Míriam Leitão: No Rio é pior

O Rio é o estado onde tudo aconteceu da pior forma. A crise econômica é mais profunda e prolongada, o assalto aos cofres públicos foi mais violento e disseminado, a crise da Petrobras o atingiu mais fortemente do que a qualquer outro estado. A deterioração fiscal tem sido mais aguda, com a aflição interminável do servidor público e seus salários atrasados.
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O Rio é o estado onde tudo aconteceu da pior forma. A crise econômica é mais profunda e prolongada, o assalto aos cofres públicos foi mais violento e disseminado, a crise da Petrobras o atingiu mais fortemente do que a qualquer outro estado. A deterioração fiscal tem sido mais aguda, com a aflição interminável do servidor público e seus salários atrasados.

Ontem foi mais um dia histórico no Rio, com a prisão do presidente da Assembleia Legislativa Jorge Picciani, depois da decisão unânime dos desembargadores do TRF. Eles votaram pela prisão do deputado, do líder do governo Edson Albertassi e de Paulo Melo, outro parlamentar.

Há uma semana Albertassi estava com um pé no Tribunal de Contas do Estado, apesar de todas as dúvidas que pesavam sobre ele. Tanto tempo depois de iniciado o mais sério combate à corrupção no Brasil e no Rio, o governador Luiz Fernando Pezão se considerou no direito de o indicar para a vaga e demitir o procurador- geral Leonardo Espíndola, que se recusou a defender a nomeação. As instituições tiveram que travar uma luta, a começar da ação popular do PSOL, para evitar que o deputado fosse para o TCE. Ontem, Picciani, Albertassi e Melo foram detidos.

O PMDB é o maior partido do Estado e há anos governa o Rio. As dúvidas sobre o enriquecimento rápido de deputados estaduais é assunto antigo. A memorável reportagem “Os homens de bens da Alerj”, que ganhou prêmios no Brasil e no exterior, foi publicada há 13 anos.

Houve um dia em que o Rio tinha, ao mesmo tempo, dois ex- governadores presos. Garotinho foi solto, mas o conselheiro que ele indicou para o TCE, Jonas Lopes, que havia virado um dos líderes do esquema de corrupção, se tornou o grande delator. Confessou seus crimes e contou o que acontecia no TCE. Cinco conselheiros foram presos. Tiveram o mesmo destino do ex-governador Sérgio Cabral e alguns ex- secretários, como Sérgio Côrtes.

Cabral foi condenado em três dos 16 processos a que responde a penas somadas de 72 anos de prisão. As descobertas de como ele se apropriava do dinheiro público são de embrulhar o estômago, com aquelas extravagantes compras de joias, ouro, mansões e viagens internacionais.

Tudo tem sido mais escancarado no Rio. Empresas que lavavam dinheiro do esquema recebiam — e ainda recebem — benefícios fiscais milionários. E não há um fim nesse sofrimento estadual. Há uma continuidade delitiva, tanto que foi a tentativa de nomear o conselheiro do TCE que precipitou a operação “Cadeia Velha”.

A dimensão da crise do Rio precisa ser entendida pela cúpula do Judiciário. Empresários do setor de transportes envolvidos em desvios foram soltos por decisão do ministro Gilmar Mendes. Agora alguns voltam à prisão por novas denúncias. Inclusive, há o temor de que o precedente do caso do senador Aécio Neves seja invocado em sessão marcada para hoje na Assembleia, e os deputados sejam liberados pelos seus pares.

No Rio, os crimes foram constantes, sérios. Endêmicos. Não foram casos isolados. Por muito tempo ele foi saqueado. É preciso enfrentar a crise com a certeza de que estamos diante da necessidade de reconstrução. O estado não pode mais viver situações como a que acaba de acontecer: numa semana Albertassi estava com um pé no tribunal que julga as contas dos órgãos públicos, e na outra semana ele está preso. Até a semana passada Picciani era um dos maiores centros de poder do Rio, ontem estava na cadeia. No Rio, as investigações não são sobre fatos passados apenas, mas também sobre o presente. Um presente contínuo.

Não por outra razão, o Rio tem sofrido mais na crise econômica. É o único estado do Sudeste que continua perdendo empregos de carteira assinada este ano. Foram fechadas 81 mil vagas até setembro, enquanto São Paulo criou 111 mil. No desemprego geral, o Brasil está em 13% e o Rio, 15%. Nos anos anteriores à crise, o estado teve a enorme vantagem dos royalties do petróleo em tempo de preços em alta. Esses recursos foram mal geridos e hoje a crise fiscal é maior e mais difícil de tratar do que a da maioria dos estados brasileiros. A esperança é de que tudo o que tem acontecido ajude o estado a fazer a travessia para uma outra estrutura de poder no Executivo e Legislativo. O Rio precisa recomeçar.

 

 

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