Day: outubro 21, 2021

Arlindo Fernandes aborda direitos políticos e sistema partidário brasileiro

Servidor público, consultor legislativo do Senado Federal, palestrante do curso Jornada Cidadã foi assessor da Assembleia Nacional Constituinte de 1988

João Rodrigues, da equipe da FAP

Na Aula 02 do curso Jornada Cidadã, ministrada na noite desta quarta-feira (21), foram analisados os direitos civis e sociais e o sistema partidário a partir da Constituição de 1988. Arlindo Fernandes, servidor público, consultor legislativo do Senado Federal, também analisou temas como voto facultativo, fundo partidário e o cenário atual da política brasileira.

O curso, destinado a pré-candidatos para as eleições do próximo ano e suas equipes, segue com inscrições abertas por meio da plataforma Somos Cidadania.
          A aula completa está disponível no Youtube da FAP.

Confira o vídeo com parte da aula do professor Arlindo Fernandes.

https://www.youtube.com/embed/HZWDDpLBbuY

Maria Cristina Fernandes: Para o legado da CPI ultrapassar 2022

Além do roteiro de 2022, CPI tem que proteger o país contra novas pandemias

Maria Cristina Fernandes / Valor Econômico

É preciso blindar o país contra novas pandemias Não é porque genocida rima com querida que o presidente Jair Bolsonaro cairá ou deixará de cair. Nem se a PEC 5 tivesse sido aprovada ontem na Câmara o procurador-geral da República deixaria de ser omisso na denúncia contra o presidente da República.

Depois do fracasso da frente ampla contra Bolsonaro, o relatório é a principal herança do Congresso para as eleições. Desperdiçá-la é perda de tempo e dinheiro. A CPI deixa um legado eleitoral relevante para 2022 tenha o relatório 10 ou 11 crimes.

De estimativas como a do sanitarista e fundador da Anvisa Gonzalo Vecina colhe-se que 400 mil mortes poderiam ter sido evitadas. O genocídio se sustenta na robustez da tragédia que poderia ter sido evitada, mas divide juristas de todos os matizes e não assegura aceitação da denúncia contra Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional.

A comissão ofereceu um roteiro que facilita a vida dos marqueteiros. Tá tudo ali, das imagens do presidente tirando a máscara de uma criança de colo aos relatos pungentes dos familiares das vítimas, deixadas para o fim, como em toda CPI, para fazer da comoção um motor da aprovação do relatório.

Uma pandemia com mais de 600 mil mortes, porém, é uma tragédia grande demais para que tenha 2022 como o limite de seu horizonte. Até porque novas pandemias virão. Das 206 páginas do relatório dedicadas às providências da CPI da Covid, 91 se destinam à proposição de projetos de lei e no apoio à celeridade daqueles que já tramitam no Congresso.

São 17 novas propostas e outras 11 em tramitação. Do combate à divulgação de notícias falsas à inclusão de ilegalidades do combate a pandemias no rol de crimes hediondos, passando pela pensão de crianças e adolescentes órfãos da covid-19 há de tudo lá. O que falta são propostas capazes de blindar a gestão de pandemias futuras contra insanidades.

Tome-se, por exemplo, o Plano Nacional de Imunizações. Criado em 1973, o PNI foi, em grande parte, o motor da reputação que o Brasil desfrutava em vacinas até o vírus do bolsonarismo. Foi a base institucional para a história de adesão dos brasileiros à vacinação que, para além dos números, se traduz no dito popular: de graça, até injeção na testa. Se o Estado oferece cuidados, não há por que rejeitá-los.

A evolução da curva da vacinação da covid-19 é uma demonstração disso. Depois que as vacinas passaram a ser ofertadas com planejamento adequado, a imunização só cresce, tendo levado o Brasil a passar os Estados Unidos no percentual de imunizados. O problema foi o que aconteceu antes disso.

O relatório é farto na descrição do atropelamento do PNI. O diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, contou que o programa poderia ter mantido seu protagonismo não fosse o boicote bolsonarista. O mundo começou a vacinar em 8 de dezembro de 2020 e aplicou 4 milhões de doses até o fim daquele mês.

O Brasil teria como ter aplicado 60 milhões de doses no ano passado e 100 milhões até maio de 2021, mas o governo postergou o prazo para setembro. O resultado é que em julho deste ano o Brasil, que tem 2,8% da população, somava 13,2% de todas as mortes do mundo.

Se o PNI tivesse um conselho gestor, com a presença não apenas de sanitaristas e imunologistas, mas de representantes dos Três Poderes, em condições de mobilizá-los, a insanidade não teria dado as cartas.

O Congresso votou os recursos de combate à pandemia e o Supremo garantiu a autonomia da federação, mas o Executivo atropelou o PNI. Um conselho com mandato seria capaz de dar-lhe status de programa de segurança nacional imune aos humores de plantão.

Gonzalo Vecina lembra que o programa tinha um conselho, majoritariamente de médicos, até Bolsonaro tomar posse e desmontá-lo junto com outros 31 “covis de petistas”. Fosse um conselho votado e aprovado pelo Congresso ele não poderia tê-lo feito de uma canetada.

Por mais que o PNI seja enraizado nas práticas sanitárias do país, foi a completa autonomia do Executivo nas deliberações que empoçou os 81 e-mails com a oferta de 70 milhões de doses da Pfizer durante seis meses. Um programa de imunização gerido por um colegiado não permitiria que um ministro da Saúde como Eduardo Pazuello voltasse atrás de um protocolo de intenções para a compra de 46 milhões de doses da Coronavac com desfaçatez que coube numa frase: “É simples assim: um manda e o outro obedece”.

Um conselho gestor do PIN aprovado pelo Congresso como legado desta CPI certamente neutralizaria o raio de ação de um filho de presidente, como o vereador Carlos Bolsonaro, que tomou parte nas discussões com a direção das grandes farmacêuticas.

O Brasil sabe vacinar e tem um povo que entende a importância da imunização. E é este binômio que poderia ter sido melhor protegido pelo relatório. Assim como o Sistema Único de Saúde. Se algo avançou no SUS ao longo da pandemia foi a centralização de dados para a elaboração de um prontuário eletrônico para todos os seus usuários, projeto que ainda está em curso sob o nome de ConecteSUS.

A CPI se desenrolou paralelamente à discussão do edital do leilão da tecnologia 5G. Mas não fez gestões para influenciar o edital de maneira a exigir que o vencedor forneça tecnologia capaz de integrar Ministério da Saúde, secretarias estaduais e municipais de Saúde e prontuários hospitalares.

Colocar o maior dos insanos na cadeia inibiria a volta dos que ainda não foram. Mas a CPI precisa ir além se pretende contribuir para a blindagem do país contra novos vírus, estejam eles no populismo da extrema-direita ou na microbiologia.

Foro privilegiado

A capitulação de Paulo Guedes ao teto furado guarda mais relação com a necessidade de o ministro manter o foro privilegiado do que com uma conversão das convicções do ministro. Está marcado para o dia 10 de novembro o depoimento de Guedes sobre sua offshore. Mais do que o afastamento de sua conta na Ilhas Virgens Britânicas, o que importa é se houve ou não movimentação da conta. É em torno deste ponto que se mobilizam os parlamentares.

Fonte: Valor Econômico
https://valor.globo.com/politica/coluna/para-o-legado-da-cpi-ultrapassar-2022.ghtml


William Waack: Brasil, o prisioneiro da crise fiscal de Bolsonaro

Bolsonaro e o Centrão estão brincando de tornar o País ingovernável

William Waack / O Estado de S. Paulo

Grandes sacudidas políticas no Brasil vieram quase sempre de crises fiscais, e Jair Bolsonaro está se empenhando em aprofundar a atual. As causas dessas crises são amplas e profundas, e no sentido mais geral resultam da apropriação de pedaços do Estado por grupos privados e corporações, que acomodam os mais variados interesses à custa dos cofres públicos.

No caso da atual crise, seu agravamento não vem só do fato de Bolsonaro arriscar as contas públicas apostando na reeleição. Fator relevante foi a entrega de fatias essenciais de poder, como o controle do Orçamento, aos grupos políticos amorfos e até antagônicos apelidados de Centrão. É o que explica em boa parte que os agentes econômicos tenham perdido a confiança na capacidade do Executivo de formular e articular políticas públicas abrangentes, começando pela economia.

A única agenda do Centrão é a defesa de seus interesses regionais ou corporativos (ou tudo junto). Por definição, trata-se de um conjunto de correntes políticas e interesses segmentados incapaz de articular uma pauta ampla. Como Bolsonaro não tem qualquer senso estratégico e se dedica fundamentalmente a agradar a plateias amestradas, não percebeu que o Centrão não é garantia alguma de que ele possa governar (basta lembrar as reformas que nunca andam).

Ao contrário, o poder entregue ao Centrão é a garantia de que o atual ocupante do Planalto não conseguirá governar nem mesmo na hipótese, hoje bastante remota, de que consiga a reeleição. O debate político brasileiro tornou-se completamente subordinado às questões fiscais mais urgentes. Portanto, não existe espaço, energia ou foco em plataformas para fugir da armadilha da renda média na qual o Brasil está preso há décadas.

É sério o risco de o Centrão (com Bolsonaro a tiracolo), sem rédeas, retroceder ao estágio pré-plano Real, o da irresponsabilidade declarada com as contas públicas. A necessidade de ajudar quase 30 milhões que caíram abaixo da linha da pobreza virou um Cavalo de Troia para a gastança que será paga mais adiante (em inflação e estagnação) por esses mesmos milhões de necessitados. Não há qualquer visão de futuro nas figuras de proa do Centrão além de garantir seus interesses políticos imediatos, aos quais no momento Bolsonaro serve perfeitamente.

Ficamos assim: uma geração e meia após a redemocratização continuamos tentando, sem grande sucesso, resolver pobreza, miséria e desigualdade, e procurando um jeito de ganhar eleições com votos garantidos por programas assistenciais. Quem sabe a crise fiscal (como aconteceu próximo ao Real) traga as mudanças que os salvadores da Pátria de plantão não têm. •

Fonte: O Estado de S, Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,o-prisioneiro-da-crise-fiscal,70003874981


Relatório da CPI expõe "estratégia macabra" de Bolsonaro na pandemia

Bolsonaro minimizou a pandemia, se opôs a medidas de distanciamento, espalhou paranoia antivacinas e estimulou infecções ao longo da crise

DW Brasil

Documento descreve que ações criminosas e omissões do governo federal contribuíram decisivamente para o desastre que tirou mais de 600 mil vidas, e que autoridades "assentiram com a morte de brasileiros" na pandemia.

Após quase seis meses de trabalho, a CPI da Pandemia foi palco nesta quarta-feira (20/10) da leitura do relatório final produzido pelo senador Renan Calheiros.

O texto pinta a atuação do governo Jair Bolsonaro durante a pandemia como negligente, incompetente, anticientífica, corrupta, macabra, caótica, criminosa e decisiva para que o Brasil produzisse o desastre sanitário que já ceifou oficialmente mais de 600 mil vidas. Segundo o relatório, o governo Bolsonaro "assentiu com a morte de brasileiras e brasileiros".

O texto descreve como o negacionismo do governo incluiu a formação de redes que promoveram fake news, paranoia antivacinas e incentivo ao desrespeito às normas de distanciamento.

Também descreve como as autoridades federais optaram por expor "deliberadamente a população a risco concreto de infecção em massa" ao recusarem a adoção de medidas de distanciamento – como máscaras – e abraçarem a promoção de um ineficaz e potencialmente perigoso "tratamento precoce". Tudo para buscar uma "imunidade de rebanho" por contaminação natural, mesmo diante das evidências de que milhares de brasileiros morreriam nesse processo.

Segundo Calheiros, essa "estratégia macabra" resultou até março de 2021 em pelo menos 120 mil mortes que poderiam ter sido evitadas.

O relatório ainda afirma que o Ministério da Saúde foi palco de "um esquema de corrupção nunca visto" e que "houve deliberado atraso na aquisição de imunizantes, em evidente descaso com a vida das pessoas".

O documento com 1.180 páginas lista mais de 60 pessoas, imputando mais de 20 crimes, incluindo crimes contra a humanidade, fraude em licitação, corrupção, incitação ao crime, prevaricação, emprego irregular de verbas públicas e falsificação de documentos.

Entre os acusados estão Jair Bolsonaro, três dos filhos do presidente, sete ministros e ex-ministros, deputados e empresários bolsonaristas acusados de espalhar fake news e promoverem desrespeito às normas sanitárias, militares que ocupavam postos no Ministério da Saúde, membros do "gabinete paralelo", figuras envolvidas em suspeitas de corrupção na compra de vacinas e médicos envolvidos em fraudes e uso antiético de medicamentos ineficazes contra a covid-19.

Antes da leitura do relatório, ocorreram algumas mudanças. O senador Calheiros atendeu a pedidos do presidente da comissão, Omar Aziz, e outros senadores para retirar acusações de genocídio indígena contra Bolsonaro e outros acusados. O nome do influente empreendedor religioso Silas Malafaia, que era originalmente acusado de "incitação ao crime", também foi retirado da lista de acusados.

Apesar da retirada de alguns crimes, Aziz afirmou durante a sessão que "o presidente [Bolsonaro] cometeu muitos crimes e vai pagar por eles".


previous arrow
next arrow
 
previous arrow
next arrow

Acusações contra Bolsonaro

O relatório descreve ações do presidente que agravaram a pandemia, incluindo seu entusiasmo pelo falso tratamento precoce – que resultou na queda de dois ministros da Saúde que resistiram em adotar os medicamentos ineficazes –, seu desprezo pelas vacinas, declarações minimizando a gravidade da doença e sabotagem de medidas de distanciamento. O relatório cita, por exemplo, episódios em que o presidente incentivou pessoas a não usarem máscaras.

"Isso nos leva a concluir que o presidente tinha interesse em encorajar os brasileiros a se expor ao contágio sem proteção, para que pudessem ser infectados pelo vírus sem maiores dificuldades ou barreiras", diz o texto.

"Jair Bolsonaro colaborou fortemente para a propagação da covid-19 em território brasileiro e, assim, mostrou-se o responsável principal pelos erros cometidos pelo governo federal durante a pandemia da covid-19."

Ao todo, o relatório pede o indiciamento de Bolsonaro por dez crimes:

- Epidemia com resultado morte

- Infração de medida sanitária preventiva

- Charlatanismo

- Incitação ao crime

- Falsificação de documento particular

- Emprego irregular de verbas públicas

- Prevaricação

- Crimes contra a humanidade, nas modalidades extermínio, perseguição e outros atos desumanos

- Violação de direito social

- Incompatibilidade com dignidade, honra e decoro do cargo.

Jair Bolsonaro, durante uma das inúmeras aglomerações que o presidente promoveu durante a pandemia


Coletiva de Imprensa do Ministério da Saúde. Foto: Alan Santos/PR
Lançamento de campanha de vacinação no Palácio do Planalto. Foto: PR
Ministro Eduardo Pazuello durante coletiva de imprensa. Foto: PR
Ministro Eduardo Pazuello durante coletiva de imprensa. Foto: PR
Pazuello durante cerimônia no Palácio do Planalto. Foto: PR
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Presidente Bolsonaro e o ministro Pazuello durante cerimônia no Palácio do Planalto. Foto: PR
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Ministro Eduardo Pazuello em cerimônia no Palácio do Planalto. Foto: PR
Pazuello participa de motociata com o presidente Jair Bolsonaro. Foto: Agência Brasil
previous arrow
next arrow
 
Coletiva de Imprensa do Ministério da Saúde. Foto: Alan Santos/PR
Lançamento de campanha de vacinação no Palácio do Planalto. Foto: PR
Ministro Eduardo Pazuello durante coletiva de imprensa. Foto: PR
Ministro Eduardo Pazuello durante coletiva de imprensa. Foto: PR
Pazuello durante cerimônia no Palácio do Planalto. Foto: PR
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Presidente Bolsonaro e o ministro Pazuello durante cerimônia no Palácio do Planalto. Foto: PR
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Pazuello durante depoimento à CPI da Covid no Senado. Foto: Agência Senado
Ministro Eduardo Pazuello em cerimônia no Palácio do Planalto. Foto: PR
Pazuello participa de motociata com o presidente Jair Bolsonaro. Foto: Agência Brasil
previous arrow
next arrow

Titulares da Saúde na mira

O relatório também pede o indiciamento do general Eduardo Pazuello, que ocupou a chefia do Ministério da Saúde entre maio de 2020 e março de 2021, e o atual titular da pasta, Marcelo Queiroga.

Durante o período em que exerceu o cargo, Pazuello se notabilizou por obedecer ordens de Bolsonaro para expandir o uso da ineficaz cloroquina, ignorou ofertas de vacinas de grandes laboratórios, não fez esforços para aumentar a testagem, tentou esconder os números de mortes e casos de covid-19 e foi acusado de não agir durante a crise do oxigênio em Manaus.

O relatório o acusa de epidemia com resultado morte, emprego irregular de verbas públicas, prevaricação e comunicação falsa de crime.

Já Queiroga é acusado no relatório de prevaricação e epidemia com resultado morte.

Titulares da Saúde, Marcelo Queiroga e Eduardo Pazuello executaram estratégia anticientífica de Bolsonaro

Veja a lista completa de pessoas acusadas no relatório final

Fake news

Parte do relatório se debruça sobre a rede de fake news bolsonarista que atuou durante a pandemia, minimizando a doença, promovendo tratamento ineficazes e paranoia antivacinas, além de mentir sobre as ações do governo federal e direcionar ataques contra Poderes e instituições, incluindo o Senado e o Supremo Tribunal Federal (STF).

O texto aponta que essa rede de fake news era dividida em cinco núcleos: o núcleo de comando (1), núcleo formulador (2), núcleo político (3), núcleo de produção e disseminação das fake news (4), e núcleo de financiamento (5).

Segundo o relatório, o núcleo de comando de fake news é formado por Jair Bolsonaro e três de seus filhos: o senador Flávio Bolsonaro, o deputado Eduardo Bolsonaro e o vereador Carlos Bolsonaro.

No núcleo formulador aparecem dois assessores presidenciais: o seguidor do ideólogo Olavo de Carvalho e ultradireitista Filipe Martins (Assuntos Internacionais) e Tercio Arnaud (assessor do Planalto).

Jair Bolsonaro e seu filho Flávio, acusado de fazer parte de núcleo de propagação de fake news

No núcleo político são citados aliados do governo que rotineiramente espalham fake news sobre a pandemia: os deputados Ricardo Barros, Osmar Terra, Carlos Jordy, Carla Zambelli e Bia Kicis, além do ex-ministro Ernesto Araújo e o diplomata Roberto Goidanich, o empresário Carlos "Wizard" Martins, o ministro Onyx Lorenzoni e o ex-deputado extremista Roberto Jefferson.

"Eles incentivaram as pessoas ao descumprimento das normas sanitárias impostas para conter a pandemia e adotaram condutas de incitação ao crime", diz o relatório.

Já o núcleo de produção e disseminação de fake news inclui veículos bolsonaristas, como os sites Terça Livre, Brasil Paralelo, Brasil Sem Medo (ligado a Olavo de Carvalho), entre outros. Os ativistas que fazem parte desse núcleo são figuras conhecidas de outros inquéritos por fake news, como Allan dos Santos e Oswaldo Eustáquio.

Por fim, no núcleo de financiamento aparecem os nomes dos empresários bolsonaristas Otávio Fakhoury e Luciano Hang.

"Na prática, ao estimular a população a se aglomerar, a não se vacinar, a desobedecer às regras de uso de máscara e de lockdown, pessoas influentes e agentes políticos contribuíram para o agravamento da pandemia", conclui o texto, que também aponta que o discurso antivacinas propagado por Jair Bolsonaro e outros propagadores de fake news "certamente causou a perda de inumeráveis e valiosas vidas durante a pandemia".

O empresário bolsonarista Luciano Hang, acusado de financiar rede de fake news e propagar mentiras sobre a cloroquina


previous arrow
next arrow
previous arrow
next arrow

Imunidade de rebanho, falso tratamento precoce e gabinete paralelo

O relatório também aborda o funcionamento de um "gabinete paralelo", uma estrutura obscura de aconselhamento para temas da pandemia à parte do Ministério da Saúde. O grupo, formado por entusiastas de tratamentos ineficazes, céticos das vacinas e leigos em saúde, é suspeito de assessorar Bolsonaro de maneira extraoficial na tomada de decisões sobre a pandemia, longe dos olhos do público e controle institucional.

Entre os membros desse gabinete, segundo o texto, atuaram figuras como o ex-assessor da Presidência Arthur Weintraub, a médica Nise Yamaguchi, o empresário bolsonarista Carlos "Wizard" Martins, o biólogo Paolo Zanotto, o deputado Osmar Terra e o médico Luciano Dias Azevedo.

De acordo com o relatório, o grupo fez "aconselhamento para que fosse atingida a imunidade de rebanho pela contaminação natural no Brasil". "Essa estratégia, atrelada à ideia de que o contágio natural induziria imunidade coletiva, visava exclusivamente à retomada das atividades econômicas", disse o senador Calheiros durante a leitura do relatório.

"A ideia era permitir que o novo coronavírus se propagasse livremente entre a nossa população", prossegue o texto. "[A] busca da imunidade de rebanho por infecção levou o presidente a resistir fortemente à implementação de medidas não farmacológicas, tais como o uso de máscara e o distanciamento social, bem como a não promover a celeridade necessária na aquisição de vacinas."

Dentro dessa estratégia, de acordo com o relatório, também estava o "tratamento precoce", o coquetel de drogas ineficazes, cujo principal ingrediente incluía a hidroxicloroquina, que começou a ser propagandeada por Bolsonaro como uma "cura" contra a covid-19 ainda em março de 2020.

O presidente continuou a defender o uso da cloroquina mesmo após estudos científicos demonstrarem sua ineficácia contra a doença. Seu governo chegou a lançar um aplicativo chamado TrateCov que recomendava altas doses de cloroquina até mesmo para bebês.

"As consequências dessa estratégia macabra foram mensuradas pela ciência. Se as medidas não farmacológicas tivessem sido aplicadas de forma sistemática no país, poderiam ter reduzido os níveis de transmissão da covid-19 em cerca de 40%, o que significa que 120 mil vidas poderiam ter sido salvas até o final de março de 2021", defendeu o senador.

Osmar Terra, um dos principais ideólogos do negacionismo da pandemia no governo Bolsonaro

Atrasos na compra de vacinas

No relatório, o senador Calheiros descreve como o governo Bolsonaro, com o auxílio de Pazuello e participação do ex-ministro Ernesto Araújo, tratou com descaso a aquisição de vacinas.

No início de 2021, ficou evidente que o governo não tinha vacinas suficientes após ignorar seguidas ofertas da Pfizer/BioNTech, que poderiam ter resultado no início da vacinação no país semanas antes. Além disso, o governo chegou a boicotar a Coronavac, a vacina promovida pelo governo de São Paulo, chefiado por João Doria, um desafeto do presidente. O governo ainda optou por apenas aderir à cobertura mínima de vacinas do consórcio internacional Covax Facility, quando poderia ter pedido cinco vezes mais vacinas.

"Os trabalhos da comissão revelaram que a aquisição de imunizantes não foi uma prioridade", diz o relatório, que conclui que "essa atuação negligente apenas reforça que se priorizou a cura via medicamentos, e não a prevenção pela imunização, e optou-se pela exposição da população ao vírus, para que fosse atingida mais rapidamente a imunidade de rebanho".

Corrupção

Enquanto ignorava ofertas de grandes laboratórios, o Ministério da Saúde abria as portas para empresas de fachada que faziam ofertas irreais de imunizantes. Segundo Calheiros, formou-se um "mercado interno de corrupção no Ministério da Saúde".

A maior parte das irregularidades ocorreu durante a gestão Pazuello. As denúncias envolvem empresas como a pequena Davati, que mesmo não possuindo vacinas, iniciou negociações para a venda de dezenas de milhões de imunizantes. Segundo um depoente, um membro do ministério exigiu propina para fechar o negócio.

Outra empresa envolvida em denúncias é a Precisa Medicamentos, que chegou a fechar um contrato envolvendo vacinas do laboratório indiano Covaxin. O negócio levantou suspeitas por envolver uma atravessadora e vacinas compradas por um preço bem superior a de outros imunizantes de laboratórios mais conceituados. Segundo um denunciante, houve pressão de altos membros da pasta para que o contrato fosse aprovado. Esse caso arrastou o deputado e líder do governo na Câmara, Ricardo Barros, que foi acusado de agir como lobista para a Precisa.

Um terceiro núcleo inclui suspeitas sobre a empresa VTCLog, responsável pelo armazenamento e distribuição de insumos de saúde. A empresa recebeu um aditivo em um contrato num valor 1.800% superior ao recomendado em parecer técnico da pasta. A CPI mostrou indícios de que um funcionário da empresa pagou boletos do ex-diretor do Ministério da Saúde Roberto Dias, justamente o responsável pela assinatura do aditivo.

Relatório também aponta série de "crimes contra a humanidade"cometidos pelo governo Bolsonaro. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Crimes contra a humanidade

O relatório ainda cita uma série de "crimes contra a humanidade" cometidos pelo governo Bolsonaro e figuras e empresas próximas ao governo.

Em janeiro de 2021, enquanto os hospitais de Manaus enfrentavam mais um colapso, o então ministro Pazuello viajou à capital do Amazonas para lançar um aplicativo que estimulava o consumo de cloroquina. Paralelamente, a pasta ignorou sinais de que a cidade estava sofrendo com desabastecimento de oxigênio nos hospitais. A omissão resultaria na morte de dezenas de pacientes por asfixia.

"O ponto mais crítico de toda essa situação é que, pelo que foi apurado, as autoridades federais poderiam ter agido para evitar essa tragédia, mas permaneceram inertes", aponta o relatório, que afirma que o governo Bolsonaro usou a cidade "como um laboratório humano" para testar a cloroquina, classificando a ação de crime contra a humanidade.

Outro caso de crime contra a humanidade envolve o estudo dos efeitos da substância proxalutamida conduzido no Amazonas pelo médico Flávio Adsuara Cadegiani, durante o qual 200 pessoas morreram. Segundo o senador Calheiros, o uso da proxalutamida também foi estimulado por Bolsonaro.

Um terceiro caso envolve as ações da empresa de planos de saúde Prevent Senior, que usou em larga escala em seus pacientes o "kit covid" promovido por Bolsonaro. Depoentes acusaram a empresa de até mesmo produzir estudos que eram manipulados para se adequar às falas de Bolsonaro sobre a suposta eficácia do fármaco e de ter realizado um "pacto" com o governo para usar os medicamentos ineficazes.

Cemitério em Manaus. Enquanto pacientes sofriam com falta de oxigênio, governo transformou cidade em "laboratório humano" para testar cloroquina

Próximo passos

A votação do relatório pela CPI está prevista para o dia 26 de outubro.

Uma CPI não tem poder para denunciar formalmente e nem punir. Após a votação, o relatório será encaminhado aos órgãos de investigação.

Dependendo da pessoa e seu cargo, o pedido será dirigido a diferentes órgãos. No caso de detentores de foro privilegiado, a Procuradoria-Geral da República (PGR) será encarregada de analisar os pedidos e decidir se há base para a abertura de inquéritos.

Não há muitas ilusões de que o procurador-geral, Augusto Aras, dará um prosseguimento efetivo aos pedidos. Aras já demonstrou seguidas vezes que não tem intenção de incomodar Bolsonaro juridicamente e já deixou de agir em episódios graves, como as ofensivas do presidente contra outros Poderes.

O procurador-geral da República, Augusto Aras. Há poucas ilusões de que ele vá agir contra Bolsonaro

Aras terá 30 dias para dar um encaminhamento ao relatório da CPI. Se o procurador-geral decidir arquivar o texto ou não enviar as denúncias ao Supremo, membros da CPI cogitam acionar os ministros do tribunal com o auxílio de entidades de direito privado, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

No caso dos crimes contra a humanidade, a CPI também pode remeter as denúncias ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia.

Ao final da leitura do relatório, o senador Calheiros afirmou que os trabalhos da comissão silenciaram "um coro demoníaco, vindo de uma catedral da morte sediada pelo governo federal, que gerou uma necrópole aterradora, marcada pelo desprezo à vida, o escárnio com a dor das mais de 600 mil famílias, a insensibilidade e a indiferença".

Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/relat%C3%B3rio-da-cpi-exp%C3%B5e-estrat%C3%A9gia-macabra-de-bolsonaro-na-pandemia/a-59566825


CPI da Covid: o que pode acontecer com Bolsonaro após a divulgação do relatório

Caso o relatório seja aprovado pela maioria da comissão na próxima semana, essas acusações contra o presidente serão analisadas em três órgãos

  • Mariana Schreiber / BBC News Brasil

O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, apresentado nesta quarta-feira (20/10) pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), recomenda que o presidente Jair Bolsonaro seja investigado e, eventualmente, responsabilizado em três frentes devido à gestão do seu governo na pandemia de coronavírus: por crimes comuns, por crimes de responsabilidade e por crimes contra a humanidade.

As suspeitas de crime comum serão encaminhadas à Procuradoria-Geral da República (PGR), que avaliará uma possível denúncia criminal contra Bolsonaro. Já as de crime de responsabilidade vão para análise da Câmara dos Deputados, para possível abertura de processo de impeachment. Por fim, as acusações de crimes contra a humanidade serão enviadas ao Tribunal Penal Internacional (TPI), onde o presidente poderia sofrer um processo.

No entanto, juristas ouvidos pela BBC News Brasil consideram que os três caminhos oferecem obstáculos hoje para que o presidente de fato venha a ser punido por possíveis crimes durante a pandemia de coronavírus, doença que já matou mais de 600 mil pessoas no Brasil desde março de 2020.

Leia também

Durante viagem ao Ceará, enquanto Calheiros lia seu relatório na CPI, Bolsonaro negou qualquer responsabilidade nas mortes.

"Como seria bom se aquela CPI tivesse fazendo algo de produtivo para nosso Brasil. Tomaram tempo de nosso ministro da Saúde, de servidores, de pessoas humildes e de empresários", criticou o presidente.

"Nada produziram, a não ser o ódio e o rancor entre alguns de nós. Mas sabemos que não temos culpa de absolutamente nada, fizemos a coisa certa desde o primeiro momento", disse ainda.

Entenda a seguir o que pode acontecer concretamente contra o presidente, caso o relatório seja aprovado pela maioria da CPI, nos três tipos de crimes que Bolsonaro é citado no texto de Calheiros.

1) Acusações de crimes de responsabilidade

Calheiros ressalta em seu relatório que, entre os crimes de responsabilidade previstos na legislação brasileira, está o ato de atentar contra o exercício dos direitos sociais e contra a probidade na administração.

Além disso, ele destaca que o direito à saúde é previsto como um dos direitos sociais no artigo 6º da Constituição, enquanto o artigo 196 estabelece que "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

Relatório de Renan Calheiros ainda precisa ser aprovado por maioria da CPI; votação ocorre na próxima semana. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Na avaliação de Calheiros, porém, a investigação da CPI mostrou que a gestão de Bolsonaro agiu em sentido contrário: ao invés de proteger a vida dos brasileiros da covid-19, o presidente teria contribuído para o agravamento da pandemia ao demorar a comprar vacinas, incentivar o uso de medicamentos sem comprovação científica, promover aglomerações, entre outras posturas.

"A minimização constante da gravidade da covid-19, a criação de mecanismos ineficazes de controle e tratamento da doença, com ênfase em protocolo de tratamento precoce sem o aval das autoridades sanitárias, o déficit de coordenação política, a falta de campanhas educativas sobre a importância de medidas não farmacológicas, o comportamento pessoal contra essas medidas, e, por fim, a omissão e o atraso na aquisição de vacinas e a contratação de cobertura populacional baixa do consórcio da OMS foram algumas das condutas do Chefe do Poder Executivo Federal que incontestavelmente atentaram contra a saúde pública e a probidade administrativa", diz trecho do relatório.

Apesar das duras acusações do relator, porém, hoje parece pouco provável que elas gerem abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro. O único que pode iniciar esse procedimento é o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que atualmente mantém boa relação com presidente.

E, a partir dessa aliança com Lira, o Palácio do Planalto construiu uma base de apoio entre os deputados do chamado Centrão (siglas de centro-direita de comportamento mais fisiológico), sustentada pela distribuição de cargos para indicados desses parlamentares e pelo envio de verbas federais para investimentos em seus redutos eleitorais. Com isso, hoje o presidente parece reunir o mínimo de 172 votos na Câmara necessários para barrar a aprovação de um processo de impeachment.

Outro elemento que reduz as chances desse processo ser iniciado é o fato de os protestos de rua realizados ao longo desse ano pedindo a cassação do presidente não terem reunidos um público tão grande quantos os atos que pressionaram pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) em 2016.

Já as pesquisas de opinião têm indicado que o governo Bolsonaro é reprovado pela maioria da população, mas ainda é bem avaliado por cerca de um terço dos brasileiros — patamar de aprovação superior ao que Dilma tinha quando foi cassada.

2) Acusações de crimes comuns

Para Calheiros, as condutas de Bolsonaro também podem ser enquadradas em sete crimes comuns, previstos no Código Penal.

São eles: epidemia com resultado de morte (por suspeita de propagar o vírus); infração de medida sanitária preventiva (por realizar aglomerações e não usar máscara); charlatanismo (devido ao incentivo de uso de medicamentos sem eficácia), incitação ao crime (por incentivar aglomeração e o não uso de máscara); falsificação de documento particular (por ter apresentado uma falsificação como sendo um documento oficial do Tribunal de Contas da União que provaria haver um excesso na contabilização de mortes por covid-19); emprego irregular de verbas públicas (por uso de recursos públicos na compra de medicamentos ineficazes); e prevaricação (por supostamente não ter mandado investigar denúncias de corrupção na compra de vacinas).

Caso o relatório seja aprovado, os elementos que baseiam essas acusações serão encaminhadas à PGR, pois o procurador-geral da República, Augusto Aras, é a única autoridade que pode apresentar uma denúncia criminal contra o presidente no Supremo Tribunal Federal (STF).

Aras é visto como aliado de Bolsonaro e hoje parece improvável que o denuncie, já que a PGR tem arquivado diversas queixas-crimes que já foram apresentadas solicitando a investigação criminal de Bolsonaro por sua conduta na pandemia.

A PGR, por exemplo, já arquivou pedido de investigação devido ao não uso de máscara por entender que isso configura infração administrativa, sujeita a multa, e não um crime.

O órgão também recusou pedido de investigação por causa das aglomerações provocadas pelo presidente. Segundo a PGR, Bolsonaro só poderia ser processado por disseminar coronavírus se estivesse contaminado com a doença e contrariasse ordem médica para se isolar.

Por outra lado, a PGR já abriu inquérito para investigar se Bolsonaro prevaricou ao não tomar providências após ser informado pelo deputado Luiz Miranda (DEM-DF) de supostas ilegalidades no contrato para compra da vacina indiana Covaxin. A investigação está em andamento.

Quanto a suspeitas de crimes pelo incentivo de Bolsonaro ao chamado "tratamento precoce" (uso de medicamentos sem eficácia contra covid-19), Aras informou ao STF em junho que havia iniciado uma apuração preliminar para avaliar a abertura de investigação. Críticos de Aras, porém, o acusam de usar esse tipo de procedimento para responder a pressões para investigar Bolsonaro sem de fato adotar medidas concretas contra o presidente.

Para o criminalista Pierpaolo Bottini, professor da Universidade de São Paulo (USP), é difícil cravar que Aras não dará qualquer encaminhamento as acusações do relatório da CPI.

"Não é só uma avaliação política, tem uma avaliação jurídica que ele terá que fazer. Ele vai ter que motivar (justificar juridicamente) seja qual for a decisão dele. Se tiver muito subsídio (sustentando as acusações), também é difícil ele deixar de dar qualquer encaminhamento", acredita.

Segundo Bottini, há um outro caminho jurídico para Bolsonaro ser denunciado no STF. Em caso de omissão da PGR, ou seja, se o órgão demorar para dar alguma resposta ao relatório da CPI, as próprias vítimas da pandemia poderiam processar o presidente por meio de uma ação penal privada subsidiária da pública.

A Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico) disse à BBC News Brasil que de fato analisa essa possibilidade. A organização apresentou em junho à PGR um pedido de investigação contra Bolsonaro, mas a análise desse pedido tem transcorrido em sigilo e a própria Avico enfrenta dificuldades para obter informações sobre seu andamento.

Eventual apresentação de uma ação contra Bolsonaro pelas vítimas da pandemia seria algo inédito. Segundo Bottini, provavelmente o STF faria uma primeira avaliação de admissibilidade (decidir se a ação está dentro dos requisitos jurídicos necessários) e depois encaminharia a denúncia para análise da Câmara dos Deputados.

O professor ressalta que a Constituição só permite que o Presidente da República seja processado após aval de 342 deputados (mesmo número necessário para abertura de um processo de impeachment).

Mulheres protestam contra Bolsonaro. Foto: EPA/MARTIAL TREZZINI

3) Acusações de crimes contra a humanidade

Calheiros também defende em seu relatório que Bolsonaro seja investigado no Tribunal Penal Internacional (TPI), Corte sediada em Haia, na Holanda, que julga graves violações de direitos humanos, como genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra.

No entanto, são poucas as denúncias recebidas pelo Tribunal que de fato geram investigações - e, quando isso ocorre, os casos se alongam por muitos anos, explicou à BBC News Brasil o juiz criminal e professor da USP Marcos Zilli, estudioso do funcionamento do Tribunal Penal Internacional.

Em tese, diz ele, o TPI pode condenar criminosos a penas de 30 anos de prisão e até a prisão perpétua, mas essas punições máximas nunca foram aplicadas pela Corte.

A intenção inicial de Calheiros era acusar o presidente de crime de genocídio contra populações indígenas, mas essa ideia foi abandonada devido à oposição de outros membros da CPI. Com isso, a proposta do relator é enviar ao TPI duas acusações de crimes contra a humanidade por parte do presidente.

Esses crimes estão previstos no Tratado de Roma, incorporado ao direito brasileiro desde setembro de 2002.

Uma das acusações propostas por Calheiros sustenta que Bolsonaro cometeu crime contra a humanidade a praticar "ato desumano que afete gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental". Isso teria ocorrido, segundo o senador, quando vidas humanas foram usadas como "cobaias" em estudos fraudulentos para aplicação de tratamentos sem eficácia contra covid-19.

Ele cita, por exemplo, a promoção do "tratamento precoce" pelo Ministério da Saúde durante a crise de falta de oxigênio em Manaus, no início de 2021. Outro argumento usado pelo senador foi o uso em massa de hidroxicloroquina pelo plano de saúde Prevent Senior. Resultados de um suposta pesquisa da empresa atestando a eficácia do remédio contra covid foram divulgados por Bolsonaro - no entanto, o estudo não havia sido autorizado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e ex-médicos da Prevent Senior acusaram o plano de fraudar os resultados.

A outra acusação é de crime contra a humanidade devido à postura do governo Bolsonaro em relação aos povos indígenas. O relatório destaca a decisão do STF de determinar em julho de 2020 a adoção de um plano emergencial pelo governo de apoio a essas populações durante a pandemia "diante das muitas falhas na política de enfrentamento à pandemia junto aos povos indígenas e da preocupação com a rápida interiorização da doença, que prenunciavam um desastre".

Ainda segundo o parecer de Calheiros, "esta CPI identifica o Presidente da República Jair Messias Bolsonaro como o responsável máximo por atos e omissões intencionais que submeteram os indígenas a condições de vida, tais como a privação do acesso a alimentos ou medicamentos, com vista a causar a destruição dessa parte da população, que configuram atos de extermínio, além de privação intencional e grave de direitos fundamentais em violação do direito internacional, por motivos relacionados com a identidade do grupo ou da coletividade em causa, que configura atos de perseguição".

O relatório final da CPI da covid foi lido no Senado nesta quarta-feira. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Segundo o professor Marcos Zilli, essas acusações, caso sejam realmente apresentadas pela CPI ao TPI, passarão por um longo processo de análise e não necessariamente vão gerar investigações internacionais contra o presidente brasileiro.

Todas as representações criminais feitas ao TPI são analisadas pela Procuradoria da Corte, órgão responsável por realizar investigações de forma independente. Um filtro inicial da procuradoria descarta casos em que os crimes denunciados claramente não são de competência do Tribunal.

Se a representação passar dessa etapa, ela é submetida a um exame preliminar, em que a Procuradoria avalia a presença dos elementos necessários à instauração de uma investigação formal. Nesse momento, é analisado, por exemplo, a gravidade dos crimes apontados na representação e se há omissão da Justiça nacional em apurar esses delitos.

"A experiência que nós temos no Tribunal Penal Internacional revelam que os casos demandam muitos anos de investigação, caso uma investigação seja instaurada, e muitos anos de processo também, caso o processo seja aberto", explica Zilli.

Na sua avaliação, a acusação envolvendo populações indígenas é a que teria mais potencial de prosperar no TPI, devido ao contexto mais amplo de ações da gestão Bolsonaro relacionadas a esses povos, como a redução da proteção aos seus territórios e falas recorrentes do presidente defendendo a exploração econômica das terras indígenas.

O TPI, inclusive, já recebeu algumas acusações contra Bolsonaro, envolvendo tanto os povos indígenas como a conduta na pandemia. Por enquanto, apenas uma relacionada aos indígenas, apresentada em 2019, avançou para a etapa de análise preliminar pela procuradoria.

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58990125


'Rede do ódio' bolsonarista age para atacar CPI da Covid e desqualificar relatório

Em dia de recorde de menções negativas a Bolsonaro nas redes, aliados se articulam para desacreditar Renan e tirar o foco de crimes

Vinícius Valfré / O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA — A apresentação do relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, nesta quarta-feira, 20, provocou forte reação de apoiadores do governo de Jair Bolsonaro nas redes sociais. A mensagem disseminada em páginas bolsonaristas e difundida à exaustão era clara: atacar diretamente o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), e desqualificar o texto que atribui crimes graves a integrantes do governo e seus aliados. Uma transmissão ao vivo do senador Flávio Bolsonaro (Patriotas-RJ), em que chamou Renan de "vagabundo" e enumerou supostos crimes do político de Alagoas na condução dos trabalhos deu o tom da reação organizada nas redes.

Monitoramento da consultoria AP Exata indicou que no dia da apresentação formal do relatório as referências negativas ao presidente Jair Bolsonaro chegaram a 77%, o maior patamar dos últimos 15 dias. Os bolsonaristas reagiram e, ao buscar tirar o foco das acusações da CPI, sustentaram que Renan não teria envergadura moral para atribuir crimes a membros do governo. Os ataques também ganharam redes como Facebook, Instagram e Telegram.

O documento apresentado pelo relator é resultado de um acordo com o grupo majoritário da CPI, o chamado G-7, e deve ser aprovado sem dificuldades na próxima terça, 26. Em seguida, providências jurídicas contra os citados dependerão do Ministério Público nos Estados e da Procuradoria-Geral da República.

Bolsonaro não mencionou a CPI nas redes sociais, nesta quarta-feira. No entanto, endossou insultos a Renan feitos por apoiadores durante evento oficial no Ceará. Ao ouvir gritos de "Renan vagabundo", o presidente disse que "a voz do povo é a voz de Deus".

Ema. Para reprovar o parecer do relator da CPI, páginas governistas dedicadas a informações falsas e enganosas contra adversários influenciaram o debate público. Uma delas disseminou a versão de que Renan incluiu até uma ema, ave que habita os jardins do Palácio da Alvorada, entre os indiciados. "Nem a ema do Palácio da Alvorada escapou da sanha de Renan 'vagabundo' Calheiros", diz a publicação enganosa.

Na verdade, em um parágrafo sobre a defesa equivocada de Bolsonaro a remédios sem eficácia, o texto citou o episódio em que ele foi fotografado mostrando uma caixa de hidroxicloroquina a uma ema.

Apontado como líder do "gabinete do ódio" do Palácio do Planalto, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), que teve o indiciamento sugerido por incitação ao crime na disseminação de notícias falsas, também atacou Renan e a "CPI do Lula" nas redes sociais. O vereador usou um vídeo fora de contexto no qual o filho do senador – o governador de Alagoas, Renan Filho – falava em "deixar a cloroquina à disposição do uso médico". Com isso, reclamou do não indiciamento do governador. A declaração, porém, é anterior aos estudos conclusivos sobre a ineficácia do remédio.

"Certamente existem outras dezenas de exemplos (de más condutas praticadas por membros e aliados da CPI) a serem expostos, o que desmascara facilmente qualquer ilação mencionada no relatório dos amigos de Lula e da 'terceira via'. Todo, absolutamente todo processo, desde seu início, tem método", postou Carlos.  

O pastor Silas Malafaia, retirado na véspera da lista de indiciados, chamou de "cretino", "inescrupuloso", "covarde" e "frouxo" o relator da "CPI da Safadeza". Já o deputado Carlos Jordy (PSL-RJ), que teve o indiciamento pedido sob acusação de incitação ao crime, anunciou que vai processar o relator por abuso de autoridade, a exemplo do que Flávio Bolsonaro prometeu fazer. O deputado ironizou a CPI: "Circo tem malabarismo, mas esse é muito amador".

Ao longo dos quase seis meses de investigação, governistas compararam a CPI a um circo em várias oportunidades. Bernardo Kuster, um dos indiciados por incitação ao crime na disseminação de fake news, voltou a usar o termo após a divulgação do relatório. "A CPI do Circo pedirá o meu indiciamento. Ser acusado por um tipo como Renan Calheiros é um privilégio para poucos. Orgulho da família", afirmou. 

O governo marcou para o mesmo dia da última sessão da CPI o lançamento da campanha "Respeitável Circo", por meio da Secretaria Especial da Cultura, voltada a artistas circenses. O secretário Mário Frias negou qualquer referência à comissão parlamentar de inquérito. “Valorizamos demais os valorosos artistas do circo para tratá-los de forma depreciativa”, escreveu ele.

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,rede-do-odio-bolsonarista-age-para-atacar-cpi-da-covid-e-desqualificar-relatorio,70003875052


Brasil fez lobby para mudar relatório climático, diz Greenpeace

Brasil pressionou para que trechos promovendo dieta vegetariana fossem removidos de relatório, segundo o Greenpeace

DW Brasil

Documentos vazados obtidos pela ONG mostram que país está entre grandes produtores de carne bovina, carvão e petróleo que pressionaram por mudanças em texto do IPCC sobre o aquecimento global.

Vários países, entre eles o Brasil, tentaram fazer mudanças em um crucial relatório da ONU sobre como combater o aquecimento global, afirmou o Greenpeace nesta quinta-feira (21/10), citando um grande vazamento de documentos.

Os documentos aos quais a equipe jornalística do projeto Unearthed, do Greenpeace, teve acesso consistem de comentários feitos por governos e outras entidades relativos ao rascunho de um relatório elaborado por um grupo de trabalho internacional do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). O relatório deverá ser divulgado no ano que vem.

Embora a maioria dos comentários encaminhados ao IPCC por governos tenham tido como intenção melhorar o relatório, diversos grandes produtores de carvão, petróleo, carne bovina e ração animal pressionaram por mudanças para satisfazer seus interesses econômicos, relatou o Greenpeace.

As tentativas de lobby foram reveladas a poucos dias da abertura das negociações climáticas no âmbito da próxima Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP26, a ser realizada em Glasgow, na Escócia, a partir de 31 de outubro. O encontro é visto por muitos como crucial para determinar se o aquecimento global causado pelo homem causará danos irreparáveis ao planeta.

Brasil, Argentina e o lobby da carne

Em comentários vistos pela equipe do Greenpeace, o Brasil e a Argentina, dois dos maiores produtores de carne bovina e ração animal do mundo, fizeram lobby junto ao IPCC para que fossem removidas menções a dietas baseadas em vegetais e à redução do consumo de carne e laticínios como benéficas para o clima.

Segundo o Greenpeace, ambos os países também pediram aos autores do relatório que fossem removidas passagens que descrevem a carne bovina como um alimento de "alto carbono".

Apesar das evidências científicas, o Brasil, "onde o desmatamento da Amazônia relacionado à agricultura está aumentando acentuadamente sob o presidente próximo ao agronegócio Jair Bolsonaro", tentou fazer com que o IPCC retirasse do relatório a ser divulgado no ano que vem conexões diretas entre o consumo de carne e o aquecimento global, diz a ONG.

"Por exemplo, em comentários registrados em março deste ano, o Ministério das Relações Exteriores brasileiro tenta remover do rascunho formulações que afirmam que uma transição para dietas com maior proporção de 'proteínas baseadas em vegetais' em regiões onde pessoas ingerem um excesso de calorias e alimentos baseados em animais poderia levar para uma redução substancial das emissões de gases de efeito estufa e fornecer benefícios à saúde", aponta o Greenpeace.

A ONG diz ainda que o Brasil pediu que fosse deletado o seguinte trecho: "Dietas com pouca carne e laticínios já são prevalentes em muitos países e culturas e sua aceitação está aumentando em relação aos atuais níveis baixos em outros lugares. Dietas baseadas em vegetais podem reduzir as emissões de gases de efeito estufa em até 50% em comparação à dieta média ocidental, intensiva em emissões."

Como justificativa para as exclusões propostas, o revisor do Brasil escreveu: "Não se pode pressupor que dietas vegetais e dietas saudáveis são a mesma coisa, que ambas terão um baixo impacto ambiental ou que uma dieta sustentável será saudável", segundo o Greenpeace.

O revisor brasileiro argumenta então que a sustentabilidade "depende da realidade local", que é influenciada pelo solo e as condições climáticas locais e, portanto, pela "aptidão agrícola da região para produzir alimentos", de acordo com os documentos vazados.

A Argentina, por sua vez, também pressionou pela exclusão de referências a impostos sobre carne bovina e até à campanha internacional Segunda-feira sem Carne, que encoraja as pessoas a adotarem uma dieta vegetariana um dia por semana, aponta a ONG.

De olho no petróleo

Em outro comentário vazado, um integrante do governo da Austrália questionou a conclusão do relatório, considerada indiscutível por cientistas, de que o fechamento de usinas a carvão é um grande passo para reduzir as emissões de gases de efeito estufa que causam o aquecimento global. Grande parte da renda nacional da Austrália provém das exportações de carvão.

Segundo o Greenpeace, comentários também mostraram a Arábia Saudita, o Irã, a Austrália, o Japão e a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opec) argumentando que a captura e a armazenagem de carbono poderiam ser usadas para evitar as emissões de gases de efeito estufa pela indústria, em vez de acabar com a produção de CO2.

O argumento contradiz estudos que apontam que métodos para manter o CO2 longe da atmosfera já empregados foram em grande parte malsucedidos.

O que dizem cientistas climáticos?

A grande maioria dos cientistas climáticos afirma que descontinuar rapidamente o uso de combustíveis fósseis é necessário para que o mundo não sofra os efeitos catastróficos do aquecimento global, muitos dos quais já vêm dando sinais nos últimos anos.

No rascunho do documento "Resumo para formuladores de políticas", que também vazou no início deste ano, o IPCC afirma que limitar o aquecimento global a 2 °C, idealmente a 1,5 °C, deverá "envolver reduções substanciais do uso de combustíveis fósseis, grandes investimentos em formas de energia de baixo carbono, transição para veículos movidos a energia de baixo carbono e esforços para eficiência energética e conservação [ambiental]".

Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/brasil-fez-lobby-para-mudar-relat%C3%B3rio-clim%C3%A1tico-diz-greenpeace/a-59573814


Webinar debate o livro Terras do Sem-fim de Jorge Amado

O romance de 1943 escrito por Jorge Amado será analisado em evento online com transmissão pela internet

*João Vitor, da equipe FAP

Escrito por Jorge Amado em 1943, o romance Terras do Sem-fim conta “uma disputa de terra sangrenta”, como destaca a professora Margarida Patriota. Ela vai discutir a obra, nesta quinta-feira (21/10), a partir das 17 horas, em webinar da Biblioteca Salomão Malina e da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), como parte das atividades de pré-celebração do centenário da Semana de arte moderna.

Assista!



A obra será discutida pela escritora durante o evento, que será transmitido na página da biblioteca no Facebook. O público também poderá conferir o debate no portal da FAP e nas redes sociais da entidade (Facebook e Youtube).

A história do romance Terras do Sem-fim mostra como foi, no sul da Bahia, a briga por terras, a fim de transformá-las em plantações de cacau.

É um marco importante do chamado "ciclo do cacau", que ocorreu no período da história econômica do Brasil em que o país era o segundo maior produtor mundial da fruta. Atualmente, no ranking mundial, encontra-se no sétimo lugar.

O romance conta histórias dos coronéis do sul da Bahia que queriam transformar a mata de Ilhéus em uma enorme produção de cacau, mas, para isso, travaram uma intensa batalha pelas terras.

No livro, Jorge Amado aborda também a questão da política em uma cidade comandada pelo coronelismo, a violência impune, a luta pela subsistência que se entrelaça com intrigas políticas e relações amorosas e crimes passionais.

Editado pela Companhia das letras, o livro faz críticas sociais atemporais à um povo ganancioso e pouco empático. A obra tem 282 páginas, é dividida em 6 partes e virou filme no ano de 1948.

*Estagiário integrante do programa de estágios da FAP

Ciclo de Debates - O modernismo na literatura brasileira  
Webinário sobre o livro "Terras do sem-fim" - Jorge Amado
Dia: 21/10/2021
Transmissão: a partir das 17h
Onde: Perfil da Biblioteca Salomão Malina no Facebook e no portal da FAP e redes sociais (Facebook e Youtube) da entidade
Realização: Biblioteca Salomão Malina e Fundação Astrojildo Pereira

Com canções nacionais, filme Brasil Ano 2000 remete a tropicalismo

Modernismo no cinema brasileiro

Lançado há 50 anos, filme Bang Bang subverte padrões estéticos do cinema

Projeto cultural de Lina e Pietro Bardi é referência no Brasil, diz Renato Anelli

Filme Baile Perfumado é marco da “retomada” do cinema brasileiro

Romance de 30, um dos momentos mais autênticos da literatura

Com inspiração modernista, filme explora tipologia da classe média

Webinário destaca “A hora da estrela”, baseado em obra de Clarice Lispector

Obra de Oswald de Andrade foi ‘sopro de inovação’, diz Margarida Patriota

O homem de Sputnik se mantém como comédia histórica há 62 anos

‘Desenvolvimento urbano no Brasil foi para o espaço’, diz Vicente Del Rio

‘Mário de Andrade deu guinada na cultura brasileira’, diz escritora

Influenciado pelo Cinema Novo, filme relaciona conceito de antropofagia

Mesmo caindo aos pedaços, ‘quitinete é alternativa de moradia em Brasília’

‘Semana de Arte Moderna descontraiu linguagem literária’, diz escritora

‘Modernismo influenciou ethos brasileiro’, analisa Ciro Inácio Marcondes

Um dos marcos do Cinema Novo, filme Macunaíma se mantém como clássico

Filme premiado de Arnaldo Jabor retrata modernismo no cinema brasileiro


‘Bolsonaro é líder de espírito fascista”, diz historiador Alberto Aggio

Na revista mensal da FAP de outubro, professor da Unesp ressalta que “tentativa de golpe não prosperou”

Cleomar Almeida, da equipe FAP

O historiador e professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Alberto Aggio diz que o presidente Jair Bolsonaro “é um líder de espírito fascista incapaz de dar solidez e consequência a seu próprio movimento”. “É um iliberal que tem adotado ações corrosivas contra a democracia desde o início do mandato por meio de estratégias erráticas de ‘guerra de movimento’ e ‘guerra de posição’ sucessivas e superpostas”, diz.

Aggio publicou sua análise em artigo produzido para a revista Política Democrática online de outubro, editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília. A instituição disponibiliza, gratuitamente, em seu portal, todo o conteúdo da publicação mensal na versão flip.

Clique aqui e veja a revista Política Democrática online de outubro

No artigo, o historiador lembra que o país esteve “no limiar de uma grave ruptura institucional que poderia pôr à pique nossa jovem democracia”. “E o grande responsável por isso foi o presidente da República, pela confrontação destrutiva que estimulou e conduziu contra as instituições da República, notadamente o Supremo Tribunal Federal (STF)”, asseverou o autor.

Bolsonaro, conforme lembrou o professor da Unesp, projetou e participou, no dia da Independência, de atos antidemocráticos de massa em Brasília e São Paulo “com o claro objetivo de confrontar o Poder Judiciário, rompendo o equilibro da República”. “Se essa ação produzisse os efeitos esperados a favor do presidente, estaria dado o sinal para o golpe de Estado”, afirmou. 

No entanto, de acordo com Aggio, “a tentativa de golpe não prosperou”. Os militares recolheram-se, depois da cerimônia oficial em Brasília, e as Polícias Militares dos Estados, controladas pelos governadores, mantiveram-se em suas funções ordinárias, garantindo a ordem”, acentuou.

De toda forma, segundo o historiador, o episódio revela que Bolsonaro não conseguiu ir além dos apoiadores de sempre, e o recuo do presidente, com a Carta à Nação, deixou parte de seus apoiadores bastante insatisfeito. “O resultado é cristalino: Bolsonaro não conseguiu ampliar sua base de sustentação e aumentou ainda mais seu isolamento político”, ressaltou.

Poucos dias depois, pesquisas de opinião sancionaram essa avaliação. “A imensa maioria da população brasileira repudiou a iniciativa do presidente em se antagonizar abertamente com as instituições da República, quase levando a uma ruptura institucional”, escreveu Aggio.

Veja lista de autores da revista Política Democrática online de outubro

A íntegra do artigo de Aggio pode ser conferida na versão flip da revista, disponível no portal da FAP, gratuitamente. A edição deste mês também mostra entrevista com o delegado da Polícia Federal Alexandre Saraiva e os riscos de a covid-19 se tornar uma endemia, além de artigos sobre política, economia, meio ambiente e cultura.

Compõem o conselho editorial da revista o diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo, o jornalista e escritor Francisco Almeida e o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques. A Política Democrática online é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado.

“CPI expôs governo sem empatia com seu povo”, diz senador Alessandro Vieira

Caminho de Bolsonaro ao segundo turno é “estreito e vulnerável”, diz revista da FAP

“Tem traficante de drogas indo para a madeira”, diz delegado da PF Alexandre Saraiva

Veja todas as edições da revista Política Democrática online! 


Luiz Carlos Azedo: Bolsonaro subestimou a CPI

Após a conclusão dos trabalhos da Comissão, o melhor que os indiciados terão a fazer será providenciar um bom advogado

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense

Parece que ainda não caiu a ficha para Jair Bolsonaro de que o relatório do senador Renan Calheiros (MDB-AL), após ser aprovado pela CPI da Covid, será uma monumental dor de cabeça, não apenas para os demais 65 indiciados pela Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado, que investigou a atuação do seu governo na pandemia da covid-19. Não há outra explicação para as declarações do presidente da República, que minimiza as denúncias e desdenha do trabalho realizado pelos senadores.

As consequências políticas do trabalho da CPI já se refletiam nas pesquisas de opinião sobre o governo, mas, agora, foram estampadas nas manchetes dos jornais de todo o mundo. Bolsonaro nunca esteve tão isolado no plano internacional. Outro sinal de seu enfraquecimento político foi o fracasso do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ontem, na votação da emenda constitucional que limitava a autonomia do Ministério Público — não obteve maioria qualificada em plenário e foi derrubada. A reação de procuradores e da opinião pública demonstrou que a ética na política ainda é um valor a ser levado em conta pelo Congresso.

O relatório não ficará barato para os indiciados. Resultará em processos administrativos, civis e criminais, em razão da continuidade das investigações, que ficarão a cargo da Polícia Federal, da Receita Federal, da Corregedoria Geral da União (CGU), do Tribunal de Contas da União (TCU) e, principalmente, da Procuradoria-Geral da República (CGU). No caso de Bolsonaro e seus ministros, o relatório pode acabar no Tribunal Penal Internacional, em Haia, na Holanda, órgão ligado à ONU e que julga crimes contra a humanidade e acusações de genocídio. Renan desistiu da imputação de genocídio a Bolsonaro, mas pesou a mão em outras nove acusações, entre as quais crimes de epidemia com resultado de morte, infração a medidas sanitárias preventivas, emprego irregular de verba pública, incitação ao crime, falsificação de documentos particulares, charlatanismo e prevaricação. As mais graves, porém, são crime contra a humanidade e crime de responsabilidade.

Os crimes contra a humanidade estão previstos no Estatuto de Roma, uma convenção internacional que prevê esses crimes como ataques generalizados e sistemáticos contra a população civil. O Brasil é signatário da criação do Tribunal Penal Internacional e autoriza que aquela Corte julgue alguém que cometeu um crime contra a humanidade no território nacional. Os crimes são imprescritíveis e a pena de prisão pode ser de até 30 anos. Previsto na Constituição, o julgamento por crime de responsabilidade, porém, é político, pelo Congresso, e pode resultar na perda de mandato e suspensão de direitos políticos do presidente da República.

No colo de Aras
Após a conclusão dos trabalhos da CPI da Covid, o melhor que os indiciados terão a fazer, inclusive Bolsonaro, será providenciar um bom advogado, porque a batalha para se livrar das acusações contidas no relatório de Renan será longa e pode ser inglória. Desprezar as conclusões da CPI não é mais possível. O procurador-geral da República, Augusto Aras, por exemplo, após a aprovação do relatório, não poderá se omitir em relação às denúncias apresentadas, sob pena de prevaricar.

Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), a propósito da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.331-DF, consolidou o art. 3o da Lei 10.001/2000, que confere prioridade aos processos e procedimentos decorrentes de relatórios das CPIs. Segundo entendimento da Corte, as Comissões de Inquérito são um mecanismo de controle da máquina pública, de competência fiscalizatória do Congresso.

O procurador-geral da República é obrigado a comunicar ao Congresso, semestralmente, o andamento dos procedimentos administrativos e processuais instaurados em decorrência das conclusões da CPI, “sob pena de sanções administrativas, civis e penais”. Trocando em miúdos, Aras terá que dar andamento às acusações, o que representa a maior saia justa, porque é um aliado de Bolsonaro, que o indicou para o cargo, mas, ao mesmo tempo, estará sob forte pressão do Senado.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-bolsonaro-subestimou-a-cpi

Cristovam Buarque: Estamos em decadência

É prova de decadência moral a tolerância com a divisão da sociedade brasileira por uma brutal concentração de renda

Cristovam Buarque / Correio Braziliense

Pela primeira vez na nossa história, o Brasil apresenta sinais de que sua crise é parte de uma decadência, que vai exigir anos, talvez décadas, para ser superada, recuperando o rumo do desenvolvimento civilizatório. Ainda no início dos anos 1990, o livro “O Colapso da Modernidade Brasileira” já alertava que o progresso brasileiro seria interrompido em decorrência da falta de cuidado com a desigualdade social, com os desequilíbrios fiscal e ecológico, com a baixa qualidade da educação, a tolerância com a corrupção e a ineficiência, o desprezo com a ciência e a tecnologia.

O atual debate político, prisioneiro do confronto em 2022, exclui a ideia de que Jair Bolsonaro é um fenômeno trágico e brutal, mas passageiro, e que, ao se abraçarem a ele, seus opositores ignoram a dimensão da tragédia histórica que o Brasil atravessa há anos. O momento atual é visto como uma crise, consequência do Bolsonaro quando, na realidade, ele é um indicador da nossa decadência.

A ânsia de emigração também é um indicador de decadência. Não se trata de saída por períodos curtos, para estudar, fugir de repressão, de guerra civil, como ocorre em outros países. As pessoas estão emigrando para fugir da violência, da incerteza, da falta de perspectiva de bem-estar e da ausência de desafio para construir uma nação; elas abandonam o Brasil por falta de esperança. A emigraçāo é facilitada pela globalização que permite manter os laços familiares e culturais, mesmo vivendo no exterior. O emigrado troca a vida angustiante e sem perspectiva no Brasil por uma vida segura no exterior, conversando com som e imagem com as pessoas que deixou no Brasil, assistindo ao futebol, às novelas e ao noticiário da televisão brasileira.

A decadência que provoca a emigração se agrava porque rouba o potencial desses emigrantes que vão beneficiar o país que os adota ou tolera. Um dia, algum desses emigrantes, ou seu filho ou filha, provavelmente receberá um Nobel em nome do país onde vive e produz.

Outro indicador de decadência está no despreparo educacional de grande parcela da população de adultos “analfabetos para a contemporaneidade”: não conhecem bases da ciência, não entendem os problemas do mundo, não falam idiomas estrangeiros. Isso indica que não estamos  preparados para a integração no mundo, nem sintonizados com a velocidade com que ele avança. O corte de verbas promovido recentemente  por decisão do presidente da República induz à decadência, porque o país que não invista maciçamente em conhecimento fica para trás em relação aos outros países.

A violência que nos rodeia é um indicador de decadência. Ainda mais a aceitação e acomodamento de sobreviver no meio de uma guerra civil informal, mas mortífera. Vivemos cercados por guardas, muros, vigilância; assistimos o noticiário como descrição de campo de batalha, sabendo que esse quadro continuará se agravando, empurrando muitos para a migração ao exterior e outros para aceitarem viver no meio da guerra sem saber quando será sua vez de vítima.

É prova de decadência moral a tolerância com a divisão da sociedade brasileira por uma brutal concentração de renda, cuja manifestação mais anti-civilizada é sermos o maior exportador de alimentos e termos um dos maiores contingentes de pessoas famintas entre todos os países do mundo. A aceitação como natural das notícias sobre a fome intercaladas de propaganda de alimentos e de concursos de culinária é mais um indicador de decadência moral que lembra o tempo em que a escravidão era aceita com naturalidade, separando os brancos dos negros, agora quem come e quem passa fome.

Também é prova de decadência termos o presidente mais ridicularizado entre todos do mundo, visto como motivo de galhofa internacional, representando um país em decadência, ao negar a importância da ciência, dizer com orgulho que não tomou vacina e que não vê necessidade de distanciamento social. Ainda mais quando a oposição torna-se prisioneira dos interesses eleitorais imediatos, sem perceber a decadência, nem apresentar rumos alternativos para barrá-la e promover a ascensão do país a um patamar superior de civilização. Nossos líderes parecem pilotos que disputam controlar o leme do navio, sem ver o iceberg da decadência em frente.

*Professor Emérito da UnB e membro da Comissão Internacional da Unesco para o Futuro da Educação

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2021/10/4956241-estamos-em-decadencia.html