Antonio Carlos de Medeiros: A agenda errática do Brasil e o manifesto dos presidenciáveis

País não tem agenda e não tem norte. Qual vai ser então? Esse é o desafio.
Foto: Alan Santos/PR
Foto: Alan Santos/PR

País não tem agenda e não tem norte. Qual vai ser então? Esse é o desafio

Aprendemos com a História que um país não funciona sem agenda. Pois o Brasil, hoje, é um país sem uma agenda democraticamente pactuada. A nau, errática, segue em zigue-zague. Pode piorar. Acuado, o presidente Bolsonaro deverá ser tensionado também pela instalação da CPI da Covid-19.

As pressões estão crescendo. Somadas à sua crescente queda de popularidade nas pesquisas, elas já tiveram o efeito de fazê-lo assumir a agenda da compra e da aplicação de vacinas. A CPI, se instalada, vai acuar ainda mais o presidente. Ulysses Guimarães já dizia que a gente sabe como começa uma CPI, mas nunca saberemos como terminará.

De qualquer forma, agora a vacina está no topo da agenda. Neste contexto cada vez mais errático, a gestão federal do país cresce em ineficiência e ineficácia. É aí que a movimentação de Lula cria contraponto político e mostra a ausência da agenda. Não a agenda das eleições de 2022, mas agenda do aqui e do agora. Uma tempestade de crises.

O avanço de Lula para o diálogo com forças do centro democrático pressiona também os seis presidenciáveis que assinaram o manifesto em defesa da democracia – Amoêdo, Ciro, Eduardo Leite, Doria, Huck e Mandetta. O manifesto foi genérico. É pouco para a urgência da hora.

Com Lula na estrada, essas lideranças do Centro vão ter que antecipar decisões, contrariando os manuais de política, que dizem que os que agem fora do tempo queimam a largada. A largada já foi dada. Primeiro por Bolsonaro, desde sempre. Agora por Lula, que já procurou o PSB e já costeia o alambrado para comer pelas bordas o mingau do centro político.

Assim, os seis presidenciáveis precisam avançar em eixos de princípios, propostas e políticas públicas para o Brasil. O centro do eleitorado, que eles querem conquistar, não adere à agenda pré-iluminista de Bolsonaro, com seus ingredientes de um neoliberalismo autoritário. Este centro tem um pé atrás com o PT. Mas já começa a prestar atenção nos sinais de Lula de abandonar o isolamento do PT e buscar moderação e alianças. A moderação progressista de Joe Biden mexeu com a centro-esquerda brasileira.

A realidade é que o Brasil não tem agenda e não tem norte. Qual vai ser então? Esse é o desafio. Irão os líderes do centro democrático para a costura de uma agenda iluminista das liberdades, das reformas, do progresso e da tolerância? Vão revisitar o sempre atual liberalismo progressista de Karl Popper, diferente do liberalismo que reduz o destino da liberdade apenas à existência de livres mercados? Vão, ao mesmo tempo, revisitar, como Joe Biden, o liberalismo de John Maynard Keynes, que pensou que certa intervenção estatal na economia podia proteger o capitalismo, corrigindo os excessos do laissez-faire? O que vai ser?

Tudo somado, a agenda errática requer das forças democráticas ação consequente e despojada. E que elas se lembrem dos versos de Vandré: “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”.

*Antonio Carlos de Medeiros é pós-doutor em Ciência Política pela The London School of Economics and Political Science. Neste espaço, aos sábados, traz reflexões sobre a política e a economia e aponta os possíveis caminhos para avanços possíveis nessas áreas

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