Murillo de Aragão: Reforma ataca privilégios e as fontes da desigualdade

No final do mês passado, o Banco Mundial divulgou estudo detalhado da natureza dos gastos do governo e dos programas sociais do Brasil com soluções para escapar da desigualdade. Segundo a análise, o enorme déficit da Previdência é o grande empecilho ao ajuste nas contas públicas.
Foto: Divulgação/Banco Mundial
Foto: Divulgação/Banco Mundial

No final do mês passado, o Banco Mundial divulgou estudo detalhado da natureza dos gastos do governo e dos programas sociais do Brasil com soluções para escapar da desigualdade. Segundo a análise, o enorme déficit da Previdência é o grande empecilho ao ajuste nas contas públicas.

O ponto de partida de uma análise da Reforma da Previdência é o fato de o Brasil conviver com dois regimes de aposentadoria bastante diferentes. O primeiro é para trabalhadores do setor privado, o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), de responsabilidade do INSS, com trabalhadores da CLT.

O outro é para funcionários públicos, conhecido como Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), operado por fundos previdenciários, destinados a servidores públicos.

A consequência desse modelo é que, enquanto o regime utilizado pelo trabalhador privado tem 29 milhões de aposentados e déficit de quase R$ 150 bilhões, o sistema do setor público tem um buraco de R$ 77 bilhões para menos de 1 milhão de beneficiários.

As regras de contribuição e de recebimento de benefícios são distintas no caso de homens, mulheres, trabalhadores urbanos, trabalhadores rurais, professores, policiais, militares etc. Os números dizem para alguns que, se não fosse o pagamento de aposentadorias rurais, não haveria déficit no INSS.

Além disso, os privilégios acumulados pelos servidores públicos são expressivos. O mais importante deles é o valor do benefício: no caso do INSS, há um limite um pouco superior de R$ 5.000, enquanto no regime dos servidores públicos é possível detectar ganhos em torno de R$ 70 mil, conforme denúncias frequentes da mídia.

A origem da distorção está na política de remuneração dos funcionários públicos, que, ao longo do tempo, foi admitindo o acúmulo de vantagens e no passado recente permitia que a aposentadoria fosse igual ao salário percebido pelas categorias em atividade. Os vencimentos também guardam diferenças para quem trabalha no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário.

Se a dualidade do sistema é insustentável, também é possível identificar problemas no pagamento dos benefícios, em que existem diferentes modalidades. Há quem ganhe sem ter contribuído, quem ganhe por tempo de contribuição e aqueles que recebem por idade, mas hoje sem uma relação de equivalência equilibrada entre tais faixas.

É por isso que a reforma da Previdência visa mudar regras que concentram renda e aumentam a desigualdade social, segundo pregação do governo: “A reforma ataca justamente os principais fatores que geram a concentração de renda no gasto previdenciário”.

Um ponto fundamental da reforma é o estabelecimento da idade mínima de 65 anos. Isso incluirá os servidores públicos e uma regra de transição para evitar o prejuízo daqueles que estão mais próximos da hora de se aposentar.

Segundo texto do Ministério da Fazenda destinado a esclarecer aos que ainda têm dúvida sobre a equidade da PEC da reforma, quem se aposenta cedo no Brasil são os servidores públicos e os trabalhadores de altos salários do setor privado. “Eles têm empregos estáveis e conseguem comprovar 35 anos de contribuição (homem) ou 30 anos (mulheres)”.

Tal lógica não é difícil de compreender, mas os opositores da reforma procuram construir factoides para demonstrar o contrário. “Os pobres se aposentam mais velhos, mas os segmentos médios e altos se aposentam precocemente e com valor mais alto. A reforma não é um ataque ao trabalhador, e sim um ataque ao privilégio”, afirmou Paulo Tafner, pesquisador da Fipe, ao “Jornal Nacional”.

* Murillo de Aragão é cientista político

 

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