câmara, que controla o orçamento multimilionário da Casa).
Atualmente, estas duas posições são disputadas pelo PT (53 deputados) e pelo PSL (também com 53). Caso este último partido fique com a 1ª vice-presidência, o posto será ocupado por Luciano Bivar, segundo apurou a BBC News Brasil.