Andrea Jubé: “A amizade supõe a confiança”

Três nomes revezam-se no entorno presidencial.
Foto: Carolina Antunes/PR
Foto: Carolina Antunes/PR

Três nomes revezam-se no entorno presidencial

A solução caseira para a reacomodação de quadros no Palácio do Planalto atesta que, embora o presidente Jair Bolsonaro tenha ampliado o leque de aliados ao se aproximar das cabeças coroadas do Centrão, o time de auxiliares em quem ele realmente confia é tão restrito que não lota um elevador na sede do Executivo federal.

Desde que se tornou presidente, um temor quase patológico de Bolsonaro é o de ser traído, ou abandonado, pelos aliados. A relação conflituosa, quiçá beligerante, com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e com o governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), dois veementes aliados na campanha eleitoral, a quem agora acusa de deslealdade, ilustra esse receio.

Por isso, desde o início do governo, o presidente escalou para postos estratégicos no palácio assessores de longa data, que a passagem dos anos de convivência promoveu ao patamar de amigos insuspeitos. “A amizade supõe a confiança”, escreveu André Maurois (1885-1967), biógrafo de Voltaire.

É nesse contexto que a recente reconfiguração dos espaços no entorno presidencial envolve três protagonistas, que convivem com o presidente, e seus filhos, há décadas: o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira, que se despede do cargo para tomar posse no Tribunal de Contas da União (TCU); Pedro César Nunes Sousa, que assumiu a Subchefia de Assuntos Jurídicos (SAJ) no lugar de Oliveira; e Célio Faria, que assumiu a chefia do gabinete presidencial, no lugar de Pedro.

Oliveira ascendeu a jato na República: a partir da vitória de Bolsonaro nas urnas, foi de assessor parlamentar a ministro do TCU em dois anos. Até quinta-feira, o major reformado da Polícia Militar do Distrito Federal acumulava o ministério com o posto de subchefe de Assuntos Jurídicos, umas das funções mais estratégicas ligadas à Presidência da República.

Quando foi alçado ao primeiro escalão, em junho de 2019, Oliveira manteve o cargo original, que exerceu desde o começo do governo. Para isso, a SAJ teve de ser deslocada da Casa Civil, sua pasta de origem, para a Secretaria-Geral.

O secretário especial de Assuntos Estratégicos, Flávio Rocha – outro quadro que Bolsonaro conhece dos tempos de parlamentar – é o mais cotado para assumir o ministério. Contudo, o posto-chave, de substituição mais delicada sempre foi a SAJ. Acabou sendo confiado a Pedro Nunes, ou simplesmente Pedro, como é conhecido internamente, por meio da nomeação publicada no “Diário Oficial” na quinta-feira.

Embora seja um cargo de segundo escalão, a SAJ trata-se, na verdade, de um posto que se equipara a um ministério, pela relevância do papel e influência junto ao presidente.

O titular da SAJ tem de ser da estrita confiança do presidente, porque terá trânsito livre no gabinete presidencial, dispensando-se, até mesmo, inclusão na agenda oficial. Despachará três, quatro vezes, ou mais por dia, com o chefe do Executivo para tratar da redação de projetos de lei, medidas provisórias, e discutir os vetos presidenciais.

O posto é tão estratégico que personalidades-chaves da República já o ocuparam. Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes e Dias Toffoli têm a mesma trajetória: foram titulares da SAJ. Em seguida, foram nomeados para o comando da Advocacia-Geral da União (AGU) – Gilmar no governo Fernando Henrique, Toffoli no governo Lula. Depois da AGU, foram indicados para compor a Corte Constitucional.

O desafio de Bolsonaro era encontrar um nome com formação jurídica que desfrutasse de sua máxima confiança. Tarefa inglória, porque o laço de Jorge Oliveira com os Bolsonaro é muito singular. É notório que o capitão Jorge Francisco, pai de Jorge Oliveira, foi assessor e chefe de gabinete de Bolsonaro por 29 anos. Oliveira também foi assessor de Bolsonaro, e nos últimos anos, era chefe de gabinete do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

O nome de Pedro Nunes surgiu naturalmente porque ele sucedeu ao capitão Jorge Francisco na chefia de gabinete de Bolsonaro na Câmara. Major reformado da Polícia Militar, assim como Oliveira, Pedro é advogado, formado em Direito na Universidade Cidade de São Paulo (Unicid).

Por sua vez, para assumir o lugar de Pedro, na chefia do gabinete presidencial, Bolsonaro promoveu Célio Faria, que também foi seu assessor legislativo. Ex-assessor parlamentar da Marinha, Célio é economista, e até então, coordenava a assessoria especial do presidente.

O reconhecimento pelos anos de lealdade, dedicação e discrição transpôs os limites dos postos palacianos, levando Bolsonaro a também nomear Pedro e Célio para assentos concorridos nos conselhos das estatais e empresas públicas.

Até março deste ano, Pedro ocupou uma cadeira no Conselho Fiscal do BNDESpar, braço do banco de fomento, com remuneração de R$ 8,1 mil pelas participações nas reuniões. O valor reforçava sua remuneração mensal como assessor palaciano.

Célio Faria, por sua vez, exerce um dos cargos mais concorridos entre os políticos: uma vaga no conselho de administração de Itaipu Binacional, com remuneração de R$ 14,9 mil, valor que incrementa o salário de auxiliar palaciano. A vaga no conselho de Itaipu é tão concorrida que Célio a divide com dois veteranos da política nacional: o ex-ministro Carlos Marum (MDB) e o ex-deputado José Aleluia (DEM).

Vale sublinhar que o núcleo militar palaciano também é formado por velhos conhecidos de Bolsonaro. Sabe-se que o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos – no momento sob fogo cruzado do ministro Ricardo Salles, com amparo da área ideológica – foi contemporâneo do presidente na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman).

Já o vice-almirante Flávio Rocha, que deverá suceder a Jorge Oliveira na Secretaria-Geral, frequentava o gabinete do deputado Bolsonaro quando era assessor parlamentar da Marinha – cargo que Célio Faria também exerceu.

No núcleo militar, um ponto fora da curva foi o ex-ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz, que Bolsonaro chamava de “irmão”. Mas não teve laço de sangue que o segurasse no cargo quando Bolsonaro cismou que a confiança já era.

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