Day: agosto 20, 2021

Mercado já começa a falar em desembarque do governo Bolsonaro

Analistas têm precificado as dificuldades impostas pelo risco de uma deterioração do quadro fiscal

Douglas Gavras e Isabela Bolzani / Folha de S. Paulo

O risco de um descontrole fiscal com aumento de gastos e perspectivas cada vez mais duras para a economia no ano que vem encontraram eco em uma piora do cenário externo, e o mercado já começa a falar em desembarque do governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

Para ficar em uma figura de linguagem cara ao presidente, é como se o casamento do governo com os investidores estivesse mais próximo do divórcio do que da lua de mel.

Não é de hoje que os analistas têm precificado as dificuldades impostas pelo risco de uma deterioração do quadro fiscal, com a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos precatórios, e a inflação mais alta do que se antecipava.

Também pesa a crise política gerada pela tentativa de reeleição do presidente, que tem colocado em descrédito o processo eleitoral e confrontado ministros do Supremo Tribunal Federal.

As preocupações dos investidores já se refletem na Bolsa de Valores brasileira e na cotação do dólar.

Nos mercados de renda variável, o Ibovespa, principal índice acionário do país, que até a última sexta-feira (13) acumulava um ganho de 1,83%, reverteu o sinal ao longo desta semana, apesar da alta registrada nesta quinta-feira (19). Agora, o índice acumula uma perda de 1,56% desde o início do ano. Só nesta semana, o Ibovespa acumula uma queda de 3,32%.

O dólar encerrou a sessão desta quinta em alta de 0,87%, a R$ 5,4220. Na semana a moeda americana sobe 3,4%. No ano a alta é de 4,5%.

No exterior, parte da explicação para a piora das expectativas em relação à retomada da economia em um cenário pós-pandemia veio de dados fracos da China e dos Estados Unidos, desde a última segunda-feira (16).


Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Coletiva do ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Marcos Corrêa/PR
O Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Paulo Guedes durante cerimônia do Novo FUNDEB. Foto: Isac Nóbrega/PR
O Ministro da Economia, Paulo Guedes e o presidente Jair Bolsonaro. Foto: Marcos Corrêa/PR
Paulo Guedes e Bolsonaro durante o Latin America Investment Conference. Foto: Marcos Corrêa/PR
pauloguedes_braganeto_foto_Alan Santos_PR
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante palestra. Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
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Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Coletiva do ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Marcos Corrêa/PR
O Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Paulo Guedes durante cerimônia do Novo FUNDEB. Foto: Isac Nóbrega/PR
O Ministro da Economia, Paulo Guedes e o presidente Jair Bolsonaro. Foto: Marcos Corrêa/PR
Paulo Guedes e Bolsonaro durante o Latin America Investment Conference. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante palestra. Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
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O temor de um retrocesso econômico ganhou ainda mais força na terça (17), quando os Estados Unidos também reportaram dados aquém das expectativas: uma queda de 1,1% nas vendas do varejo em julho, ante a estabilidade esperada pelo mercado.

Outro ponto de influência nos mercados foi a ata da última reunião de política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Nela, a autoridade monetária sinalizou que o patamar de desemprego para que o suporte à economia seja reduzido pode ser atingido neste ano.

Essa desaceleração no ritmo dos estímulos dados pelo Fed à economia americana, na prática, também pode refletir em um aumento das taxas de juros nos Estados Unidos –o que, para o Brasil e os mercados emergentes, pode significar menos investimento.

No cenário interno, a percepção é de incerteza e insegurança, que tendem a aumentar caso o governo não sinalize um comprometimento com as regras fiscais, aumente gastos e mantenha um ambiente de confronto com as instituições até a eleição de 2022.

Um sintoma disso é que as curvas de juros futuros para cinco e nove anos voltaram a atingir os dois dígitos nesta semana, recuperando patamares de três anos atrás.

A deterioração da confiança do mercado no governo é visível e muitos já compreendem que a busca por uma reeleição por parte do presidente seria bastante preocupante do ponto de vista da agenda econômica, avalia a economista Zeina Latif.

"Às vezes, há um acúmulo de notícias negativas, mas o mercado demora a reagir por falta de um gatilho. Agora, esse gatilho veio lá de fora, com o Fed e um cenário externo não tão confortável, com a China desacelerando e o impacto nos preços de commodities. Isso acaba forçando o mercado a reavaliar o cenário interno", explica.

Segundo ela, cada vez mais o Brasil será afetado por ondas de volatilidade e, se antes o mercado apostava muito no governo Bolsonaro, hoje certamente não é assim. "É difícil falar sobre o mercado como uma entidade de opinião única, mas eu diria que antes havia mais unanimidade, como em 2018, e isso não existe agora.

O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, é ainda mais enfático ao afirmar que o mercado já não espera que o governo entregue algo de relevante até as eleições do ano que vem.


Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
 Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Ele considera que o governo perdeu as condições de colocar em prática a política econômica às vésperas de uma disputa eleitoral que deve ser muito tensa. Essa combinação é ruim para o mercado, diz, e a taxa de câmbio deve continuar subindo, colocando pressão sobre a inflação e os juros.

Com um discurso golpista, o presidente acaba prejudicando a imagem do país e a capacidade do investidor de fazer negócios, diz Vale. "O governo Bolsonaro, nesse sentido, acaba sendo pior que o da ex-presidente Dilma Rousseff. As dificuldades econômicas de agora são similares ao que havia no fim do governo da petista, só que com riscos institucionais que não existiam", afirma.

"Hoje, com Bolsonaro criando crises, trazendo riscos fiscais crescentes e com a falta de equilíbrio na política, o mercado gradativamente vai abandonar o governo, o que já está acontecendo."

Ele ressalta que a perda de paciência com Bolsonaro não significa um embarque na candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que hoje lidera as pesquisas eleitorais. ​O mercado, na verdade, deve manter a expectativa por uma terceira via em 2022, aponta.

Há também um desconforto entre os analistas, ao avaliarem que muitas das medidas propostas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, não avançaram ou tiveram dificuldades para sair do papel. A reforma mais relevante até agora, a da Previdência, é vista como um esforço do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (sem partido-RJ).

"Com Arthur Lira [PP-AL], só temos tido bola fora, do ponto de vista fiscal. A reforma tributária que está se discutindo agora, por exemplo, é muito ruim. O mercado percebe que o governo e o ministro da Economia não são funcionais e esse elemento ajuda no desembarque", diz Vale.

O economista avalia que só ocorreria um reembarque do mercado se houvesse sinal por parte do Executivo de mudança da trajetória de gastos. "Talvez não tenha mais volta."

Para o ex-diretor do Banco Central e consultor da Schwartsman e Associados, Alexandre Schwartsman, apesar de vários alertas, o mercado ignorou os riscos domésticos, por estar surfando na onda de uma enorme liquidez mundial, que elevava o preço dos ativos. "Agora que há risco de o cenário mudar lá fora, os problemas domésticos ficaram à vista."

Ele acrescenta que é preciso diferenciar o mercado das pessoas que atuam nele, ao medir as chances de uma retirada do suporte dado ao governo.

"O mercado, em si, vende ativos sem dó e, portanto, pode-se dizer que já desembarcou. Sobre as pessoas, algumas já soltaram a mão do governo, como os manifestos recentes sugerem; outras, porém, há pouco erigiam estátuas em homenagem ao ministro Paulo Guedes."

Sob condição de anonimato, o economista de uma grande gestora de investimentos lembra que
o mercado sempre espera que o governo proponha boas reformas. O fato, diz esse economista, é que hoje os investidores estão céticos com a aprovação de medidas importantes até o final deste mandato, e agora começam a sentir os efeitos dos ruídos eleitorais e fiscais.

Ele também avalia que não havia como prever a proposta de adiamento no pagamento dos precatórios, por exemplo, nem o tamanho exato da pressão que haveria do Executivo para aumentar os gastos no ano que vem. Ainda segundo esse economista, o que o mercado vê hoje é que essa pressão é muito maior do que se imaginava.

André Perfeito, da Necton, avalia que se o Banco Central conseguir ajustar a curva de juros para algo mais razoável, isso pode resolver parte dos problemas. Foto: Banco Central/Divulgação

Os precatórios são dívidas do governo reconhecidas pela Justiça. O ministro Paulo Guedes e sua equipe têm elevado a pressão no Congresso sobre os efeitos no Orçamento do ano que vem, caso o parcelamento das dívidas de precatórios não seja autorizado.

“Estávamos vindo de uma situação fiscal que trazia notícias positivas para o curto prazo, com uma redução da dívida pública, uma arrecadação mais forte e a volta da atividade. Mas todo o bom humor virou quando surgiu a questão do aumento da provisão de pagamento dos precatórios para o ano que vem”, diz a chefe de economia da Rico, Rachel de Sá.

Para o economista-chefe da Necton, André Perfeito, se o Banco Central conseguir ajustar a curva de juros para algo mais razoável, isso pode resolver parte dos problemas. "Mas o mercado já entende que as necessidades políticas e eleitorais do presidente estão cobrando um preço alto demais na disciplina fiscal."

Para parte dos investidores, a PEC dos precatórios é um desrespeito, e o mercado entende que a agenda que se imaginava no começo do governo não vai mais ser aprovada. "Mas isto é uma fotografia do momento. O rei está nu agora, mas pode voltar a se vestir", pondera o economista.

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/08/desconfianca-cresce-e-mercado-ja-comeca-a-falar-em-desembarque-do-governo-bolsonaro.shtml


Bolsonaro entra com ação para impedir Supremo de abrir investigação sem MPF

Advocacia Geral da União contesta artigo do regimento interno do tribunal que permitiu instauração do inquérito das fake news, em que o presidente passou a ser investigado

Rayssa Motta / Blog Fausto Macedo / O Estado de S. Paulo

Em novo capítulo da briga aberta com o Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Jair Bolsonaro se insurgiu contra o artigo do regimento interno da Corte que permite a abertura de investigações de ofício, sem necessidade de aval da Procuradoria-Geral da República (PGR). A norma foi usada, por exemplo, para instaurar o inquérito das fake news que atingiu a rede bolsonarista e o próprio chefe do Executivo.

Documento

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Em ação enviada ao STF na tarde desta quinta-feira, 19, a Advocacia Geral da União (AGU) pediu a suspensão liminar do texto até o julgamento definitivo do tema no plenário do tribunal. O documento é assinado pelo ministro-chefe da pasta e pelo próprio presidente. A AGU argumenta que o artigo viola preceitos fundamentais, como os princípios acusatório, da vedação de juízo de exceção e da segurança jurídica.

O artigo questionado é o 43 do regimento interno da Corte, segundo o qual ‘ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o Presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição’. A previsão é atípica, porque a Justiça brasileira preserva o princípio acusatório, ou seja, um órgão apresenta o pedido de investigação e eventualmente uma denúncia, frequentemente o Ministério Público, e outro julga.

Ao longo de 49 páginas, a AGU cita especificamente o inquérito das fake news e o que chama de ‘excessos’ cometidos durante a investigação criminal conduzida pelo ministro Alexandre de Moraes. Aberta em março de 2019 para apurar notícias falsas, ofensas e ameaças dirigidas aos integrantes do Supremo Tribunal Federal, a apuração atingiu o Presidente da República, que passou a ser investigado sob o mesmo guarda-chuva que a militância bolsonarista após recorrentes ataques ao sistema eletrônico de votação.

“É preciso encontrar um ponto de equilíbrio reflexivo entre sistema acusatório, devido processo e defesa das instituições, sob pena de, no pretexto de uma legítima defesa de prerrogativas, naturalizar-se o exercício arbitrário das próprias razões”, argumenta a AGU.

“A maioria dos vícios que têm sido observados deriva do fato de o Supremo Tribunal Federal ter avalizado o exercício de competência investigatória atípica para muito além da espacialidade da Corte, o que acabou implicando, por via oblíqua, a criação de um tipo ilegítimo de prerrogativa de foro por função da vítima”, segue a pasta.

O governo vai até a origem do inquérito para questionar os fundamentos usados em sua abertura. A AGU afirma que não foi indicado ‘absolutamente nenhum fato concreto’ para justificar a investigação, o que teria aberto caminho para a inclusão de novas frentes de apuração junto à linha inicialmente traçada.

“Os atos instauradores do INQ 4781 são inválidos, por não terem circunstanciado nenhum fato, mas apenas classes de fatos, ensejando, assim, que uma miríade de fatos futuros venha a ser posteriormente absorvida ou capturada para o inquérito original”, diz a ação.

O artigo 43 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal

Outro ponto questionado pelo governo é a possibilidade do presidente do Supremo designar o ministro responsável pela relatoria das investigações abertas com base no regimento interno, sem necessidade de observar a livre distribuição entre o colegiado. Foi assim com o inquérito das fake news, em que o então presidente do STF, Dias Toffoli, escolheu Moraes para conduzir os trabalhos da Polícia Federal.

A ação foi enviada ao Supremo em meio a ameaças de pedidos de impeachment contra os ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, que se tornaram alvos preferenciais do presidente desde que ele passou a ser investigado por acusar, sem provas, o sistema eleitoral do País.

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/bolsonaro-entra-com-acao-para-impedir-stf-de-abrir-investigacao-sem-passar-pelo-mpf/